A Embaixada do Brasil em Moscou informou que vai aguardar o pedido de asilo político de Eduardo Fauzi ser decidido para visitá-lo no Centro de Detenção de Ekaterinburgo. Suspeito do ataque com coquetéis molotov à produtora Porta dos Fundos, ele está preso há mais de quatro meses na Rússia.
A informação consta de um e-mail enviado, nesta quinta-feira (14), à namorada russa de Fauzi, com quem ele tem um filho. Sputnik Brasil teve acesso à troca de e-mails entre ela e a embaixada. No dia 20 de novembro de 2020, a representação diplomática informou o seguinte:
“Ontem, nós recebemos a autorização para visitar Eduardo. Já entramos em contato com o centro de detenção para informá-los de que pretendemos visitar o Sr. Fauzi em 10 de dezembro e aguardamos uma resposta deles sobre se aprovam a data sugerida. Assim que tivermos uma resposta positiva deles, só vamos esperar que os bilhetes de viagem sejam autorizados pelo Ministério das Relações Exteriores”, lê-se no e-mail, em inglês.
Por dois dias consecutivos, Sputnik Brasil questionou o Itamaraty a respeito da visita da embaixada a Fauzi e também em relação a seu processo de extradição, mas não obteve respostas até o fechamento desta reportagem. Há um ano, emissários brasileiros deram início às tratativas com diplomatas russos para extraditá-lo, mas o Ministério das Relações Exteriores não confirma oficialmente.
Paralelamente, a namorada de Fauzi pagou RUB 1.275 (R$ 91,80) por uma Declaração de Estado Civil, atestando que ele não é casado no Brasil, mas alega que a certidão não foi expedida. Eles pretendem se casar. O matrimônio com uma russa facilitaria o pedido por asilo político. O Itamaraty também foi questionado sobre isso, mas não respondeu.
Na primeira parte da entrevista exclusiva ao correspondente da Sputnik Brasil em Lisboa, Fauzi revelou que contou com a ajuda de “camaradas gregos” que o orientaram com um protocolo de segurança para que ele não fosse preso na Rússia. “Deu azar”, nas suas próprias palavras. Segundo fontes, os gregos teriam ligação com o Aurora Dourada, partido neonazista, cujo líder, Nikos Michaloliakos, conhecido como “pequeno Fuhrer”, foi condenado a 13 anos de prisão em outubro de 2020, assim como outros cinco deputados e dirigentes.
Na segunda parte, publicada a seguir, Fauzi diz que lutará contra a extradição, “não importando o quão duras sejam as condições de encarceramento em uma prisão da Sibéria”. Ele também comenta o lema integralista “Deus, pátria e família”, adotado por Jair Bolsonaro, para quem fez campanha presidencial. Elogia o presidente como sendo o primeiro em cujo gabinete não houve corrupção, apesar de seu filho Flávio Bolsonaro ter sido denunciado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro (MP-RJ) pelos crimes de peculato, apropriação indébita, lavagem de dinheiro e organização criminosa, assim como Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio e amigo do presidente.
Por fim, Fauzi fala sobre as referências (in)diretas feitas a ele no último especial de Natal do Porta dos Fundos, a sátira “Teocracia em vertigem”.
Confira a segunda parte da entrevista.
Sputnik: Quem mais o visita além de seu advogado? Com que frequência pode receber visitas? E falar ao telefone?
Eduardo Fauzi: O meu regime de prisão não permite qualquer contato com o mundo exterior. Só posso receber visitas dos advogados e ainda assim por apenas 20 minutos. Falo com eles através de um interfone separado por uma janela de vidro. Zero contato humano. Além deles, eu recebo visitas dos promotores e de alguns oficiais do governo russo ligados ao departamento de imigração e que têm interesse no meu caso.
Eu requeri um encontro com diplomatas brasileiros. A embaixada brasileira [em Moscou] informou que recebeu autorização do Itamaraty e até a liberação da verba referente às despesas de viagem, que havia sido agendada para o dia 10 de dezembro, mas até agora não apareceu ninguém aqui. Eu ainda requeri, via ofício, que a embaixada se manifestasse por escrito, recomendando a alteração do meu regime prisional de fechado para prisão domiciliar, ou alguma outra modalidade menos restritiva de confinamento, no que eu também fui completamente ignorado. Se os diplomatas brasileiros não querem vir até Ekaterinburgo que, ao menos, devolvam ao Itamaraty o dinheiro das passagens. Não apenas isso, nós requeremos um documento chamado Declaração de Estado Civil, que atesta que eu não sou casado no Brasil. O serviço de expedição é pago, e não é barato. Eles receberam o dinheiro e não expediram a certidão. Os caras simplesmente não querem trabalhar e fazem questão de atrapalhar a minha vida nos mínimos detalhes. Tenho sérias dúvidas se não terão sido cooptados para isso. Tudo é muito estranho.
