Publicado originalmente no Jornalistas pela Democracia
Sem se dar conta de que havia uma câmera ligada, o ministro da Economia do Brasil foi o que ele é: Paulo Guedes. Destilou seu preconceito contra os pobres, com frases ao estilo do que o ex-presidente Lula costuma incluir nos seus discursos, para ilustrar o porquê do antipetismo, nos últimos cinco anos, ter grassado em praça pública, quando antes era comentado como fez Guedes, à boca miúda. A ilustração feita por Lula: “eles não querem estudar ao lado do filho do porteiro! Eles não querem andar de avião com um pobre sentado do lado” -, ganhou corpo e CPF na voz do ministro, que além de dar cores a falas semelhantes, ainda reclamou, justo no dia em que o país atingia a trágica marca de 400 mil mortos pela Covid, de que o brasileiro tem mania de querer viver 100 anos.
“O Estado brasileiro é um Estado quebrado. Quebrou. E ele quebrou no exato momento em que o avanço da Medicina… Não falo nem da pandemia, falo do direto à vida. Todo mundo quer viver 100 anos, 120, 130. Todo mundo vai procurar o serviço público . E não há capacidade do Estado.”
Faltou pouco complementar que a pandemia não estava fazendo o “serviço” com a rapidez e eficiência de que ele gostaria…
Ainda no início do governo, quando todo poderoso tomou posse de um superministério – que agora corre o risco de perder -, esbravejou e esperneou até conseguir fazer a reforma da Previdência, aplaudido por quantos torcem pelo enxugamento da máquina a qualquer preço e danem-se os trabalhadores. Alardeava o “rombo” nas contas e fazia projeções pessimistas sobre a sustentabilidade dos pagamentos das aposentadorias em futuro breve.
Em uma apresentação feita pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (ANFIP), em 2016, eles apontavam para um déficit no total de R$ 151,9 bilhões. Isto quando a trama do golpe, já em curso, derrubou a economia e levou milhares de trabalhadores ao desemprego, baixando o número de contribuintes e, como consequência, o total arrecadado para honrar os benefícios.
Num estudo feito pelos pesquisadores Marcos de Barros Lisboa (INSPER) Paulo Tafner (IPEA), sob o título: “A Reforma da Previdência e a Economia Brasileira”, no ano de 2017, eles previam que O Brasil estava passando “por uma rápida transição demográfica em comparação com a imensa maioria dos países”, e apontavam que os casais tinham, em média, 6,3 filhos em 1960 e, naquele ano, o de 2017, um casal tinha, em média, 1,8 filho. “Isso significa que a população vai começar a encolher e a fração dos idosos irá aumentar. Esse fenômeno ocorreu nos demais países e resultou na reforma das regras da previdência social para garantir a sua sustentabilidade”, antecipavam.
Mal sabiam os pesquisadores que a pandemia chegaria em 2020 para bagunçar suas contas e projeções. O “encolhimento” da folha ultrapassou qualquer expectativa – embora ainda não tenha deixado Paulo Guedes plenamente satisfeito.
Talvez eu tenha números que irão “animar” Guedes, o ministro, para quem um Estado mínimo é o sonho de consumo. (Isto, quando na contramão do que ele pensa, o país que elege como modelo, os EUA, acaba de injetar 1,9 trilhão de dólares na economia, colhendo 1,6% de crescimento no primeiro trimestre do ano). Mais keynesiano impossível. Quem diria?
A “novidade” é que, por conta da pandemia, houve um baque considerável na folha da Previdência. Sim, ministro, morreu uma parcela significativa de contribuintes, causando uma baixa de cerca de 20%. Satisfeito?
Em conversa com um pesquisador do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), – que por motivos óbvios, em tempos de Bolsonaro, não pode se identificar -, de março de 2020 a março de 2021, ocorreram cerca de 830 mil óbitos no país, representando “benefícios que foram fechados por óbito”. Segundo ele, “desses 830 mil, se a gente assumir que 20% foram por Covid-19, que é a estimativa do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (CONASS) –não necessariamente por Covid, mas foram em função da pandemia –, nesse período a gente teria 166 mil óbitos decorrentes da Covid. Ou seja, 166 mil benefícios cessados nesse período em função da pandemia”, explica. “Num valor médio de R$ 1,400,00 por benefício pago, a gente teria uma economia mensal de R$ 230 milhões. Então, se a gente multiplicar essa economia mensal de R$ 230 milhões por 13, levando em conta o 13º salário, teríamos R$ 3 bilhões de economia”, projetou.