Publicado originalmente no Blog do autor
POR JEFERSON MIOLA
A AJURD – Associação de Juristas pela Democracia ingressou no Ministério Público do RS com representação contra o Prefeito de Porto Alegre Nelson Marchezan Júnior/PSDB pela prática de crime de responsabilidade no uso de verbas públicas para gastos com publicidade ilegal, em desacordo com a Lei Orgânica do Município e as Constituições Estadual e Federal.
A representação é assinada pelo Presidente da AJURD, Mario Luiz Madureira, e por juristas como o ex-Procurador-Geral do Estado, Gabriel Pauli Fadel, o professor e pós-Doutor em Direito Lenio Streck, as advogadas Jucemara Beltrame, Luciane Toss, Luísa Stern, Maritânia Dallagnol e os advogados Daniel Severo Schiites, Jorge Buchabqui, Jorge Garcia de Souza, Leonardo Kauer Zinn e Ramiro Goulart.
Na representação [na íntegra adiante] a AJURD pede que o Prefeito seja afastado do cargo já durante a instrução criminal. A entidade requer, ainda, a apuração do montante de gastos feitos indevidamente com publicidade ilegal, com vistas ao ressarcimento aos cofres públicos.
Nos últimos dias de dezembro passado, o governo municipal veiculou ampla propaganda em órgãos de imprensa locais e, também, nacionais.
A publicidade fora de Porto Alegre não tem nenhum objetivo de informar os munícipes, e está claramente proibida na Lei Orgânica do Município – norma jurídica que tem eficácia equivalente à de uma Constituição Municipal e que estipula no seu artigo 125:
“§ 2º – Ficam proibidas a publicidade e a propaganda de órgão da administração direta e indireta fora do Município, seja qual for o objetivo, exceto aquelas referentes à atividade turística”.
No parágrafo 8º do mesmo artigo 125, a Lei Orgânica tipifica como crime de responsabilidade o descumprimento desta proibição:
“§ 8º – O não-cumprimento do disposto neste artigo implicará crime de responsabilidade, sem prejuízo da suspensão da propaganda ou publicidade e da instauração imediata de procedimento administrativo para apuração do ilícito”.
Além de descumprir a Lei Orgânica, a propaganda do prefeito Marchezan Júnior também descumpriu as Constituições do Estado [artigo 19] e Federal [artigo 37], que obrigam a observância do caráter educativo, informativo ou de orientação social da publicidade oficial, e proíbem o uso de “símbolos, expressões, nomes, ‘slogans’ ideológicos político-partidários ou imagens que caracterizem promoção pessoal de autoridade ou de servidores públicos”.
As peças de propaganda veiculadas nos jornais do sudeste do país como Valor Econômico, O Estado de São Paulo e Folha de São Pauloforam consideradas “de cunho eleitoral” pela Juíza Keila Silene Tortelli, que em 2 de janeiro determinou a suspensão da publicidade governamental.
Um desses materiais de propaganda tinha como mensagem “As reformas que o Brasil precisa, Porto Alegre já fez”, embora tivessem como justificativa oficial a campanha para pagamento antecipado do IPTU [sic].
Os aspectos legais e processuais concernentes a crimes de responsabilidade cometidos por Prefeitos Municipais estão disciplinados no Decreto-Lei 201/1967. Caso acolha a representação da AJURD, o Ministério Público denunciará o Prefeito Municipal, que então terá de responder a processo criminal na Justiça, “independentemente do pronunciamento da Câmara de Vereadores” [artigo 1º do Decreto 201/1967].
Uma vez denunciado ao Judiciário, o juiz poderá acatar o pedido da AJURD de afastamento do Prefeito Marchezan Júnior do cargo durante a instrução criminal, como prevê o inciso II do artigo 2º do Decreto-Lei 201/1967.
Além do crime de responsabilidade, o prefeito fica ainda passível de julgamento por improbidade administrativa, se houver iniciativa neste sentido no Legislativo Municipal. Neste caso, porém, que pode culminar no impeachment do Prefeito, o julgamento é realizado na Câmara de Vereadores, diferentemente do rito de julgamento por crime de responsabilidade, que ocorre no Judiciário.
Se for condenado, Marchezan Júnior perde o mandato e fica inabilitado por 5 anos para o exercício de cargo ou função pública. Além disso, será obrigado a ressarcir os cofres municipais pelas verbas públicas empregadas em publicidade ilegal, como especifica o Artigo 1º do Decreto Lei 201/1967:
“§ 1º Os crimes definidos neste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos”.
§ 2º A condenação definitiva em qualquer dos crimes definidos neste artigo, acarreta a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular”.