S: Antes de ser preso, você havia dito que tinha sido sondado por três partidos políticos, tinha planos de voltar ao Brasil e ser vereador. Na atual situação, prefere ser extraditado ou permanecer preso na Rússia? Por quê?
EF: O sistema tem se articulado para agilizar a minha extradição para o Brasil e me submeter a um massacre midiático e a um linchamento jurídico, para me fazer de exemplo, dar um recado claro de que pensadores dissidentes e de viés conservador não serão mais tolerados pelo establishment. A minha destruição pessoal é a principal ferramenta para legitimar o “Jesus Cristo gay” e toda a maldita pauta progressista que ele carrega, de destruição dos valores morais e da espiritualidade popular que cimentaram os alicerces sobre os quais a nação brasileira foi fundada e sem os quais ela colapsará. Retornar ao Brasil em liberdade e segurança, pelos meus próprios pés e sem algemas ou escolta, será um tapa na cara do sistema e uma vitória de todo o povo brasileiro. E por isso é que eu lutarei contra a extradição, não importando o quão duras sejam as condições de encarceramento em uma prisão da Sibéria, porque, em última instância, estarei lutando pelo meu povo e pela minha pátria. Já não há meio termo possível. A vida não tolera covardes. A História não respeita medíocres. Qualquer um que, nesse momento, se manifestar contra mim e trabalhar pela minha extradição estará cooperando com o “Jesus gay”, contra o povo, contra Deus, a pátria e a família brasileira. Há, nesse momento, dois campos bem definidos: ou se é a favor de Eduardo Fauzi, ou a favor do “Jesus gay” e do PDF. Já não há meio termo possível.
S: Você usa o lema integralista “Deus, pátria e família”. O mesmo tem sido usado por Bolsonaro: em outubro, durante a inauguração de uma adutora de abastecimento de água em Pernambuco; em junho ao postar uma foto ao lado do ministro Augusto Heleno no Twitter; além de ter sido cogitado como slogan do Aliança pelo Brasil, partido que ainda não saiu do papel. Você vê traços do integralismo no governo de Bolsonaro? Quais?
EF: ‘Deus, pátria e família’ não é monopólio do integralismo, mas uma verdade universal, aplicável a todos os tempos e lugares. As únicas coisas pelas quais vale a pena matar, morrer e lutar são pelo seu deus, sua pátria e sua família. Todo o resto é circunstancial, só a tríade é substancial, eterna e imutável. De fato, todo aquele que crê na tríade como verdade política já é um integralista, ainda que não queira ou ainda que não saiba. Não posso afirmar com certeza, mas acho muito difícil que os ideólogos do novo partido não soubessem disso quando elegeram a tríade para lema. E isso muito me agrada. Eu fiz campanha para o presidente, de forma gratuita e desinteressada, e não me arrependo.
S: O que acha do governo de Bolsonaro? Cogita apelar a ele para não ser extraditado?
EF: O fato de pela primeira vez na História termos tido um gabinete presidencial com zero corrupção deveria ser motivo de celebração nacional. A diminuição de mais de 20% nos índices de criminalidade violenta, o que representa cerca de 10 a 15 mil vidas salvas anualmente, nossos pais, parentes e amigos, confirma meu entendimento de que ele é o melhor presidente que o país teve na Nova República. Por mim, deveriam dar a ele um mandato de 10 anos com direito à reeleição. Todo o ódio que a Globo e toda a mídia globalista devotam contra ele só me faz mais confiante na certeza desse julgamento. No entanto, eu não tenho qualquer interlocutor junto ao governo nem creio que o presidente tivesse como me ajudar institucionalmente, já que a extradição agora é uma decisão que cabe apenas ao governo russo.
