Globo trata assédio como mercadoria no BBB23. Por Tiago Barbosa

Atualizado em 19 de março de 2023 às 20:59
Boninho

O episódio de assédio no BBB 23 expôs um método nocivo de parte indústria do entretenimento de mercantilizar o sofrimento humano – às custas até da vítima e da lei.

A mexicana Dania trazida para o programa pela Globo foi assediada por dois colegas brasileiros diante das telas de um país atônito e de uma emissora vergonhosamente inerte.

Por que a “voz” da produção não surgiu na hora? Por que não houve advertência – como até identificaram e fizeram pessoas da casa?

Não era grave o suficiente como um microfone mal posicionado ou colocar pastas de dente na bolsa?

Por que não tocou o big fone? Por que não enviaram um “dummy”, aquele personagem mascarado, para intervir?

A vida não é produto.

A Globo tem 63 câmeras para exibir e lucrar com o BBB em tempo real e um batalhão na operação. Flagrou todo o assédio de dois homens a uma mulher e nada fez para cessar.

Nada.

E mais: esperou 24 horas enquanto faturava com o crime.

A demora serviu como marketing para gerar uma ansiedade coletiva e fazer do anúncio da decisão uma atração do próprio BBB.

Ou seja: transformar crime em mercadoria.

A indignação reportada pelo apresentador Tadeu Schmidt soa absurdamente falsa quando a produção do programa teve a desfaçatez de deixar a vítima um dia inteiro ao lado de quem a assediou.

Igualmente escandalosa a conversa com a mexicana tornada pública em um exercício grotesco de exploração do assédio para fins comerciais.

E ainda deixá-la exposta para ser interpelada por quem foi acusado de cometer o assédio.

Se a Globo considerou graves as atitudes, por que esperar até depois da novela para dar um desfecho?

A emissora sabia do interesse do público pelo tema e trabalhou com estratégia mercadológica para cativar a audiência – à revelia, claro dos direitos humanos, da proteção à mulher.

É preciso examinar o papel do canal, concessão pública de TV, ao ensejar circunstâncias para o cometimento de um ato de abuso sexual e agir com lentidão para reparar.

A vítima sofreu duas violências: a praticada pelos brothers e a executada pela Globo.

E ambas merecem repúdio e reparação.