“A história é uma lição para se refletir, não para se repetir.”
– Carlos Drummond de Andrade
“A pintura não é feita para decorar apartamentos. É um instrumento de guerra ofensiva e defensiva contra o inimigo”.
-Pablo Picasso, autor de “Guernica”, obra-prima executada cinco meses depois dos devastadores ataques à cidade.
Israel converte Gaza na Guernica do século 21. Esta é uma terrrível estupidez que ofende a condição humana. Com a complacência criminosa das potências que mandam no mundo.
Em 26 de abril de 1937, no contexto da Guerra Civil Espanhola, a pedido do General Francisco Franco, a aviação nazista de Adolf Hitler – escoltada por caças da força aérea fascista de Benito Mussolini -, bombardeou Guernica, cidade-símbolo dos bascos. Aquele ataque mortífero de 75 anos atrás serviu como laboratório e campo de testes para as operações do Terceiro Reich na Segunda Guerra mundial, que começaria dois anos mais tarde.
Guernica foi o ensaio nazi-fascista de onde surgiu a estratégia de “bombardeios científicos”. A guerra convencional, até então travada em combates entre exércitos em terra, deu lugar à chamada “guerra total”. A Luftwaffe [aviação da Alemanha nazista] empregou pela primeira vez bombas incendiárias e de fragmentação nos lançamentos contra Guernica. Foi produzida uma destruição impressionante – 80% dos edifícios transformados em escombros, a infra-estrutura elétrica, de água e transportes colapsada e centenas de cidadãos bascos mortos.
Guernica serviu como o palco no qual os nazi-fascistas puderam sedimentar os novos conceitos e princípios de guerra: o terror contra populações civis, a devastação material, a desmoralização dos inimigos e a intimidação psicológica. Dois anos depois de Guernica, em setembro de 1939, a Luftwaffe bombardeou Varsóvia, iniciando a longa vaga de bombardeios aéreos durante a Segunda Guerra mundial, cujo desfecho foi a explosão atômica de Hiroshima e Nagasaki, promovida pelos EUA em agosto de 1945.
O governo de Israel transforma a estreita Faixa de Gaza na nova Guernica da história da humanidade. A diferença é que Franco, Hitler e Mussolini devastaram Guernica em três horas, ao passo que Israel dizima o povo palestino a conta-gotas, dia após dia, ano após ano. O ciclo vicioso da monstruosidade contra o povo palestino se repete a cada véspera de eleições em Israel. Para angariar votos internamente, os israelenses praticam o martírio de inocentes – crianças, mulheres e homens palestinos de todas as idades são barbaramente mortos.
Os palestinos, como numa ironia da história, parecem estar pagando o preço do sofrimento imposto às populações judias durante o holocausto. Confinamento, segregação e terror fazem parte do léxico da guerra de extinção promovida por Israel. Muitos vivem a humilhação dos campos de refugiados, vítimas de ódio racial, observando impotentes a ocupação ilegal do território que pertence a eles. O direito a viver é uma simples ilusão de sobrevivência para quem sofre a devastação das suas cidades, das suas escolas, dos seus hospitais, das suas casas, das suas famílias e das próprias vidas.
Repudiar a monstruosidade do passado não é suficiente. O essencial é impedir sua repetição. As potências mundiais, todavia, não só permitem a repetição daqueles métodos bárbaros, como apoiam militarmente, politicamente e materialmente a execução deles.
O mundo não encontrará a paz enquanto não houver uma resolução aceitável e digna do conflito do Oriente Médio. Este conflito é produto da imposição à força do Estado de Israel como um enclave naquela região. As potências mundiais, com os EUA à frente, foram responsáveis diretos para sua origem, e são o único fator que pode dar fim àquela barbárie.
Mas, com sua complacência e seu jogo de interesses na região, tristemente parodiam Guernica em Gaza. Esta atitude configura não só um crime de lesa-humanidade, mas encaminha o mundo para um contexto convulsionado e imprevisível.
Publicado originalmente por Jeferson Miola
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