Esta é mais uma reportagem da série do DCM dedicada a investigar o papel da Sabesp e de seu controlador, o governo do estado de São Paulo, na crise da falta de água. As demais matérias estão aqui.
O DCM obteve as planilhas de investimento em publicidade da Sabesp nos anos de 2010, 2011, 2012, 2013, 2014 e 2015 até o mês de abril. De acordo com os documentos, a empresa gastou R$ 44.462.117,03 no ano passado, quando Geraldo Alckmin foi reeleito no auge da crise da falta de água com pouca cobrança na imprensa. As operações fazem parte do plano de investimentos de uma companhia com valor de mercado estimado em R$ 15 bilhões.
A Sabesp já investiu R$ 20.135.566,03 mi até o mês de abril está numa tendência de alta. O valor é praticamente o dobro dos R$ 11.074.787,61 aplicados entre janeiro e junho do ano passado.
O aumento dos investimentos publicitários da Sabesp reforça as acusações de Renê Vicente dos Santos, presidente da SINTAEMA (Sindicato dos Trabalhadores em Água, Esgoto e Meio Ambiente), ao Ministério Público do Estado no dia 6 de maio. Funcionário há 18 anos, ele disse aos promotores que a população não foi informada da gravidade da crise na Cantareira de propósito.
“Desde o mês de dezembro de 2013 já era notória, dentro da Sabesp, a gravidade da situação e que esta refletiria no fornecimento de água na região metropolitana. Ficou claro, no entanto, que por se tratar de um ano eleitoral, o assunto não deveria se tornar público”, disse Renê.
A Sabesp divide as propagandas em rádios, jornais, revistas, sites e em outras agências de comunicação. As campanhas são de economia de água e promoção da marca.
O aumento do investimento contrastou com a timidez ou o falso otimismo da cobertura jornalística da crise. A maior parte do montante foi para Globo Comunicações e Participações S/A, TV SBT Canal 4 de São Paulo, Universo Online S/A, Empresa Folha da Manhã S/A, S/A O Estado de São Paulo.
Só na primeira metade de 2014, a Sabesp investiu mais de R$ 11 milhões. Com a seca, o valor aumentou. No segundo semestre do ano passado, o dinheiro de anúncios subiu para R$ 33.387.329,42, o triplo do valor, quando o governador Geraldo Alckmin foi reeleito e o diretor metropolitano Paulo Massato disse que os paulistanos teriam que abandonar a cidade se a seca do Cantareira piorasse.
A maior parte dessas empresas de comunicação é enquadrada como cliente de “demanda firme” em suas contas de água. A Globo e a Folha, por exemplo, possuem descontos de até 75% em suas sedes.
Enquanto a Operação Lava Jato mereceu menções diárias no Jornal Nacional, a seca do Cantareira só ganhou holofotes na Globo no programa Fantástico, e mesmo assim poupando o nome do governador ou de seu partido. O Uol deu manchetes positivas toda vez que o sistema Cantareira aumentava seu volume nas chuvas entre fevereiro e março de 2015. A Veja não deu nada sobre o assunto. A Veja São Paulo, principal revista da cidade, mencionou a questão en passant, sonegando informações importantes aos seus leitores.
Com investimentos milionários em comunicação e uma mãozinha da mídia amiga, a Sabesp mascara sua crise. Nada sobre, por exemplo, as denúncias de que pelo menos oito empresas terceirizadas teriam ex-funcionários em seus quadros e para vencer 42 licitações no projeto de perdas de águas, que é um dos fundamentais para manter o nível da Cantareira mais estável durante a crise.
Atualmente, a Sabesp perde cerca de 30% da sua água em tubulações, com picos de até 40% segundo seus funcionários. O exército já deu as caras na sede. As chuvas pararam em São Paulo em abril. Quando a empresa prezar por transparência e deixar de financiar os amigos com tanta vontade, talvez os paulistas tenham uma chance de passar pela seca com menos sofrimento.