Publicado originalmente no Brasil de Fato
Por Caroline Oliveira
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) recriou o Ministério das Comunicações, nesta quarta-feira (10), e nomeou como ministro o deputado federal norte-rio-grandense, Fábio Faria, do Partido Social Democrático (PSD), sigla de Gilberto Kassab, considerada como parte do centrão. Faria também é genro do apresentador Silvio Santos, proprietário do canal televisivo SBT.
As motivações para a escolha do deputado estão entre a proximidade do presidente ao apresentador Silvio Santos, que vem desde, pelo menos, a campanha presidencial de 2018, e a recente aproximação de Bolsonaro com o centrão.
“Vamos ter alguém que não é um profissional do setor, mas tem conhecimento até pela vida que tem junto à família do Silvio Santos”, afirmou o presidente ao chegar no Palácio da Alvorada, no fim desta quarta-feira (11).
Dentro do PSD, a primeira opção é a mais ventilada entre os políticos, o que já era esperado diante da negativa de Bolsonaro sobre suposta negociação e mesmo do presidente da sigla, Gilberto Kassab, de fazer parte do bloco político conhecido por seu fisiologismo.
A segunda opção, no entanto, não é descartada, diante do posicionamento do presidente e da sigla, tendo em vista que o partido emplacou, recentemente, Giovanne Gomes da Silva, comandante da Polícia Militar em Minas Gerais, para a Presidência da Fundação Nacional de Saúde (Funasa), ligada ao Ministério da Saúde.
“Dois coelhos com uma cajadada só”
Entre a primeira e a segunda opção, sociólogo Laurindo Leal Filho considera que a escolha de Fábio Faria para as Comunicações combina as duas motivações.
Leal Filho que também é professor do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, avalia que há uma confluência de motivos para a escolha de Fábio Faria que levam à busca de apoio político à Bolsonaro para se manter na Presidência.
“Ele mata dois coelhos com uma cajadada só. Ele atende a mais uma imposição do centrão ao dar esse atendimento político, com o Ministério das Comunicações, para ampliar e solidificar a sua base no Congresso Nacional. E, ao mesmo tempo, ele amplia o apoio dessa rede de televisão, cuja família vai agora dirigir o Ministério das Comunicações”, considera.
Essa também é a interpretação do cientista político Rafael Cortez, da Tendências Consultoria.“Tem-se o primeiro que é o apoio político efetivo, em se tratando de proteção eventualmente um processo de impeachment. E, do ponto de vista da comunicação, que é a dinâmica da percepção, de como é percebido um governo, de como se materializa a leitura que a sociedade faz de uma administração”, afirma Cortez.
O capitão reformado negou que tenha negociado com o centrão a nomeação de Faria, que é deputado federal desde 2007 e está na sigla desde 2011.
Apoio político
No âmbito da aproximação com o centrão, o cientista político explica que se trata de um processo comum ao que já vinha sendo sedimentado pelo presidente, e a escolha, portanto, “precisa ser inserida nessa mudança de estratégia mais ampla. Não é simplesmente uma troca corriqueira de nomes”, afirma.
Para Cortez, é um marco “nessa longa caminhada de estreitamento de relações”, visto que Faria é o primeiro nome do centrão admitido em um cargo ministerial, de primeiro escalão. Antes dele, as nomeações ligadas ao centrão ocuparam postos de órgão de segundo escalão do governo, como é o caso de Silva na Funasa.
Segundo o cientista político, a comunicação é estratégica em todos os governos, uma vez que influencia no espaço público de discussão.
“Numa pasta que é importante, que trata de vários itens que são objeto de ambição, seja do Executivo, seja dos próprios parlamentares. Tem uma série de agendas em torno do guarda-chuva comunicação que reforça ainda mais a importância desse movimento em termos de mostrar uma ambição para fazer essa aproximação”, afirma Cortez.
Comunicação
Leal Filho considera que, na história brasileira recente, a comunicação “sempre foi buscada como meio de apoio político, mas não de maneira descarada”.
Entre as funções do Ministério das Comunicações está a de regular e fiscalizar os serviços de radiodifusão e telecomunicações, bem como autorizar os processos de concessão e liberação de recursos. O que desperta a atenção do sociólogo é que o governo ao nomear Fábio Faria, genro de Silvio Santos, para o cargo “está entregando um ministério que tem um papel de fiscalização para o próprio fiscalizado”.
“Se nós tivéssemos no poder um governo democrático, nós deveríamos saudar a volta do Ministério das Comunicações. Mais do que isso, exigir da pasta algo que infelizmente nunca fez, que é fiscalizar com rigor os serviços de rádio e televisão no Brasil, que são concessões públicas, outorgadas pelo Estado brasileiro em nome da sociedade”, lembra Leal Filho.
Coronelismo eletrônico
Segundo o professor da USP, a recriação da pasta sob essas condições explicita mais um capítulo de um conceito de coronelismo eletrônico que está consolidado no país.
Entre o final do Império e o começo da República, no Brasil, os senhores rurais que tinham o poder político exacerbado pela posse da terra, passaram a controlar também a comunicação. “As famílias oligárquicas que eram possuidoras das terras se transformaram em controladoras desse coronelismo eletrônico. Então tem a família Collor em Alagoas e Sarney no Maranhão, por exemplo.”
A recriação do Ministério se deu por meio da publicação de uma medida provisória, na qual o capitão reformado fragmentou o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações em duas pastas, como explicou em suas redes sociais.
Ciência e Tecnologia continuará sob a chefia de Marcos Pontes, que comemorou a decisão do presidente.
“Continuamos juntos a compor a equipe do governo no comando da Ciência, Tecnologia e Inovações. Desejo sucesso ao Min. Fábio, que conta com meu apoio para organizar o novo Ministério”, afirmou Pontes em sua página no Twitter. Fábio Wajngarten, por sua vez, que é o atual secretário de Comunicação Social do governo, será o secretário-executivo da pasta.
Esplanada
Durante a campanha eleitoral de 2018, então candidato pelo PSL, Bolsonaro defendeu que seu governo teria no máximo 15 ministérios. No dia 1º de janeiro de 2019, no entanto, deu posse a 22 ministros. Agora, com a recriação do Ministério das Comunicações, são 23 pastas.
“Algumas coisas nós exageramos, né, até era a questão dos ministérios. Num país continental como esse, a gente queria 15 ministérios, montamos um número, depois chegou a 22. E o ministério em si não tem muita despesa a mais sendo criado ou não mais um ministério, não é por aí”, reconheceu Bolsonaro também nesta quarta-feira.
No começo de junho, o presidente afirmou que existe a possibilidade de recriar o Ministério da Segurança Pública, que atualmente é ligado ao Ministério da Justiça.
Edição: Leandro Melito