No dia que antecedeu o primeiro turno das eleições de 2022, militares do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República conduziram uma análise sigilosa sobre o então candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT), adversário de Jair Bolsonaro (PL), bem como seus familiares. A informação foi divulgada pela colunista Mônica Bergamo, do jornal Folha de S.Paulo.
Esse relatório confidencial foi recebido por e-mail pelo coronel Wanderli Baptista da Silva Júnior, na época diretor-adjunto do Departamento de Segurança Presidencial do GSI. Vale ressaltar que o coronel foi exonerado de seu cargo após seu envolvimento com golpistas durante a invasão ao Palácio do Planalto em Brasília, no dia 8 de janeiro.
O GSI, juntamente com o coronel, alega que essa avaliação é parte do planejamento de segurança para o potencial presidente eleito e leva em consideração as estimativas de vitória conforme indicadas pelas pesquisas eleitorais.
O documento foi compartilhado internamente em 29 de setembro do ano passado, apenas três dias antes da primeira fase do processo eleitoral. O remetente do e-mail foi o coronel Artur Santos, que hoje ocupa o cargo de coordenador-geral da Secretaria de Segurança Presidencial.
Esse dossiê compila diversos relatórios produzidos pelo próprio GSI entre 2003 e 2008, período em que Lula exercia seus dois primeiros mandatos como presidente. Inclui um organograma contendo imagens do líder do PT, da então primeira-dama Marisa Letícia e dos filhos, noras, genros e netos do casal.
O material também contém orientações para a segurança dos familiares de Lula, abrangendo desde abordagens de desconhecidos nas ruas até a escolta da família presidencial em lojas, restaurantes, cinemas, shows, praias e piscinas.
Informações sobre endereços, cônjuges, namoradas, veículos e hábitos dos filhos de Lula, como Lurian, Fábio Luís, Luís Cláudio, Marcos Cláudio e Sandro Luís, também fazem parte do dossiê. A maior parte dos dados é datada e não foi atualizada. Um exemplo é a menção a uma lan house frequentada por Luís Cláudio na época.
Alguns relatórios apresentam as impressões dos agentes do GSI sobre os herdeiros de Lula e a então primeira-dama. Um documento de 2003 afirma: “É a voz mais ativa dos filhos, ‘manda’ nos irmãos”, referindo-se a Fábio Luís. Sobre Marcos e sua então namorada, um relatório do mesmo ano destaca que “são fumantes e têm o hábito de dirigir com o braço esquerdo para fora da janela, frequentando o Mc Donald’s com certa regularidade”.
Além disso, o GSI, durante a gestão bolsonarista, também acessou informações elaboradas pela gestão anterior sobre Marisa Letícia, falecida em 2017. Um dos relatórios lista os lugares que a então primeira-dama costumava frequentar em Brasília, como shoppings, igrejas, cafeterias e até mesmo um estabelecimento que servia crepes de chocolate.
O GSI, no entanto, defende que essas ações estão em conformidade com suas responsabilidades legais. “O planejamento de meios (viaturas, pessoal, equipamento, armamento, instalação de escritórios de representação, dentre outros) é necessário para garantir a segurança do novo presidente e de seus familiares a partir de 1º de janeiro”, ressalta.
“Em setembro de 2022, o presidente Lula despontava como um dos candidatos favoritos para vencer o pleito. Nesse sentido, o GSI trabalhou com a possibilidade de sua eleição, levantando antecipadamente os dados necessários para garantir a sua segurança e a de seus familiares”.