Publicado originalmente no Monitor Mercantil
POR RICARDO MARANHÃO, engenheiro, diretor da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet), ex-deputado federal (PSB-RJ), é conselheiro do Clube de Engenharia
A longa e vitoriosa trajetória política do presidente Getúlio Vargas foi, toda ela, marcada por indiscutível orientação nacionalista. Na área do petróleo o presidente já expressava sua preocupação com a nacionalização da indústria, em 29/4/1938, quando editou o Decreto-lei 395, que “declara de utilidade pública e regula a importação, exportação, transporte, distribuição e comércio de petróleo bruto e seus derivados, no território nacional, e bem assim a indústria da refinação de petróleo importado em produzido no país”.
Em 3/10/53, após a memorável campanha O Petróleo é nosso, o presidente sancionou, no Palácio Tiradentes, a Lei 2.004, implantando o monopólio estatal do petróleo e criando a Petróleo Brasileiro S/A – Petrobrás como sua executora, pela União.
Hoje, decorridos quase 66 anos, a Petrobrás é uma pujante realidade. Maior companhia brasileira, líder mundial na exploração e produção de petróleo em águas profundas e ultraprofundas. Descobridora do pré-sal, a mais importante província petrolífera descoberta, em todo mundo, nos últimos 20 anos.
A indústria do petróleo abrange os segmentos da exploração, perfuração, produção, transporte, refino, processamento, distribuição, revenda, importação, exportação e petroquímica. O petróleo bruto (cru) não pode ser consumido diretamente. Antes deve ser transformado em derivados de petróleo. Os principais derivados são o diesel, a gasolina, gás liquefeito de petróleo (GLP, também conhecido como gás de cozinha), o querosene de jato (QAV), querosene iluminante, nafta, solventes, asfalto, dentre outros.
A transformação do petróleo em derivados é feita em unidades industriais denominadas refinarias. Em seus 66 anos, a Petrobrás construiu um parque de refino integrado por 13 unidades, instaladas nos estados do Amazonas (1), Ceará (1), Rio Grande do Norte (1), Pernambuco (1), Bahia (1), Minas Gerais (1), Rio de Janeiro (1), São Paulo (4), Paraná (1) e Rio Grande do Sul (1). Estas unidades são conhecidas pelas siglas e por nomes que homenageiam brasileiros patriotas que participaram da campanha do petróleo:
Reman – Refinaria de Manaus – Isaac Sabbá – Manaus – AM
Lubnor – Refinaria Lubrificantes e Derivados do Nordeste – Fortaleza – CE
Refinaria Potiguar Clara Camarão – Mossoró – RN
Rnest – Refinaria Abreu Lima – Ipojuca – PE
Rlam – Refinaria Landulpho Alves – Mataripe – BA
Regap – Refinaria Gabriel Passos – Betim – MG
Reduc – Refinaria Duque de Caxias – Duque de Caxias – RJ
Refinaria de Capuava – Mauá – SP
Revap – Refinaria Henrique Lage – São José dos Campos – SP
RPBC – Refinaria Presidente Bernardes de Cubatão – SP
Replan – Refinaria de Paulínia – Paulínia – SP
Repar – Refinaria Presidente Getúlio Vargas – Araucária – PR
Refap – Refinaria Alberto Pasqualini – Canoas – RS
Estas refinarias têm capacidade de processamento da ordem de 2,3 milhões de barris/dia, nono maior parque refinador do mundo.
Sob a alegação de que os preços dos derivados de petróleo são elevados no país e que isto decorre da falta de competição, alguns defendem a venda das refinarias da Petrobrás para grupos privados, muito provavelmente estrangeiros.
É necessário registrar, é preciso deixar bem claro, que o monopólio do refino, da União, exercido pela Petrobrás, foi totalmente revogado pela Lei 9.478/97 – a chamada Lei do Petróleo – em 1997. Portanto há mais de 21 anos não há qualquer impedimento legal para a instalação de novas refinarias no Brasil. Qualquer empresa, privada ou estatal, nacional ou estrangeira, pode, desde que queira, construir e operar refinarias no Brasil.
