A Polícia Civil do Estado de São Paulo chegou ao local onde estava a pistola que teria sido utilizada para desferir o disparo fatal contra o soldado da Rota Patrick Reis, morto no último dia 27 no Guarujá (SP), por meio de uma denúncia voluntária (em teoria) de um usuário de drogas e morador da comunidade Vila Zilda.
Ele foi colocado pelas autoridades sob proteção de testemunhas que correm risco de morte, mas a polícia descumpriu sua própria determinação e está divulgando nos autos públicos do inquérito o nome, o sobrenome e o apelido de sua testemunha voluntária, que não sofreu (em teoria) qualquer pressão ou tortura para colaborar com os policiais.
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Como é de conhecimento comum, qualquer pessoa que denuncia traficantes de drogas à polícia passa imediatamente a correr risco iminente de morte por assassinato. É a Lei do Tráfico.
Não por outro motivo, a testemunha foi colocada sob programa de proteção a depoentes que correm risco de morte, nos termos do Provimento nº 32/2000, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, que, em seus artigos 3º e 4º, apregoa:
Artigo 3º – As vítimas ou testemunhas coagidas ou submetidas a grave ameaça, em assim desejando, não terão quaisquer
de seus endereços e dados de qualificação lançados nos termos de seus depoimentos. Aqueles ficarão anotados em impresso
distinto, remetido pela Autoridade Policial ao Juiz competente juntamente com os autos do inquérito após edição do relatório.
No Ofício de Justiça, será arquivada a comunicação em pasta própria, autuada com, no máximo, duzentas folhas, numeradas,
sob responsabilidade do Escrivão.
Artigo 4º – Na capa do feito serão lançadas duas tarjas vermelhas, que identificam tratar-se de processo onde vítimas ou
testemunhas postularam o sigilo.
Veja, abaixo, manifestação do Ministério Público nos autos do inquérito policial que investiga o assassinato do soldado da ROTA, a que o DCM teve acesso. No trecho reproduzido, os promotores estão solicitando a quebra de sigilo telefônico de alguns dos suspeitos. Em dado momento, o MP-SP afirma que o usuário de drogas que dedurou voluntariamente (em teoria) o esconderijo da arma do crime foi colocado no programa de proteção a testemunhas:
A Polícia Civil do Estado de São Paulo, porém, descumpriu peremptoriamente a sua própria determinação, expondo nos autos públicos (aos quais todo cidadão tem direito de acesso, incluindo os próprios envolvidos no crime e suspeitos de tráfico que já estão presos ou estão sendo perseguidos e ainda não foram mortos) o nome, o sobrenome, o apelido e mais dados pessoais de sua testemunha voluntária (em teoria).
Os trechos reproduzidos abaixo são partes dos autos públicos do inquérito em que aparecem o nome, sobrenome e apelido da testemunha que deveria ser protegida. O DCM retirou por conta própria essas informações na reprodução abaixo. Se a polícia quer expor sua testemunha (em teoria, voluntária), este veículo não irá ajudar.
Resta saber por que a Polícia Civil estaria expondo sua própria testemunha, que, voluntariamente (em teoria) colocou sua vida em risco e jamais poderá novamente frequentar o mesmo ponto de droga que sempre frequentou. O advogado criminalista André Lozano Andrade, do escritório Lozano Barranquera Advocacia, professor de Direito Penal e Direito Processual Penal, e autor do livro “Populismo penal: comunicação, manipulação política e democracia”, afirma o que segue abaixo:
“A Polícia claramente está descumprindo o Provimento 32 do Tribunal de Justiça de São Paulo e colocando sua própria testemunha em risco. A polícia, sabedora de que a testemunha está em risco, e ainda assim expondo suas qualificações nos autos, age como se seu objetivo fosse o de que essa pessoa seja morta, agora pelo crime. Ocorre que é a própria polícia que está gerando esse risco. Parece que se está diante de um caso de terceirização de assassinato.”