Na Life, as fotos valiam mais que os textos, e disso nasceu uma publicação única.
São dias de acentuada decadência para a mídia impressa, impotente para concorrer com a internet.
Mas que nos seja permitido recordar seus dias de ouro.
Falemos da Life.
Publicação nenhuma, na história do jornalismo, levou a fotografia tão longe quanto a revista americana Life. Nela, nas palavras de um jornalista que a dirigiu, os repórteres carregavam as sacolas dos fotógrafos – “que não eram leves”.
A Life surgiu em 1936, e retratou majestosamente a escalada dos Estados Unidos rumo à condição de supepotência. Foi uma criação do maior gênio das revistas, Henry Luce, um homem brilhante que ainda na faculdade, ao lado do colega Briton Haden, inventou com sua Time a revista semanal de informações, um gênero que no correr dos anos se tornaria um dos mais pujantes do jornalismo.
A Life publicava fotos no maior tamanho possível, acompanhadas de textos enxutos no máximo limite. A expressão “ensaio fotográfico” foi obra de Luce. A Life foi um sucesso instantâneo. A primeira edição se esgotou assim que a revista chegou às ruas. Não chegara ainda a era da televisão, e o americano via o mundo pela Life no que havia de belo e de miserável.
A Life estampou a histórica foto do beijo espetacular que, na celebração do final da Segunda Guerra, um combatente aplica na Times Square, em Nova York, numa bela (e admiravelmente maleável) mulher. (O autor, o lendário Alfred Eisensteadt, ou Eisie simplesmente, era conhecido pela habilidade em fazer fotos soberbas usando uma só mão.) Também foi a Life que escancarou aos americanos a brutalidade da guerra do Vietnã ao dar uma sequência excruciante de páginas ilustradas com fotos três por quatro em que apareciam lado a lado, com seus rostos jovens e esperançosos, os soldados mortos numa semana. O ensaio comoveu os americanos e teve influência na decisão da Casa Branca de pôr fim à guerra.
A televisão mataria a Life. O americano passaria a ver o mundo na tevê, e não na Life. Com a tevê veio o culto às celebridades, e em seus últimos anos a Life parecia ter perdido o rumo. Suas páginas passaram a ser ocupadas mais e mais por celebridades, e a frivolidade foi crescendo. Em 1972, a Life fechou.
Mas o que eu queria contar aqui é o primeiro caso de uma série que vou chamar de “Grandes Momentos do Jornalismo”.
A primeira equipe de fotógrafos da Life era composta de três homens e uma mulher, Margaret Bourke-White. Nas palavras de um companheiro dela nos primórdios da Life, Margaret usava tanta luz para fotografar que parecia dizer ao sol que ele não era suficiente. Margaret não era apenas uma fotógrafa brilhante, incansável, aventureira , destemida. Era também uma mulher bonita, chique, sedutora e extremamente ambiciosa.
Margaret foi escalada para cobrir a Segunda Guerra na Europa, ao lado de um colega fotógrafo. Os generais americanos adoravam sua companhia. Margaret saiu com muitos deles, gente poderosa que podia abrir a ela as portas para grandes fotos da guerra.
Não demorou muito e o outro fotógrafo da Life escalado para cobrir a guerra recebeu um telegrama irado do diretor de redação. “O que está acontecendo?”, se queixava o diretor. “A Margaret tem mandado fotos incríveis para nós, muito melhores que as suas.”
O telegrama de resposta do fotógrafo cobrado entraria para a história da Life como o melhor texto não publicado pela revista: “A Margaret tem equipamentos que não tenho.”