Está disseminada a tese de que o Exército deve intervir, não se sabe como, no processo de politização das polícias militares que fazem militância pró-golpe e ameaçam com motins.
Toda a argumentação nessa linha é um equívoco, se examinada sob o ponto de vista das obviedades constitucionais ou sob o olhar subjetivo da política.
E, nesse caso, o que orienta atitudes e ações é o poder da política, estúpido. É tarefa de quem tem representação determinada pela democracia.
Dizem alguns que as PMs, como são forças auxiliares do Exército para situações excepcionais em que são convocadas a intervir, precisam estar sob a vigilância dos militares.
Não podem e não devem. A Constituição, que permite tantas hermenêuticas, como diria o jurista da esquina, é muito clara. Está escrito no parágrafo sexto do artigo 144, que trata da segurança pública:
“As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios”.
A abordagem profilática e informal, diante da ameaça de motins, pode até envolver os militares, pela natural interlocução entre fardados.
Mas a intervenção primeira, formal, legal e política, no sentido de conter a ameaça de motins e insubordinações, deve ser dos governadores.
Todos sabemos, inclusive o soldado e o cabo do jipe de Eduardo Bolsonaro, que Exército e PMs têm vínculos umbilicais pelo caráter das suas funções e por suas histórias. Mas nada mais além disso, no sentido de tentar enxergar atribuições nos militares na tutela das PMs.
Quem nomeia comandos, quem trata de orçamentos e prioridades e delibera sobre ações das PMs são os governadores.
Quem destitui um coronel de um posto de comando, como João Doria fez agora com o oficial de Sorocaba que sugeria apoio a manifestações golpistas, é o governador.
Nenhuma outra autoridade ou instituição pode usurpar da prerrogativa dos políticos que fazem a gestão dos Estados ou achar que essa é uma responsabilidade a ser terceirizada.
Quem tem convivência cotidiana com as polícias militares e conhece a realidade das atividades da segurança, inclusive as protegidas pelas sombras e até por arbitrariedades, é o governador.
O governador é quem tem autoridade para mandar frear desmandos, a partir da intervenção em comandos que passarão então a ser investigados por seus atos. É seu dever, mais do que um direito, como chefe das PMs.
Mas Exército e as outras duas armas devem estar atentas aos movimentos das polícias porque pode acontecer aqui o que aconteceu na Bolívia. Lá, a Polícia Nacional, sob comando federal, passou a dar ordens aos generais antes do golpe de novembro de 2019.
Foram as polícias, com os civis golpistas, que empurraram generais acovardados a escrever e ler a nota com a advertência a Evo Morales, para que o presidente renunciasse. A Polícia Nacional impôs a desordem dos motins aos generais.
Que se publique de novo aqui essa informação já muito repetida:
Todos estão presos. Os chefes da polícia e os comandantes das três armas (o então chefe das Formas Armadas, general Williams Kaliman, está foragido).
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Outra história
Se fosse preciso fazer um resumo; essa seria uma síntese para o atual momento:
Que as Forças Armadas tentem contribuir para evitar o pior, se acham que devem. Mas sem pretender substituir os governadores. E sem nunca sugerir que poderão estar ao lado de quem incentiva e promove motins.
Hoje, quem tem o poder de impor previamente a ordem e intervir para que depois os amotinados sejam punidos pela Justiça, mesmo em seus primeiros ensaios, é o governador.
Se eles têm autoridade real e moral, com histórico e coragem para essa tarefa, aí já é outra história.
(Texto originalmente publicado em BLOG DO MOISÉS MENDES)