Nunca foi novidade que a política no Brasil não é espaço para amadores.
Ulisses Guimarães tinha uma piada pronta para definir os protagonistas da cena: “Nosso político mais bobinho conserta relógio com luva de boxe. E no escuro”.
A situação só piorou desde que Ulisses proferiu a famosa frase.
Para cada Franco Montoro hoje temos meia dúzia de Joice Hasselmanns.
Para cada Mário Covas um tanto de Bolsonaros sangue ruim.
Bom lembrar que o PSDB de Montoro e Covas acabou virando ao mesmo tempo cúmplice e protagonista desta degradação.
Vejamos o golpe de 2016, com a retirada de Dilma do Palácio do Planalto e que resultou na conjuntura de caos vivemos: começou com Aecio, contestando o resultado das urnas e depois usando dinheiro público para comprar de Janaína Paschoal, por R$ 50 mil, uma farsa que se chamou se peça jurídica para sustentar o impeachment.
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E quem foi um dos principais propagandistas dessa imoralidade? Outro tucano: João Doria, que acabara de surgir mentindo feito Pinóquio para se eleger prefeito de São Paulo, se dizendo gestor, negando a política, e abraçando o bolsonarismo e toda violência nele contida.
Agora, em lados opostos dentro do mesmo partido, Aécio e Doria voltam aos holofotes. Ambos sujos, desprezíveis. Trapaceiros.
Semana passada, o DCM alertou para a cilada que o mineiro armou contra seu desafeto paulista nas prévias do partido: Aécio criou um sistema de castas na votação para a escolha do candidato à presidência.
Por ele, cada um dos 44,7 mil filiados inscritos para votar tem um peso: obviamente tem menos o filiado comum, aquele que carrega bandeira e toma sol no rosto em longas caminhadas pela periferia durante as campanhas.
Doria, mesmo sabendo do aplique, topou a parada. Confiou na sua capacidade de gestão.
Doria caiu na cilada de Aecio e encarou o jogo sujo
Criou uma força tarefa liderada por gente tão desclassificada quanto os correligionários de Aecio e varreu o país tentando convencer tucanos de ricas e pobres plumagens de que seu nome é o melhor neste momento.
Não faltaram denúncias de compra de votos e coerção nesta jornada. Ou seja, o gestor aceitou as regras porque seu jeito de encarar o jogo da política também passa longe do espírito republicano contido no estatuto do seu partido.
E isso não é só.
Doria perseguiu correligionários com cargos no governo do Estado, montou emboscadas – uma diretora da Lide, sua consultoria, apareceu enrustida num encontro de Eduardo Leite para fazer ‘deduragem’ contra tucanos de holerite.
Doria forçou o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, a demitir seu secretário de Habitação, Orlando Faria, porque ele declarou publicamente apoio ao gaúcho.
O gestor que aceitou a mutreta armada por Aecio trabalhou para desmontá-la – e acabou conseguindo.
Na base de dinheiro, muito dinheiro, promoveu filiação em massa – ele que já havia sido acusado por esse mesmo DCM de ter subvertido as regras da Convenção estadual de 2018 que homologou o seu nome ao cargo de governador de São Paulo.
Agora, no dia das prévias, Doria aparece com uma traquitana que já ganhou ares de piada no PSDB, como se o fato não fosse da maior gravidade: um tablet distribuído a cada dirigente de diretório zonal de São Paulo para promover votação em massa, em meio a churrascos, festas e sem nenhuma possibilidade de privacidade para o votante.
E isso não é tudo, a depender das denúncias anônimas que pipocaram neste domingo de votação: aliados do gestor portavam celulares dedicados a controlar a votação dos inscritos, na base da pressão e da chantagem.
O terror se instalou entre os eleitores das prévias
O terror se intalou entre os militantes simpáticos ao adversário do gestor.
Como em 2016, quando ele surgiu, sempre haverá quem defenda que João Doria é um profissional num universo de gente atrasada e sem capacidade.
Ocorre que um partido político, e mesmo um sonho de poder, vai além de espertezas comerciais sem nenhuma ética.
É preciso, como faziam Covas e Montoro, para ficar apenas em dois exemplos envolvendo tucanos, preservar valores mínimos de democracia e capacidade de diálogo, convencimento e especialmente vontade de transformação.
E esses valores Doria não tem.
Como não guarda consigo também o sentimento da lealdade e da gratidão: basta lembrar sua postura diante de Geraldo Alckmin que o escolheu como afilhado lá atrás e foi traído logo na primeira curva.
O fiasco das previas do PSDB revelou ao Brasil que a 3ª via é tão ou mais venal que o próprio bolsonarismo e o movimento que conspirou contra a democracia cinco anos atrás.
Correndo junto com Doria e a dupla Aecio e Eduardo Leite está Sergio Moro – esse dispensa apresentação.
O que essa turma está conseguindo por enquanto é imortalizar outra célebre frase do Senhor Diretas.
Quando se encontrava com algum desalentado com o baixo nível da nossa classe política, rindo Ulisses sapecava: “Está insatisfeito? Então espera para ver a próxima geração”.
Aécio, Doria, Moro, Eduardo Leite, entre outros golpistas, são essas gerações a que se referia Ulisses.
Pobre Brasil.