Registre-se que o Brasil é o sexto maior mercado para derivados de petróleo no mundo. Não só um enorme mercado, mas de consumo per capita moderado, que deve crescer muito, tão logo retomado o desenvolvimento. Ademais o país é importador de parcela dos derivados que consome.
A exemplo, do que ocorreu na produção de petróleo, os grupos privados multinacionais se omitem, não desejam investir e não querem correr riscos em projetos que exigem investimentos de porte e algum risco (pequeno no caso do refino). Durante 80 anos, desde que o petróleo foi descoberto, em 1859, em Titusville, Pensilvânia, USA, até 1939, quando foi descoberto, por brasileiros, no Brasil, os grupos estrangeiros negaram sua existência em nosso país.
Isto explica a pressão e o lobby para a compra das refinarias da Petrobrás, operando, já amortizadas, com retorno garantido e imediato. Assim, estes grupos fazem investimentos muito menores, fugindo de empreendimentos com expressivos prazos de maturação.
O parque de refino da Petrobrás é competitivo, e a companhia pode entregar derivados de petróleo aos consumidores brasileiros por preços abaixo dos praticados no exterior, preservando-os da volatilidade dos preços internacionais, aumentando a competitividade de nossa economia.
Para o país, a melhor solução é a integridade do parque de refino da companhia, mantido sob seu controle, e a construção de novas refinarias, aumentando a capacidade de processamento do país, gerando empregos, renda, desenvolvimento e a consolidação de nossa engenharia e dos fabricantes de materiais e equipamentos.
As administrações da Petrobrás, comandadas por Pedro Parente, Ivan Monteiro e, mais recentemente, por Roberto Castello Branco, colocam em risco a segurança energética do país, quando reduzem, em sucessivos Planos de Negócios e Gestão – PNGs, os recursos para a atividade de refino, limitando-os, apenas, à manutenção do parque existente.
A indústria petroquímica tem grande afinidade com a do petróleo. As principais matérias primas para a petroquímica são a nafta e o gás natural. A Nafta é obtida em refinarias, e o gás natural é encontrado na natureza associado ao óleo ou obtido em poços de gás natural não associado. Por esta razão as centrais petroquímicas se localizam nas proximidades das refinarias.
A petroquímica brasileira estruturou-se em três polos, localizados em Mauá (SP) – Petroquímica União; Camaçari (BA) – Copene; e Triunfo (RS) – Copesul. Estes polos petroquímicos tinham as refinarias de Capupava, Landulpho Alves (Rlam) e Alberto Pasqualini (Refap) como fornecedores de matérias primas.
A indústria desenvolveu-se com a criação da Petrobrás Química S/A – Petroquisa, subsidiária da Petrobrás, em esquema conhecido como arranjo tripartite: Petroquisa, representando o estado nacional, controlada pela Petrobrás, um sócio nacional e um estrangeiro, este último fornecedor da tecnologia.
Participaram deste arranjo grupos privados brasileiros como Suzano, Unipar, Odebrecht, Ipiranga, Ultra, dentre outros. A Petroquisa participava, minoritariamente, de dezenas de empreendimentos, garantindo o controle nacional dos projetos nos quais o Estado (Petroquisa) era minoritário.
Nos governos Collor e Fernando Henrique, as coligadas da Petroquisa foram, quase todas, privatizadas. Posteriormente, a indústria passou por um processo de concentração, vendas de participações, dele emergindo, como grande controlador, o Grupo Odebrecht, através da Braskem.
Com a crise, desencadeada pela Operação Lava Jato, a Odebrecht, enfraquecida, negocia com a empresa holandesa LyondellBassell o controle da Braskem, na qual a Petrobrás ainda detém uma participação minoritária de 36%.
O atual presidente da Petrobrás, Roberto Castello Branco, de índole liberal, já fez declarações públicas anunciando a possibilidade de a Petrobrás se desfazer de sua participação na Braskem. Concretizadas as vendas das participações da Odebrecht e da Petrobrás para o grupo holandês LyondellBassell, a indústria petroquímica brasileira estará total e lamentavelmente sob controle estrangeiro.