Com apoio dos estados, do Distrito Federal, dos municípios e do Conselho Nacional de Saúde (CNS), uma política pública que levou assistência médica a 63 milhões de brasileiros em áreas remotas e carentes está de volta, com cobertura ainda maior. O Ministério da Saúde lançou, no mês de abril, o edital de retomada do programa Mais Médicos (agora, Mais Médicos para o Brasil), passo inicial rumo à meta de ter, até o fim deste ano, 28 mil profissionais fixados e cerca de 96 milhões de pessoas com acesso a atendimentos na atenção primária, porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS).
Criado em 2013, o Programa Mais Médicos levou 18,2 mil profissionais para municípios de todo o país, mas sofreu cortes durante o governo anterior. Por essa razão, número de médicos em atividade caiu para 8 mil, ao final de 2022, o que provocou o desfalque de cinco mil equipes de saúde da família. Apenas em 2023, o novo Mais Médicos prevê 15 mil contratações; dentre eles, 117 médicos irão atuar em 29 distritos indígenas, incluindo 14 que serão destinados ao território Yanomami.
Só no início do ano, dois editais foram retomados. Ainda neste primeiro semestre, mais de 5 mil médicos serão chamados. Ao final de 2023, o programa deverá ampliar o atendimento para 96 milhões de pessoas, em todo o País.
Previsto pela Medida Provisória nº 1.165, de 20 de março de 2023, o relançamento do programa integrou o Plano de Emergência de 100 dias do Ministério da Saúde e incluiu, também, medidas para reduzir filas de diagnósticos e cirurgias, resgatar o Programa Farmácia Popular e a assistência farmacêutica, fortalecer a atenção à saúde indígena, incluir a vacina da covid-19 no calendário regular e recuperar as taxas vacinais do Programa Nacional de Imunizações (PNI). Segundo a Pasta, são políticas públicas que impactam diretamente a saúde e a qualidade de vida da população.
A retomada do programa foi pactuada na Comissão Intergestores Tripartite (CIT), formada pelo Ministério da Saúde, pelo Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), que representa os gestores estaduais do setor.
“O Programa Mais Médicos não tem importância apenas para o Conasems, mas para toda rede, justamente por trazer médicos para a Atenção Primária”, diz o presidente do Conasems, Wilames Freire. Segundo ele, a entidade defende o fortalecimento do programa dentro do Ministério da Saúde.
Freire acrescenta que “essa nova modalidade, apresentada pelo atual governo, reflete um pedido feito ao longo dos anos pelo Conasems: o fortalecimento da presença de médicos nas regiões mais remotas do país, especificamente na região Norte, como em comunidades indígenas”.
O presidente do Conasems afirma que “nós vemos com bons olhos o programa”, em razão da possibilidade de um grande reforço para as equipes de Saúde da Família e de ampliação da cobertura da atenção básica. “Claro, ainda teremos muita discussão, de modo a aperfeiçoar o debate, a fim de melhorar a assistência da população. O objetivo final é fortalecer o acesso a esses profissionais”, conclui.
O primeiro edital do Mais Médicos deste ano, vai oferecer vagas conforme adesão dos municípios. A previsão é de que sejam pelo menos 6.595 vagas, das quais 305 são para atuação em Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) e mil para a Amazônia Legal. Os médicos selecionados serão remunerados totalmente pelo Ministério da Saúde. Um outro edital, previsto para o segundo semestre, abrirá outras 10 mil vagas. A remuneração aos médicos selecionados nessa fase será feita por meio de contrapartida dos municípios. O valor da bolsa para os participantes do programa será de R$ 12.386,50.
Brasileiros formados em medicina no Brasil terão prioridade nas contratações do Mais Médicos, como ocorreu na primeira edição do programa, lançada em 8 de julho de 2013. Se não for alcançado o quantitativo necessário, a alternativa será a contratação de médicos brasileiros formados no exterior. Se persistir a dificuldade para o preenchimento das vagas, os especialistas estrangeiros serão a opção. “O nosso objetivo não é saber a nacionalidade do médico, mas a nacionalidade do paciente, que é um brasileiro que precisa de saúde”, enfatizou o presidente, ao anunciar, em 20 de março, durante solenidade no Palácio do Planalto, o relançamento do programa.Segundo o Ministério da Saúde, 14.014 especialistas já atuam em áreas remotas do país, acrescidos os 16.595 que serão contratados nos dois editais deste ano, o total de profissionais fixados em regiões distantes e carentes, incluindo periferias de grandes cidades, será de 28 mil.
