O diplomata Thomas Shannon, ex-embaixador no Brasil e referência nos Estados Unidos para temas da América Latina, disse que Jair Bolsonaro (PL) parece estar preparando o caminho para questionar o resultado das eleições de outubro. Segundo ele, o atual chefe do governo e sua equipe estudaram a estratégia adotada pelo ex-presidente americano, que em 6 de janeiro de 2021 instigou uma invasão do Capitólio para tentar reverter a derrota no pleito presidencial.
Em entrevista à Folha de S. Paulo, Shannon disse que não entende porque o atual chefe do governo brasileiro fez uma reunião com embaixadores para propagar mentiras sobre o sistema eleitoral. Ele disse que acha que Bolsonaro indicou um desejo de explicar pra essa comunidade em Brasília, uma das maiores do hemisfério Ocidental, por que não confia no sistema eleitoral.
“Acho totalmente surpreendente que um presidente, eleito por esse sistema e que chefia um governo que representa a vontade popular, coloque em questão o sistema eleitoral do próprio país. E fazer essa argumentação para uma audiência diplomática transforma o surpreendente em perigoso. Ele parece estar preparando o caminho para não aceitar o resultado das eleições”, pontuou ele.
Perguntado se acha que isso confirma a análise de que o político do PL está imitando a estratégia de Trump, o diplomata declarou que acredita que Bolsonaro e sua equipe estudaram atentamente os eventos de 6 de janeiro de 2021 e chegaram a uma conclusão. “Primeiro, que Trump fracassou porque dependia de uma multidão pouco disciplinada e não tinha apoio institucional —de lideranças partidárias, tribunais, Forças Armadas. Bolsonaro e sua equipe avaliaram que, na hipótese de tentar algo parecido, precisariam de apoio institucional.”
“No entanto, na eleição de Joe Biden, embora no voto popular tenha ocorrido uma diferença de 7 milhões de votos, no Colégio Eleitoral houve um resultado bem apertado, o que permitiu que Trump argumentasse que houve fraude. No Brasil as pesquisas indicam no momento que a disputa não está apertada. Então a pergunta a ser feita é: qual o plano do presidente Bolsonaro? Esperar a votação ocorrer e declará-la inválida? Ou impedir que a eleição ocorra ao desqualificar todo o processo agora?”, questionou ele.
Ainda segundo Shannon, as chances de Jair Bolsonaro ser bem-sucedido numa eventual tentativa de ruptura tendo apoio institucional depende muito das instituições brasileiras e como elas vão responder. “Recai sobre elas a tarefa de deixar claro que têm confiança no sistema eleitoral brasileiro”, completou.