O Psol vai formalizar no Ministério Público uma representação contra o SBT e Rachel Sheherazade por apologia ao crime. Como você sabe, ela fez uma defesa eloquente de um grupo de justiceiros. O deputado Ivan Valente (SP) afirmou que defende a “total liberdade de imprensa, mas não a liberdade para mandar torturar, matar, assassinar e fazer justiça com as próprias mãos”.
Em nota oficial, o SBT declarou o seguinte: “A emissora respeita a liberdade de expressão de seus comentaristas, porém ressalta que a opinião é da mesma, e não do SBT”.
Isso é, evidentemente, um sofisma. Se ela trabalha para o canal de TV de Silvio Santos, ela está falando o que Silvio Santos quer ouvir. Não fosse assim, não estaria lá. Ponto.
Silvio é uma figura sui generis na mídia nacional. Dono absoluto do domingo há mais de 40 anos, tem aquela persona pública: o camelô que virou artista, com sua clássica peruca, sorrisão, microfone pendurado no pescoço, fazendo a alegria de suas “colegas de trabalho”.
Esperto, nunca foi de dar entrevistas porque, entre outras coisas, conhece jornalistas e não gosta deles. Pouco se sabe de suas opiniões políticas. Nos estertores do governo militar, fazia um quadro patético chamado “Semana do Presidente”, em que contava como Figueiredo tinha passado. Muito bem, obrigado. Ficava mais para o terreno da comédia do que da tragédia.
Tentou se candidatar em 1988 à prefeitura de São Paulo. Não andou. No ano seguinte, filiou-se ao PMB, Partido Municipalista Brasileiro, para se lançar à presidência. Por causa de irregularidades no registro, sua candidatura foi impugnada. Entrou no PFL, mas acabou desistindo.
Com o tempo, ele adquiriu, para muita gente, um certo status de Chacrinha, um personagem pop. Besteira. Mais inteligente e preparado, empreendedor, construiu um império com uma programação ultrapopularesca. Kudos.
Qual o legado do SBT? Nos últimos anos, o grande sucesso, além da atracão comandada pelo próprio Silvio, é o seriado “Chaves”, um lixo mexicano que, não se sabe por quê, virou cult. Volta e meia colunistas especializados aplaudem sua estratégia de por no ar o “Pica Pau” e ganhar de Ana Maria Braga, ou algo que o valha, no Ibope. E a nova estrela da casa é Rachel Sheherazade (a mais vistosa num time de comentaristas absolutamente histéricos, mas sem a mesma projeção que a colega acabou ganhando).
Silvio não deu uma resposta ao incentivo à barbárie perpetrado por Scheherazade — e nem vai.
Mas, no final dos anos 80, ele fez um pequeno discurso que, graças à Internet, está à disposição de qualquer um. É um contraponto excelente à catilinária neonazi de Sheherazade:
“Jornalista que trabalha comigo vai dar notícia, só, enquanto eu viver.”
“Porque o homem brasileiro, desde o faxineiro até o presidente da república, nenhum deles sai de casa dizendo: ‘Eu hoje vou errar’. Não. Todos saem de casa com a intenção de acertar. Fazem dez coisas, erram três e os jornais e a televisão só encontram os três defeitos e não as sete qualidades”.
“Qual é o ser humano que vai progredir se não recebe estímulo? Se ele só recebe cacetada de imprensa, cacetada da televisão?”
“Jornalista tem de dar a notícia e, se, possível, elogiar o ser humano para que ele seja estimulado e para que, desde o faxineiro ao presidente da república, todos trabalhem para o bem comum. Esta é a filosofia de minha empresa e dos jornalistas que trabalharão comigo”.
SS mudou? O clima não era de guerra, como hoje, e ele podia ser mais sensato? Ele estava sendo cínico? Ou aquele senhor que gritava “quem quer dinheiro?” nunca foi o bonachão que você acreditava que fosse?
Quanto ao futuro, sua mais recente contratação é o humorista Danilo Gentili.