Além de selecionar especialistas para o Mais Médicos, o Ministério da Saúde também definiu estratégias para mantê-los nas localidades em que forem lotados. Um levantamento realizado pelo Pasta aponta que 41% dos recrutados pelo programa se transferem para outras regiões em busca de capacitação e qualificação. Para afastar esse risco, o ministério vai oferecer uma série de incentivos, incluindo mais oportunidades educacionais, como a possibilidade de o médico fazer especialização e mestrado em até quatro anos.
Foi definido, também, um estímulo para manter, no programa, a médica que estiver em licença maternidade. Nesse período de seis meses, será garantida uma compensação para atingir o mesmo valor da bolsa, complementando o auxílio do INSS. Já para o médico que se tornar pai, será concedida licença de 20 dias.
Legado
O Mais Médicos representou uma revolução na política de provimento de profissionais de medicina em áreas com déficit na assistência à saúde. De 2013 a 2015, o programa chegou a contar com 18.240 profissionais, em 4.058 municípios.
Nesse período, cerca de 63 milhões de brasileiros foram beneficiados com acesso a atendimentos na atenção primária, o que inclui prevenção, tratamento e acompanhamento de doenças sexualmente transmissíveis e infectocontagiosas; acompanhamento de enfermidades crônicas, como hipertensão e diabetes; ações de promoção da saúde e proteção social na comunidade; e controle do tabagismo.
Os resultados atestam a eficácia dessa política pública: entre 2013 e 2015, enquanto a média nacional de crescimento no número de consultas foi de 29%, o aumento nos municípios sem médicos do programa ficou em 15%, segundo o Ministério da Saúde. Nas cidades com cobertura do Mais Médicos maior que 36% da população, a redução no número de internações foi de 8,9%. Dessa forma, em 2015, mais de 91 mil pacientes não precisaram ser internados, o que liberou os leitos para quem mais necessitava.
Novos ventos
A retomada do Mais Médicos foi comemorada, também, por Fernando Pigatto, presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), principal instância de decisões do SUS. Esse colegiado tem a missão de fiscalizar, acompanhar e monitorar as políticas públicas de saúde, além de levar as demandas da população ao poder público, fazendo, dessa forma, o controle social no setor, conforme a Lei n° 8.142/1990.
“O Mais Médicos será devidamente recolocado para a população que mais precisa, que poderia não ter morrido nestes últimos anos, porque foi isso que aconteceu”, afirma Pigatto, que também destaca a atuação do CNS durante audiência pública no Senado, em setembro de 2019, na defesa da retomada do Mais Médicos e de sua extensão a todos os municípios que ainda não tinham sido contemplados, para assegurar o cuidado integral a todos os usuários do SUS. “Na ocasião, lembramos que o programa atendeu mais de 63 milhões de brasileiros que não tinham acesso a médicos, e ainda que, de 2017 a julho de 2019, o governo diminuiu R$ 1,2 bilhão no investimento ao programa, representando uma redução de 34%”, recorda.
O presidente do CNS destaca o desfinanciamento do SUS causado pela promulgação da Emenda Constitucional 95/2016 (teto de gastos). “Houve a volta de doenças que haviam sido extintas no país, o descaso às respostas à Pandemia da Covid-19, que certamente se agravaram ainda”, diz.
Vacinação
A volta dos Mais Médicos será reforçada pelo Movimento Nacional pela Vacinação. Com o tema “Vacina é vida. Vacina é para todos”, a iniciativa visa conscientizar a população sobre a efetividade das vacinas disponíveis no Calendário Nacional de Vacinação, para todos os grupos.
Para Covid-19, foram distribuídas 29 milhões de doses da vacina bivalente para a retomada do esquema vacinal. Mais de 7,5 milhões de doses foram aplicadas, em 2023, para reforçar a imunização de pessoas acima de 60 anos, residentes em instituições de longa permanência, imunocomprometidos, indígenas, quilombolas, gestantes e puérperas, pessoas privadas de liberdade, adolescentes em medida socioeducativa e trabalhadores da saúde.