Por Stefani Costa, de Lisboa
Depois do convite do ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal para que Lula participe no Parlamento em sessão solene do 25 de Abril (Revolução dos Cravos), líderes de vários partidos da direita e da extrema-direita do país estão se manifestando contra a decisão.
O anúncio do chanceler João Gomes Cravinho aconteceu na última quinta-feira (23) durante uma coletiva de imprensa no Palácio Itamaraty em Brasília.
A viagem teve como objetivo acertar os detalhes a respeito da cimeira luso-brasileira marcada para acontecer entre os dias 22 e 25 de abril na capital lusitana. Na agenda do ministro português também constava uma reunião com o vice-presidente Geraldo Alckmin.
Na última sexta-feira (24) o líder do partido Iniciativa Liberal, Rui Rocha, ameaçou deixar o plenário junto com os demais deputados da legenda caso Augusto Santos Silva (presidente da Assembleia da República) confirmasse a participação de Luiz Inácio no dia 25. Segundo ele, a ação foi uma afronta à democracia, pois o tema não foi colocado em debate entre os demais parlamentares.
André Ventura, presidente do partido de extrema-direita Chega, convocou na tarde desta terça-feira (28) uma coletiva de imprensa para repudiar a visita de Lula a Portugal. O líder afirmou que fará o maior ato contra um chefe de Estado já visto em Portugal se o presidente brasileiro comparecer à Assembleia no dia da Revolução dos Cravos.
“Lutaremos com todos os meios que estiverem ao nosso alcance para impedir o discurso no Parlamento em 25 de abril deste ano. O contato que fizemos com associações de imigrantes brasileiros, empresários, algumas igrejas evangélicas e parceiros no Brasil, mostram que é possível mobilizar a comunidade para a maior manifestação de sempre!”, afirmou.
Ventura disse ainda que Luiz Inácio Lula da Silva não terá vida facilitada em seu país e que a corrupção endêmica que está destruindo a democracia portuguesa tem laços e ramificações no Brasil. “Trazer um elemento de contaminação no dia 25 de Abril enquanto tantos falam de pacificação e estabilização é o pior que podemos fazer à democracia”, reforçou.
Conhecido por apoiar fortemente o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), em janeiro deste ano o líder do Chega já havia chamado Lula de “bandido” durante uma sessão parlamentar.
Direto ao ponto
A reaproximação entre Brasil e Portugal já teve sua largada antes mesmo da posse de Lula. Em novembro do ano passado, o primeiro-ministro António Costa (PS) recebeu o então presidente eleito em sua residência oficial. O chefe de Estado Marcelo Rebelo de Sousa (PSD) também abriu as portas do Palácio de Belém ao petista.
Na ocasião, além da participação na cimeira luso-brasileira, Luiz Inácio havia confirmado que regressaria ao “país-irmão” para assinar o diploma do prêmio Camões de Literatura junto de Chico Buarque.
O ato simbólico de estar em Portugal na semana em que o país celebra a liberdade é importante. Entretanto, a volta de Lula também se faz necessária por outros motivos. Com o aumento no custo de vida e a falta de apoio do governo lusitano à comunidade brasileira, muitos cidadãos estão solicitando ajuda para regressar ao Brasil.
As já conhecidas falhas estruturais do SEF (órgão que emite as autorizações de residência e trabalho no país), aliadas ao desemprego, à alta da inflação e à crise na habitação, têm levado milhares de imigrantes a enfrentarem dificuldades para sobreviver.
Atualmente a lista de pendências com estrangeiros no SEF já ultrapassa 200 mil pessoas, segundo o ministro da Administração Interna de Portugal, José Luís Carneiro. No mês passado a embaixada do Brasil em Lisboa, juntamente com os três consulados no país, divulgou que neste índice já são mais de 100 mil brasileiros à espera de resposta.
Pedro Prola, coordenador do Núcleo do PT em Lisboa, acredita que a visita e a participação de Lula será fundamental para aprofundar os laços históricos entre Brasil e Portugal depois de quatro anos de pouco diálogo.
Segundo ele, Luiz Inácio sempre esteve envolvido nas atividades do 25 de Abril, sendo respeitado em todas as esferas da sociedade portuguesa. “Nesse momento de esperança com a retomada da democracia no Brasil, a comunidade brasileira em Portugal vai receber Lula com alegria e espírito democrático”, pontua.
A tentativa de instrumentalização da visita de Lula ao Parlamento português também vem mobilizando associações de imigrantes brasileiros. Cyntia de Paula, presidente da Casa do Brasil de Lisboa afirmou que Lula é muito bem-vindo e que será uma enorme alegria recebê-lo novamente em uma data tão importante para a democracia e para a liberdade.
“A Casa do Brasil reconhece que partidos de extrema-direita elegem como inimigos principalmente as pessoas imigrantes. A tentativa de impedir a visita do presidente Lula é um ato deplorável e não representa a comunidade brasileira. Um fato comprovado na eleição de 2022, em que Luiz Inácio obteve maioria em Portugal, com 65% dos votos válidos no segundo turno”, finaliza.