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Por Jeferson Miola
Ao final da notícia sobre a caçada do criminoso Lázaro na cidade de Águas Lindas, em Goiás, o Jornal Nacional mostrou cenas de policiais abraçados, festejando com show de helicópteros e fogos pirotécnicos nos céus sob os olhares efusivos do solo.
A execução de Lázaro com cerca de 40 perfurações por armas de fogo, ao invés da prioridade de capturá-lo com vida, foi bastante festejada. Celebrada como uma grande epopeia policial.
A narrativa difundida pelos órgãos oficiais, inclusive pelo presidente desocupado e adepto da linguagem miliciana que festejou o “cancelamento do CPF”, é de que a operação foi exitosa.
A pergunta que se impõe, contudo, é: com este resultado a operação foi, mesmo, exitosa? Ou toda fanfarra pós-execução visa ocultar aquilo que, à luz de critérios de polícias inteligentes e eficazes de vários países, pode ser entendido como um rotundo fracasso?
Ora, considerar exitosa uma mega-operação que levou 20 dias para caçar um único indivíduo afugentado em território inóspito, mesmo arregimentando cerca de 300 policiais militares, civis, federais e da Força Nacional equipados com drones termo-sensíveis, câmeras para uso noturno, frotas de veículos aéreos e terrestres, dispositivos de telecomunicações, armamento sofisticado e outros recursos tecnológicos, é no mínimo uma afronta ao senso do ridículo.
Este mesmo critério de “êxito”, aliás, foi argumentado pelas polícias da Bahia e do Rio para justificar a execução do miliciano Adriano da Nóbrega em fevereiro de 2020 num sítio isolado no interior da Bahia, quando se sabe que a captura daquele criminoso sócio do clã Bolsonaro com vida teria sido muito mais útil para as investigações.
O extermínio de Adriano, ao contrário, impediu esclarecimentos relevantes sobre o vínculo dos Bolsonaro com as milícias e com o submundo do crime.
Conter Lázaro – vivo ou morto – e sem que ele tivesse possibilidade de assassinar outras vítimas, deveria ser, fora de qualquer dúvida, a prioridade absoluta. A captura de Lázaro com vida, observados os mais eficientes parâmetros para garantia da integridade e da vida dos policiais, seria de maior interesse para a investigação e para a ciência criminal que sua morte.
Como divulgou o perfil de twitter Rogerinho do Ingá [@caitomainier], “você cerca um cara que tá sozinho, não tem refém. Está armado, mas não produz munição sozinho. Tem sede e fome. Você se protege e espera. Ele se entrega. Você prende, colhe informações preciosas sobre crimes. Entrega pra justiça. Isso sim seria uma polícia preparada. Minimamente”.
Não faltará quem, com raciocínio plano, levianamente considerará esta opinião como uma ode aos “direitos dos bandidos”.
Os 4 mil reais de posse do Lázaro são um indício eloquente de que se ele fosse capturado com vida, poderia contribuir com investigações que permitiriam a elucidação de uma possível cadeia de comando por trás dele, e por quais interesses criminosos.
“Follow the money”, sugeriu o deputado Luis Miranda aos senadores na CPI da COVID para rastrearem a corrupção do governo militar na negociata bilionária de vacinas.
A caçada fracassada do Lázaro, neste sentido, evidencia também que as polícias ou são ineptas para, ou são “impedidas”/constrangidas de combater o crime [parêntesis: a fronteira polícia-milícia é cada vez mais tênue].
É um contraste e tanto com a forma como as polícias são de fato treinadas: para promover a violenta e mortal repressão contra o povo pobre, negro e das periferias. Jacarezinho é testemunha do morticínio cotidiano do terror do Estado contra seu próprio povo.