FirstMile: PF diz que software espião da Abin de Bolsonaro tentou invadir rede de telefonia

Atualizado em 5 de janeiro de 2024 às 22:03
Fachada da Agência Brasileira de Inteligência, a Abin, em Brasília. Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil

Um e-mail indicando a tentativa de invasão da rede da operadora Tim tornou-se um dos elementos cruciais utilizados pela Polícia Federal (PF) para apontar a ilegalidade no uso de um software espião pela Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), segundo informações da Folha de S.Paulo.

O software, chamado de FirstMile e centro da Operação Última Milha, foi associado à invasão da rede de telefonia brasileira para rastrear a localização do celular de qualquer pessoa a partir dos dados enviados para torres de telecomunicação.

A investigação revelou que a ferramenta teria sido supostamente usada durante a gestão do hoje deputado federal Alexandre Ramagem (PL) para espionar indivíduos considerados desafetos políticos de Bolsonaro. Professores, advogados, políticos e jornalistas estão entre os citados como alvos do software, que dispensava autorização judicial para rastrear dispositivos.

Um e-mail de janeiro de 2020, encontrado pela PF, indicou que a empresa Cognyte, anteriormente conhecida como Suntech/Grupo Verint e responsável pela venda do software à Abin, estava enfrentando dificuldades para acessar a rede da Tim.

“Estamos pesquisando e testando novos métodos para acessar a rede da Tim, mas até o momento a Tim está bloqueando todas as nossas tentativas de acesso à rede. O manteremos informado assim que houver necessidade nos nossos testes”, diz trecho do documento.

A PF destacou que o servidor da Abin, responsável pelo contrato do software, estava ciente da natureza intrusiva da ferramenta. A corporação ressaltou a suspeita de conhecimento prévio da Abin sobre a capacidade invasiva do software e seu potencial para invadir a rede de telefonia nacional.

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Tim. Foto reprodução

A investigação revelou que a empresa fornecedora informou, desde a proposta comercial, o uso de estruturas de telefonia no exterior para simular chamadas em roaming, resultando na manipulação dos sinais da rede de telefonia.

“O Estado brasileiro, portanto, efetuou o pagamento de R$ 5 milhões para empresa estrangeira realizar ataques sistemáticos a rede de telefonia nacional para comercializar dados pessoais sensíveis que resultaram na disponibilização da geolocalização de diversos cidadãos brasileiros sem qualquer ordem jurídica”, diz relatório da investigação.

O relatório da PF destaca ainda que a Abin não apenas se aproveitou das vulnerabilidades da rede de telefonia, mas também estimulou tentativas de invasão.

“As diligências de alta complexidade empregadas, até o presente momento, revelam a reiterada ação de invasão da rede de telefonia nacional, fomentada pelo órgão ápice do Sistema de Inteligência Brasileiro. Noutros termos, há aplicação de recursos públicos federais em solução tecnológica que explora vulnerabilidades da rede de telefonia nacional.”

A análise preliminar também identificou 60 mil usos da ferramenta e 21 mil números de telefone alvos do software, porém, ressaltou a possibilidade de inconsistências nos dados.

“As diligências policiais indicaram a utilização do sistema sem a devida motivação prévia e expressa em desatenção aos procedimentos de produção de conhecimento de inteligência da Abin reforçando a possibilidade de deleção de números pesquisados”, diz a corporação.

Vale destacar que o software foi adquirido por R$ 5,7 milhões da empresa israelense Cognyte, sem licitação, no final do governo Michel Temer, em 2018.

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