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Por Marcelo Gomes, vereador de Porto Alegre pelo PSOL
Jovenel Moise, presidente do Haiti, foi assassinado nessa madrugada. Quando o assunto é Haiti, a imprensa brasileira se nega a contextualizar os fatos. Faz anos que acompanho a política haitiana e hoje quero ajudar a compreensão do cenário político desse assassinato trágico.
Em 2017, Moise assumiu após uma eleição contestada pelos adversários e com pouca legitimidade popular, ainda sob controle da Minustah/ONU e dos Generais brasileiros. Seu partido é ultraliberal e se alinhou imediatamente ao governo de Trump.
Em 2018, uma revolta popular acabou com a sua governabilidade. Mais de 2 milhões de haitianos (cerca de 25% da população) foram às ruas. A corrupção no programa energético Petrocaribe foi a faísca, num contexto de salário mínimo congelado, desemprego recorde e caos social.
Os protestos não pararam desde 2018 e, a partir daí, Moise nomeou sete primeiros-ministros para liderar o governo e todos fracassaram. O parlamento praticamente não funcionou, sequer aprovou orçamento. Moise se isolou ainda mais com a derrota de Trump.
O Haiti terá eleições em setembro, onde também serão discutidas mudanças constitucionais. Várias medidas concentravam poder no Presidente, o que ampliou a oposição a Moise. A fragmentação política é gigantesca e a ingerência estrangeira complica ainda mais o cenário.
Com Moise, a ONU instaurou a Minujusth, que deveria criar um “Estado de Direito” no Haiti. Tudo pra dar errado, né? O judiciário tá em frangalhos, apesar das prisões superlotadas. Aliás, o presidente do Conselho Superior do Judiciário foi assassinado há duas semanas.
A Polícia Nacional Haitiana foi tomada pela corrupção. Com Moise, só serviu para repressão política (a própria ONU diz isso). Na capital, as gangues formam algo como “milícias” e controlam territórios. Aliás, é sintomático que as FFAA do BR tenham convivido com isso por lá.
O fato é que a ONU não fez justiça social, fez intervenção política e manteve a dependência econômica externa com a economia 100% dolarizada, com apoio irrestrito de Moise. Mais de metade da população vive em crise alimentar, 72% não tem saneamento, 42% não tem água potável.
Há várias tentativas de organização popular, como a Plataforma Haitiana pela Defesa de um Desenvolvimento Alternativo, coordenada pelo Prof. Camille Chalmers, pautada na aliança entre movimento sociais diversos. A repressão estatal duríssima é um dos maiores impeditivos.
O assassinato de Moise amplia o drama do povo haitiano. A crise política deve se agravar e ampliar o espaço para as tentativas de golpes oriundos de diferentes setores da frágil institucionalidade, o que já ocorreu esse ano. A ingerência estrangeira também tende a aumentar.
Minha esperança é na mobilização popular. Lembremos que o Haiti paga até hoje o preço de tentar ser independente e desde a revolução escrava de 1804 vive uma sequência de intervenções.
O Haiti precisa de solidariedade dos povos da América Latina.
Força, irmãos e irmãs!