O frade dominicano e escritor Carlos Alberto Libânio Christo, o Frei Betto, foi preso duas vezes durante a ditadura de 1964. Perdeu amigos e companheiros assassinados sob tortura ou emboscados. Confrontou a ditadura, viu a democracia ser restabelecida, participou do primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e nunca deixou de militar politicamente, junto aos movimentos populares.
Mas, passados 60 anos do golpe de 1964, Frei Betto segue preocupado com as consequências da impunidade dos golpistas, torturadores e assassinos daquele período. Para ele, há uma clara relação entre a falta de punição e o risco sempre colocado no Brasil de os militares tentarem tomar o poder.
Ele defende a reabertura da Comissão Nacional da Verdade, criada em 18 de novembro de 2011, com o objetivo de investigar violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988, período que abrange a ditadura de 1964.
“Claro, deveria ser reaberta. É uma questão de honra, uma questão de respeito aos mortos e desaparecidos, também aos presos, perseguidos, etc. Enquanto eu viver, eu baterei nessa tecla. Vamos estabelecer a Comissão da Verdade e é preciso investigar e punir os militares que promoveram os crimes hediondos durante os 21 anos de ditadura militar. O Brasil está sempre ameaçado por quarteladas, porque nós não acertamos contas com o nosso passado como fizeram o Chile, a Argentina e o Uruguai”, defende.
Frei Betto destaca que é preciso construir ações de educação política do povo brasileiro, para confrontar a desinformação, tanto cotidiana, quanto da história brasileira. Como forma de evitar que a direita e a extrema direita alienem parte da população em seu benefício, inclusive utilizando da religião. No passado, com as Marchas da Família com Deus. Hoje, com as Marchas para Jesus e religiosos extremistas.
“A religião, como a política, serve para libertar e serve para oprimir. Depende de como é aplicada. Na época de Jesus quem tinha o poder político tinha um poder religioso e vice-versa. A direita descobriu sempre isso, de que a religião é um fator forte de domesticação e mobilização popular. Para nós, progressistas, a religião deveria ser aquilo que foi na prática de Jesus e dos seus apóstolos: um fator de libertação e de despertar a consciência crítica. É preciso levar a sério um trabalho político com a esfera religiosa”, explica.
Originalmente publicado na Rede Brasil Atual.