S: Na sátira “Teocracia em vertigem”, a figura de Judas Iscariotes é apresentada ora como Michel Temer, ora como Fabrício Queiroz, ora como Bolsonaro. Em determinado momento, uma personagem diz: “Eu acho que ele está foragido na Rússia”. Em outro, o próprio personagem Judas fala: “Minha tia, hoje de manhã, veio me perguntar que estavam comentando no grupo de zouk”. Como você interpreta essas referências? Você se identifica com(o) Judas?
EF: Quem assistir a esse filme fora do Brasil, ou daqui a 10 anos, não vai entender as referências. Isso demonstra claramente a falta de talento do PDF, um humor nanico que não ultrapassa os dois minutos de formato. Qualquer coisa que eles fizerem acima disso será inevitavelmente uma merda. O longa-metragem deles é uma das maiores vergonhas do cinema brasileiro de todos os tempos. E eu falo isso na qualidade de cineasta, já que eu também cursei faculdade de cinema. Eles simplesmente não têm como produzir nada que preste além de dois minutos. O talento desses patifes é uma ejaculação precoce, nada mais. Para compensar esse lapso, eles têm que tentar politizar o trabalho deles. Falar mal de Jesus é a sua única forma de conseguir algum destaque na mídia, já que o talento não os ajuda. Crucificar Jesus novamente, vendê-lo por 30 moedas de prata, ou por 15 minutinhos de fama, não tem nada de novo, de original ou de revolucionário. Isso é tão clichê e tão antigo quanto o próprio Cristo, além de um absoluto mau gosto. Esse raciocínio não deixa dúvidas: eles é que são os que, se fosse dois mil anos atrás, teriam vendido Nosso Senhor por 30 moedas de prata. São os Judas do novo milênio, versão século XXI. Quando a revolução integralista vier, não terei piedade.
S: Ao final do especial de Natal, Fábio Porchat interpreta Jesus em um musical que questiona se Jesus vai voltar ou não. Depois dos versos “Já voltei uma vez preto, uma mulher e outra travesti / Nas três vocês já me mataram, por isso que eu desisti / Se for pra voltar de novo, vai ser pra destruir”, aparecem frames da gravação das câmeras de segurança da produtora Porta dos Fundos durante o ataque com coquetéis molotov e a explosão da bomba. Mais adiante, o personagem interpretado por Porchat diz: “Vocês estão brincando com fogo”. Qual a sua interpretação? Quem estaria brincando com fogo? Por quê?
EF: Jesus “voltou” três vezes? Como “preto, mulher e travesti”? Não há licença poética que sustente esse absurdo teológico. Jesus, branco, heterossexual e homem veio uma única vez, foi preso, barbaramente torturado e publicamente executado pelas forças militares de um Estado policial, a mando das elites de seu próprio povo. Foi traído por um amigo e preterido pelos seus irmãos em favor de um bandido comum. É símbolo máximo de todo aquele que sofre injustamente, de todo órfão e viúva, de todo bebê odiado e assassinado no ventre pela sua própria mãe. Todo o que passa frio e fome, todo o torturado, perseguido e preso pela sua defesa da verdade, que é Jesus Cristo, tem em Nosso Senhor um companheiro de infortúnio e uma ferramenta de poder, liberdade e salvação. Destruir a mensagem do Cristo é massacrar os que sofrem e cooperar com os poderes do inferno, a quem os integrantes do PDF servem com uma dedicação que me causa espanto.
Sob esse aspecto, a mensagem do Fábio Porchat é clara e pode ser perfeitamente subentendida por debaixo do verniz de uma arte duvidosa: não mexam conosco ou estarão mexendo com fogo! Todo aquele que se opuser ao PDF ou ao projeto político macabro e opressivo a que eles servem sofrerá combate sem trégua. Será ‘queimado’ e destruído, exatamente como eles estão querendo fazer comigo. Isso não passa de uma bravata ridícula que não tem a potência de um peido. Quero ver falar na minha cara e vir me ameaçar na minha presença. Aliás, um amigo meu, e que é professor da UFRJ, tem o projeto de usar o Auditório Pedro Calmon, no Instituto da Economia da UFRJ, onde eu me formei, para realizar um debate aberto sobre os limites da liberdade de expressão e convidar Gregório Duvivier, Fábio Porchat, eu, entre outros. Duvido que aceitem, mas, pra mim, seria um prazer massacrá-los em seu próprio ambiente. Quando eu voltar, o que será em breve se Deus assim o permitir, veremos, mas já fica aqui registrado o convite.