A professora e ambientalista Maria Osmarina da Silva Vaz de Lima diz que está em “estado permanente” de campanha.
Parceira de Simone Tebet no segundo turno, Marina fez questão de afirmar que apoia Lula em setembro. Nesta entrevista ao DCM, ela frisa em diversos momentos a importância de um projeto de sustentabilidade econômica.
Evangélica, lamenta a intromissão do bolsonarismo na religião.
Ressalta a importância da luta de negros contra o racismo e de mulheres contra o machismo.
Em 21 de outubro, na cidade de Belo Horizonte, Marina Silva foi alvo de um ataque covarde em um restaurante de um hotel. Chamada de “vagabunda” por extremistas, a deputada federal eleita fez um boletim de ocorrência.
Diário do Centro do Mundo: Marina, como você vê esse segundo turno com Bolsonaro falando que “pintou um clima” com menores de idade, Roberto Jefferson disparando contra policiais e as diferentes violências de bolsonaristas?
Marina Silva: Esse segundo turno chega na reta final mostrando que o contraste entre o que é a frente ampla que apoia o ex-presidente Lula e aqueles que estão apoiando a campanha e a candidatura de Jair Bolsonaro. Do lado do Bolsonaro nós temos a revelação do desastre político, econômico, social e moral que é esse governo.
Bolsonaro, ao entrar em uma casa que tem adolescentes e que ele conclui ser um espaço de prostituição infantil, em lugar de usar a expressão completamente inadequada e execrável, de “pintou um clima”, deveria ter tomado todas as providências necessárias para investigar sua suspeita.
Ele deveria investigar se a suspeita que ele levantou tinha algum cabimento. Mas ele não fez isso. Bolsonaro foi embora, deixou as crianças naquela situação, como ele imaginou, de prostituição, e só lembrou delas para fazer uso político em sua campanha. Comete vários erros e irresponsabilidades. E crime de prevaricação.
Porque ele é presidente da República. Ao não tomar providências, ele comete prevaricação. Ao deixar crianças à sua própria sorte, em uma situação que ele acreditava ser de vulnerabilidade, Fazendo isso, Jair Bolsonaro comete vários erros do ponto de vista ético, da moral. É inapropriado para ocupar o cargo de presidente da República.
A outra face do desastre da campanha de Bolsonaro é o episódio lamentável de Roberto Jefferson atingindo a ministra Cármen Lúcia com palavras torpes, que não temos nem como repetí-las. Recebendo uma ordem de prisão, ele reagiu à Polícia Federal atirando nas viaturas das autoridades, se fazendo de vítima e buscando um levante contra o Supremo.
Esses são os aliados do Bolsonaro. O presidente também tem feito o movimento de incitar o ódio de irmãos contra irmãos dentro das igrejas. De brasileiros contra brasileiros. Também de pessoas brancas contra pessoas pretas. E assim por diante.
A campanha de Bolsonaro é a que mais tenta intimidar as mulheres. Eu mesma fui vítima de uma situação altamente constrangedora que eu categorizo como violência política de gênero.
Um grupo de bolsonaristas, dentro de um restaurante, começou a gritar o nome do candidato deles. Eles têm o direito político de gritar o nome do candidato deles. Mas não têm o direito de me atingir e de me chamar de “vagabunda”. Isso é o que o Bolsonaro está estimulando na sociedade brasileira.
É uma grande contradição dizer que protege as famílias e atacar as mulheres. A Bíblia tem um total respeito pelas mulheres. Diz que a mulher sábia edifica a sua casa. O Bolsonaro faz questão de destruir a nossa casa.
A nossa casa não é construída apenas por paredes. É construída por respeito, por amor, por afeto. Bolsonaro ataca os principais pilares dessa casa.
Esse ódio que o Bolsonaro e os bolsonaristas têm das mulheres eles têm igualmente com a população preta. Os pretos que têm lutado cada vez mais para conquistar os seus direitos, ampliar os direitos que já foram alcançados, pelo Bolsonaro não teriam acesso às creches, universidades, não teriam acesso às oportunidades para reparar as injustiças sociais, culturais que historicamente eles vêm sofrendo.
Outro grupo que é atingido diretamente pelo bolsonarismo são os indígenas. Esses eles gostariam que nem existissem. Quando eles não aceitam que os indígenas demarquem suas terras. Eles querem eliminá-los do ponto de vista ético, moral e social. Querem eliminar a cosmovisão dos indígenas.
Bolsonaro termina essa campanha revelando de fato quem ele é. E o que de fato ele é. O que se revela desse fato, pode ter certeza, o povo brasileiro não quer. É por isso que ele têm diminuído na intenção de voto e o ex-presidente Lula tem aumentado sua preferência.
A campanha de Lula é um movimento. Aqueles que estão com Lula não estão concordando 100% com o ex-presidente. Mas na democracia nós somos capazes de nos unir, mesmo com divergências, para fazer coisas realmente grandes.
DCM: A senhora já foi mais crítica ao PT e ao ex-presidente Lula. E assumiu uma postura de apoiá-lo contra Bolsonaro. Sente falta de mais políticos tomarem a mesma atitude que a senhora?
MS: Declarei apoio ao Lula no primeiro turno. Sempre disse que estava aberta ao diálogo desde que fossem em bases programáticas. No dia 11 de setembro, o ex-presidente pediu uma conversa, que durou mais de duas horas. No dia seguinte, 12 de setembro, fizemos um ato e eu apresentei um conjunto de propostas na área do meio ambiente, do desenvolvimento sustentável, da democracia e do combate às desigualdades.
