Na reunião com dinâmica golpista que fundamentou a operação da Polícia Federal (PF) contra Jair Bolsonaro (PL) e seus aliados, o então ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário, chamou de “uma merda” um relatório técnico que não encontrou fraude no sistema de votação e que foi engavetado pelo governo Bolsonaro.
Durante a reunião ministerial ocorrida em julho de 2022, Rosário sugeriu ao ex-chefe do Executivo a necessidade de uma “força-tarefa urgente” envolvendo a PF e as Forças Armadas para criticar as urnas eletrônicas.
“Presidente, um ponto importante. […] Eu recebi o relatório da última fiscalização da CGU, e eu não tive coragem de mandar, porque o relatório estava horrível, uma merda, não falava nada com nada. […] Eu não entendi nada do relatório”, afirmou Wagner Rosário a Bolsonaro.
“A forma como [o relatório] foi montado não permite uma fiscalização propriamente dita. […] O sistema que faz a segurança da urna está numa linguagem que na CGU eu não tenho nenhum especialista. Mesmo que eu queira auditar, eu não vou conseguir. Ele tem 20 milhões de linhas de programação. São 20 milhões de linhas. Então imagina aí o tempo que a gente necessitaria para auditar isso. Talvez no meio dessas linhas tenha algum tipo de problema”.
Wagner Rosário, atual controlador-geral de São Paulo, auxiliar do governador Tarcísio Freitas, fez menção ao relatório “Atuação da CGU como Entidade Fiscalizadora das Eleições 2022”, concluído em 1º de dezembro de 2022, segundo informações do colunista Guilherme Amado, do Metrópoles.
Neste documento, a CGU, após inspeções em nove estados, não identificou inconsistências no sistema eletrônico de votação, marcando a primeira tentativa da CGU de auditar as urnas eletrônicas.
O material de 30 páginas, fruto da frustração do governo, não foi publicado pela CGU, o que é atípico, e veio a público apenas por meio da Lei de Acesso à Informação no ano passado.
Ao mencionar as 20 milhões de linhas de código referidas na reunião ministerial, o relatório detalhou que os sistemas são desenvolvidos em diversas linguagens de programação, totalizando quase 20 milhões de linhas de código.
Após criticar o relatório, Rosário sugeriu recorrer às Forças Armadas, presentes na comissão fiscalizadora do Tribunal Superior Eleitoral, e à Polícia Federal, subordinada ao então ministro da Justiça, Anderson Torres.
“A gente tem que procurar as Forças Armadas, junto com a Polícia Federal. A Polícia Federal também fez um trabalho. Que eu sei que fizeram uma coisa mais profunda. […] Essa junção PF, Forças Armadas e CGU, a gente tem que fazer urgente, urgente. Monta as equipes… A gente chegar ao consenso: ‘Isso aqui tem que ser porque não temos garantia disso. E aí já não é mais as Forças Armadas falando. São três instituições. A gente tem que se preparar para atuar em força-tarefa nesse negócio”, seguiu Rosário, dirigindo-se a Bolsonaro.
Logo após essa fala, Wagner Rosário hesitou e questionou se a reunião estava sendo gravada. “A reunião está sendo gravada? Tá? Hein, presidente? Está sendo gravada?, ao que Bolsonaro respondeu: ‘Não, eu mandei gravar a minha fala'”, fazendo sinal de positivo.
Vale destacar que esse reunião foi utilizada pela PF nas investigações que apontaram as articulações do governo Bolsonaro para dar um golpe de Estado. O vídeo da reunião foi encontrado pelos investigadores nos arquivos do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.