O verdadeiro mistério está no visível e não no invisível, escreveu Oscar Wilde. Na semana passada, um homem abriu mão de ganhar milhões de dólares com algo que inventou numa tarde — e que amava.
O homem é o vietnamita Dong Nguyen, 29 anos. Ele anunciou que iria retirar de circulação o “Flappy Bird”, jogo mais baixado de todos os tempos. “Eu não suporto mais”, disse ele, emulando os grandes artistas que destroem sua obra-prima.
Cinquenta milhões de pessoas tinham baixado o joguinho, que é de uma simplicidade atroz: você precisa controlar um pássaro com toques na tela e ajudá-lo a atravessar uma série de brechas entre canos verdes. Após a atitude de Nguyen, smartphones com o “Flappy Bird” instalado estariam sendo leiloados a 20 mil dólares. Ele mesmo declarou que estava fazendo 50 mil por dia.
Ninguém entendeu. Enlouqueceu? Fez um voto de pobreza? Foi uma jogada de marketing de mestre?
É uma fábula moderna no mundo das novas tecnologias. O lançamento, em maio de 2013, passou despercebido. Em fevereiro, explodiu e bateu fenômenos como “Candy Crush” e “Angry Birds”.
Nos fóruns especializados, há histórias de gente se queixando, a sério, de que o game acabou com sua produtividade e sua sanidade. Alguém criou uma conta no Twitter chamada “Flappy Bird Problems”, com 140 mil seguidores viciados.
O design é pobre, a música é besta, o nível de dificuldade é alto. Qual o segredo?
Nguyen foi acusado de trapaças. Estaria usando robôs para obter tantos downloads. Se, no início, dava conselhos compreensivos aos jogadores (“Vá com calma. Não aperte com força ou muito rapidamente”), teve de lidar com as frustrações de milhares de pessoas e as especulações maldosas de outras tantas. “O sucesso é algo que eu nunca quis. Por favor, me deixem em paz”, replicou a certa altura.
Ao jornal inglês The Independent, ele afirmou que trabalhava por amor e não por dinheiro. “Eu acho que a razão principal por que meus games são tão populares é a competição entre os jogadores e a simplicidade” disse. “Eles são terrivelmente simples, fáceis de aprender e requerem apenas uma habilidade. As pessoas querem competir de verdade e não ‘pagar para ganhar’”.
O próprio Nguyen, no entanto, preferiu não competir. Decepcionou-se com o que viu em 15 minutos de fama. O “Flappy Bird”, disse, “arruinou minha vida simples. Então agora eu o odeio”. Teve propostas. Poderia crescer, contratar funcionários, alguns advogados e se preparar para ficar milionário.
Sugeriram-lhe uma empresa de relações públicas. “Não quero. Isso faria com que eu não fosse mais um criador de games independente”.
O vietnamita não quis perder sua pureza. Nada impede que Nguyen mude de ideia e se torne, no mês que vem, mais um empreendedor da Internet que ficou rico da noite para o dia. Mas, por enquanto, ele é um símbolo de que nem tudo está à venda e que é possível escolher outro caminho.
Esperto. Como diz um provérbio vietnamita, “não importa quão afiada, uma faca nunca corta o punho de quem a segura”.