Ali, Lula assumiu um compromisso público com a agenda da sustentabilidade, dos povos indígenas e, a partir daquele momento, passei a apoiá-lo de maneira engajada na campanha.
Esse é um momento difícil na história do nosso país. As políticas públicas de Saúde, de Educação, de proteção dos direitos humanos, de combate às desigualdades sociais, estão todas desmontadas. Cada vez mais ameaçadas. É um momento em que temos a violência como forma de fazer política correndo solto nas ruas do nosso país, até mesmo dentro dos lares e das igrejas.
Temos uma situação de ataque contra a nossa democracia. O Brasil não aguentará mais quatro anos de governo Bolsonaro. Nós não teremos a menor chance de sobreviver a uma ação predatória de um governo que não tem o menor compromisso social, ambiental e muito menos com o Estado democrático de Direito. Por isso, entendendo a gravidade do momento, há todo um momento de apoio ao candidato Lula.
Eu me somo a isso. No segundo turno se somaram o PDT, de Ciro Gomes, e Simone Tebet. Esse movimento está sendo cada vez mais ampliado. Não é apenas os partidos e as lideranças políticas. São segmentos da sociedade dos mais variados campos. Eu e a Simone temos feito reuniões com indecisos, com pessoas que iam anular o voto. Esse movimento têm ganhado uma força incrível.
Cada segmento vai adaptando sua expectativa ao candidato Lula. Porque ele sabe que o meio ambiente não tem chance com Bolsonaro, não tem futuro. O empreendedorismo social, comunitário, para pequenos e médios também não tem futuro. Grandes investidores entendem que, num ambiente de instabilidade econômica, política e social, também não há futuro para seus investimentos.
Estão todos se colando no grande transatlântico da democracia.
DCM: A senhora acredita que teve uma atitude diferente de Ciro Gomes?
MS: Cada liderança política age de acordo com suas convicções, de acordo com suas trajetórias e seus legados. Foi muito importante o PDT ter tomado a decisão de imediato no segundo turno, também em cima de um conjunto de propostas, como fez a Simone Tebet, de apoiar a candidatura do ex-presidente Lula.
O ex-ministro Ciro Gomes deu uma declaração afirmando que seguia essa diretriz, a posição do partido. Isso já é muito relevante. Porque é uma campanha que estamos precisando do apoio de todos os democratas, de todos aqueles que têm compromisso com o futuro desse país. De todos aqueles que respeitam as mulheres, que respeitam as nossas crianças, que respeitam o povo preto massacrado nas periferias, nas comunidades onde Bolsonaro não tem qualquer compromisso.
Precisamos do apoio de todos aqueles que têm compromisso com um novo ciclo de prosperidade, de desenvolvimento econômico, gerando empregos, conseguindo seus investimentos, também combatendo a desigualdade e fortalecendo a democracia com sustentabilidade.
DCM: Encerrada as eleições de 2022, como a senhora pretende implementar a pauta de meio ambiente? Pretende ter uma atuação no governo para além da Câmara?
MS: É claro que quando você faz parte de um movimento político dessa magnitude, todos temos a expectativa de contribuir. E essa ajuda eu já estou dando, quando apresentei a plataforma, com conjuntos de propostas, eixo estratégico, diretrizes programáticas como, por exemplo, a de que a política ambiental será transversal.
A contribuição de que iremos fortalecer o sistema nacional de meio ambiente, o Ibama, o ICMBio, o Inpe, recompondo o orçamento desse sistema. A contribuição da política ambiental com controle e participação da sociedade brasileira. Vamos investir em desenvolvimento sustentável. Na parte da agricultura, bioeconomia, da reindustrialização de acordo com os objetivos da sustentabilidade. Já me sinto contribuindo com um novo governo.
Evidente que o maior esforço agora é de ganhar a eleição. E ganhar com uma margem ampliada para cima do Bolsonaro. Tem que ficar claro para a sociedade brasileira de que vencemos o Jair Bolsonaro duas vezes.
No primeiro e no segundo turno. Tem que ficar claro que o povo elegeu Lula e a democracia duas vezes.
Quero insistir que todos os democratas, todos os empresários que querem ver seus negócios prosperarem num ambiente de estabilidade econômica, social, institucional, todos os que combatem o racismo contra a população preta, os que valorizam políticas públicas que respeitem as mulheres, os que querem ver o meio ambiente protegido para assegurar o futuro para a nossa juventude, tem que se ligar no movimento de defesa da democracia.
Quem representa esse movimento é o ex-presidente Lula.
Que todos se mantenham mobilizados. Conversando. Virando voto. Tenho brincado que me encontro em estado permanente de campanha. Cada um poderá fazer esse decreto. Até o último momento, quando as urnas forem fechadas, nós estaremos dando a nossa maior contribuição ao futuro do Brasil.
E a forma de fazer isso é não permitindo que Bolsonaro ganhe mais quatro anos para ser indiferente com a saúde, que foi o momento que mais precisamos e foi o momento que ele foi indiferente.
Bolsonaro tem uma postura de desrespeito com as mulheres. Que a gente possa, nesse movimento, valorizar as mulheres. Inclusive com políticas públicas de creche, transporte coletivo, que assegure uma melhor condição de se trabalhar e de se estudar. Mais respeito com o futuro de nossas crianças e jovens.
É estado permanente de campanha. Elegendo Lula presidente, porque ele é quem reúne as melhores condições para a gente ter uma perspectiva de futuro. Onde todos podem se encontrar para desenvolver os seus projetos com autonomia e liberdade.
Apoiar o Lula não significa concordar 100% com ele. Significa que, na democracia preservada, nós podemos caminhar juntos e fazer coisas muito importantes juntos mesmo discordando entre nós.