A carreira meteórica de João Doria na vida pública pode terminar antes do que muitos imaginam.
O marqueteiro que virou prefeito de São Paulo sem que ninguém esperasse e usou o cargo como trampolim para o governo do Estado corre sério risco de não conseguir se viabilizar para 2022 dentro do PSDB.
No plano nacional, Doria é solapado por Aécio Neves. O deputado mineiro já tirou dele a liderança do partido na Câmara dos Deputados ao emplacar o aliado Celso Sabino (PA) no cargo.
Agora, numa segunda etapa, Aécio costura na Câmara e no Senado, com aval da velha guarda paulista, entre eles o ex-presidente Fernando Henrique, o lançamento do governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, à presidência em 2022.
Querido por seus pares no Congresso, Aécio jurou a aliados de Minas que não iria sossegar enquanto não pusesse fim ao período de Doria entre os tucanos.
Réu por corrupção passiva e tentativa de obstrução judicial das investigações da Lava Jato, Aécio teve sua expulsão do PSDB pedida pelo gestor.
Sobreviveu, levou vantagem na indicação da Executiva do diretório nacional, venceu a contenda na escolha do líder e agora prepara o golpe de misericórdia.
Como se isso não bastasse, Doria tem de conviver com outra pedreira em São Paulo: seu ex-padrinho Geraldo Alckmin está disposto a lutar pela candidatura tucana ao governo do Estado em 2022.
A justificativa: o próprio Doria diz que é contra a reeleição.
Ok, você pode dizer que o que o gestor escreve não se assina embaixo.
Verdade. O problema é que Geraldo quer, aliás como já fez em 2006, quando perdeu a eleição para prefeito de São Paulo, encarar a disputa interna pela legenda.
Neste caso, é quase barbada que o gestor vai acabar comendo poeira.
“Doria tomou o PSDB de assalto e fez do partido um balcão de negócios”, diz um militante que pede para não ser identificado.
“O primeiro chega pra lá ele levou no diretório nacional, na escolha da Executiva e do próprio Bruno Araújo, que ele imaginou que fosse seu aliado mas não era bem assim. Perdeu a disputa pela liderança na Câmara e agora está sentindo dificuldade aqui no Estado”.
Na avaliação de tucanos, Doria subestimou o partido.
No início, ainda desconhecido, até tentou certa aproximação com a base. Bastou chegar ao poder para mostrar a sua verdadeira face.
Primeiro traiu Alckmin, tentando tirar do então governador a legenda para a disputa da presidência em 2018. Depois, Bruno Covas, seu vice na prefeitura.
Em uma viagem à França, Bruno foi demitido junto com seu adjunto, Fábio Lepique, da secretaria de Prefeituras Regionais.
O agora prefeito, que trata um câncer no estômago, respondeu ignorando a campanha de Doria para governador em 2018 – na capital, o gestor levou uma surra de Márcio França (PSB) no segundo turno e por pouco não perdeu a eleição.
João Doria surgiu na vida pública negando a política, mas se aproveitou da sólida base do PSDB na capital para chegar à prefeitura.
Usou o cargo como trampolim para alcançar o governo do Estado e agora faz o mesmo no afã de virar presidente.
Além do marketing, que muitos consideram o fino do brega, apoia-se em figuras como ele, sem tradição na vida partidária: Alexandre Frota é o melhor exemplo.
Divertido na redes sociais e esperto no plenário da Câmara, Frota não existe no PSDB. Não participa de reuniões e não interage com colegas. É considerado persona non grata pela militância.
Na outra ponta está Joice Hasselmann, que se indispôs com Bolsonaro e tenta viabilizar sua candidatura a prefeita, ou vice dependendo das circunstâncias, pelo PSL ou por outro partido.
Doria não aprendeu com os erros.
Ao deixar a prefeitura para se candidatar ao governo do Estado, venceu a disputa mas encerrou a campanha vagando sozinho, implorando voto de populares no Largo Treze, no bairro de Santo Amaro, zona Sul da capital.
Ao lado dele meia dúzia de assessores e ninguém mais.
Nenhum deputado, nenhum figurão importante.
Só não saiu derrotado porque seu vice, Rodrigo Garcia, que é do interior do Estado, garantiu uma surpreendente votação nas cidades de pequeno e médio porte embalado pelo furação conservador bolsonarista.
A menos de três anos da eleição para a presidência, o gestor se vê diante de seu grande desafio: superar a pendenga com Aécio e garantir a legenda ou mudar de partido e encarar a disputa na condição de nanico.
Da última vez que ficou só o que salvou foi o acaso, já que ele próprio foi dormir de sábado para domingo achando que havia sido derrotado para Márcio França.
O gestor pode ser bom de lobby, mas de política partidária entende quase nada. A prova é seu recorrente isolamento.