O general da reserva Ridauto Lúcio Fernandes, alvo de uma operação da Polícia Federal (PF) na última sexta-feira (29) sob suspeita de apoiar os atos terroristas de 8 de janeiro, é o diretor de Defesa e Segurança do Instituto Sagres, organização, fundada em 2004 por coronéis da reserva, que elaborou um “projeto de nação” para o Brasil até 2035, em colaboração com o general Eduardo Villas Bôas, ex-comandante do Exército.
O “projeto de nação” foi lançado pelo instituto em maio de 2022, em parceria com os institutos Villas Bôas e Federalista, cinco meses antes das eleições. O documento foi apresentado em um evento em Brasília com o apoio do general Hamilton Mourão, à época vice-presidente e atual senador pelo Republicanos-RS.
Projeto de Nação
O “plano”, embora sem uma ligação formal com as Forças Armadas (FA), mas apoiado pelo governo Bolsonaro, foi criado e revisado por militares. Ele propõe o fim da gratuidade na saúde e nas universidades, defende a exploração de terras indígenas e menciona a necessidade de “limitar a ingerência do movimento globalista”, além de projetar Bolsonaro no Poder até 2035.
O general da reserva Luiz Eduardo Rocha Paiva, coordenador do trabalho, afirmou que ministérios da gestão anterior distribuíram questionários pelo país para auxiliar na produção do texto.
Instituto Sagres
A CPMI dos atos de 8/1 tem como alvos três dirigentes do Instituto Sagres, incluindo Ridauto Fernandes, que participou dos atos de janeiro. A comissão também investiga Rocha Paiva, diretor de Geopolítica e Conflitos do Sagres, e o general reformado Raul Sturari, atual presidente da entidade.
Tanto o Instituto Sagres, quanto os três dirigentes investigados foram procurados para comentar acerca do caso, mas, até o momento, não se pronunciaram.
Líder do projeto falou em “ponto de ruptura”
O general Rocha Paiva, ex-presidente da ONG Ternuma (Terrorismo Nunca Mais), é o autor de um manifesto chamado “aproxima-se o ponto de ruptura”, publicado em março de 2021. Nesse texto, ele criticou a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de anular as condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), além de afirmar que as FA “ficarão unidas e ao lado da Nação” em caso de conflito entre os Poderes.
Em 2018, o ex-comandante do Exército também publicou uma mensagem intimidadora ao STF na véspera do julgamento que determinou a prisão de Lula. Sabe-se também que Rocha Paiva é um dos fundadores do instituto Villas Bôas.
Instituto recebe verbas públicas
Sob o governo Bolsonaro, o Sagres recebeu R$ 170 mil da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba). A organização também organizou o “Fórum de Desenvolvimento do Semiárido” em 2020, sediado em Mossoró-RN.
A verba da Codevasf foi destinada ao instituto por meio de uma emenda apresentada pelo deputado bolsonarista General Girão – que está sendo investigado em um inquérito também por suposta participação no 8 de janeiro, sob suspeita de ter incitado as FA contra as instituições.
O presidente do Sagres, Raul Sturari, foi assessor de Girão na Câmara durante o governo Bolsonaro, ocupando o cargo de secretário parlamentar de fevereiro de 2019 a abril de 2021.
Falta de transparência
Para Jorge Rodrigues, autor de um artigo sobre o projeto dos institutos, falta transparência na atuação dessas organizações. Rodrigues é pesquisador do Instituto Tricontinental de Pesquisa Social e do Gedes (Grupo de Estudos de Defesa e Segurança Internacional), da Unesp (Universidade Estadual Paulista).
“Os contratos públicos e privados firmados por esses institutos nascem de uma percepção de que os militares são bons gestores. Eles rentabilizam isso, mas com um projeto de poder por trás”, afirmou Jorge Rodrigues.
Ridauto é suspeito de facilitar atos terroristas
O general Ridauto Fernandes, alvo da operação Lesa Pátria, é suspeito de facilitar a invasão aos prédios da Praça dos Três Poderes. Ele participou do ato e gravou um vídeo na frente do Congresso, onde disse estar “arrepiado” com a manifestação.
⏯️ General alvo da PF foi a ato golpista: “Tô arrepiado”.
Na ocasião, o general da reserva Ridauto Lúcio Fernandes falou que estava “arrepiado” com a invasão e criticou a PMDF.
Leia: https://t.co/osdA4lasJl pic.twitter.com/7cwfFErvDZ
— Metrópoles (@Metropoles) September 29, 2023
Com mais de 30 anos de serviço militar, Ridauto integrou o Comando de Forças Especiais do Exército, especializado em missões de inteligência e alto risco. Esse grupo, conhecido como “kids pretos”, é suspeito de ter iniciado a invasão aos prédios públicos, abrindo caminho para os manifestantes.
O militar também trabalhou no Ministério da Saúde durante o governo Bolsonaro, ocupando o cargo de diretor de logística da pasta durante a pandemia de covid-19. Nesse período, ele apoiou uma empresa suspeita de fraude na venda de ventiladores pulmonares.
O general tem laços estreitos com militares do círculo próximo do ex-presidente Bolsonaro. Ele foi uma das pessoas a visitar o tenente-coronel Mauro Cid na prisão. Mauro Cid, ex-aide-de-camp de Bolsonaro, está sob investigação por seu apoio aos atos golpistas, fraude em cartões de vacina e desvio de joias recebidas pela Presidência.
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