Moraes Moreira não merecia viver no mesmo país que Jair Bolsonaro.
Morreu hoje aos 72 anos de causa ainda não revelada.
Com Baby Consuelo, Pepeu Gomes, Paulinho Boca de Cantor e Luiz Galvão formou os Novos Baianos.
Ficou na banda entre 1969 a 1975. Juntamente com Luiz Galvão, foi compositor de quase todas as canções.
“Acabou Chorare”, de 1972, é fácil, fácil dos melhores álbuns da música brasileira em todos os tempos.
O grupo levou adiante o tropicalismo com mais rock’n’roll, mais suingue, menos política e muita maconha.
Na carreira solo, estourou com “Pombo Correio”, “Vassourinha Elétrica” e “Bloco do Prazer”, dentre outras.
Eu me lembro do Moraes de “Lá Vem o Brasil Descendo a Ladeira”, de 1979, uma ode à chamada brasilidade, inspirada, dizia ele, por João Gilberto, seu guru.
O clipe no Fantástico era de um menino negro num carrinho de rolimã, se minha memória me serve bem.
O Brasil desceu a ladeira — mas não parou e foi parar no esgoto do bolsonarismo.
Que descanse em paz o grande Moraes. O país que ele sonhou não era este.
Na dia 18 de março, ele postou um poema no Instagram:
Quarentena (Moraes Moreira)
Eu temo o coronavirus
E zelo por minha vida
Mas tenho medo de tiros
Também de bala perdida,
A nossa fé é vacina
O professor que me ensina
Será minha própria lida
Assombra-me a pandemia
Que agora domina o mundo
Mas tenho uma garantia
Não sou nenhum vagabundo,
Porque todo cidadão
Merece mas atenção
O sentimento é profundo
Eu não queria essa praga
Que não é mais do Egito
Não quero que ela traga
O mal que sempre eu evito,
Os males não são eternos
Pois os recursos modernos
Estão aí, acredito
De quem será esse lucro
Ou mesmo a teoria?
Detesto falar de estrupo
Eu gosto é de poesia,
Mas creio na consciência
E digo não a todo dia
Eu tenho medo do excesso
Que seja em qualquer sentido
Mas também do retrocesso
Que por aí escondido,
As vezes é o que notamos
Passar o que já passamos
Jamais será esquecido
Até aceito a polícia
Mas quando muda de letra
E se transforma em milícia
Odeio essa mutreta,
Pra combater o que alarma
Só tenho mesmo uma arma
Que é a minha caneta
Com tanta coisa inda cismo….
Estão na ordem do dia
Eu digo não ao machismo
Também a misoginia,
Tem outros que eu não aceito
É o tal do preconceito
E as sombras da hipocrisia
As coisas já forem postas
Mas prevalecem os relés
Queremos sim ter respostas
Sobre as nossas Marielles,
Em meio a um mundo efêmero
Não é só questão de gênero
Nem de homens ou mulheres
O que vale é o ser humano
E sua dignidade
Vivemos num mundo insano
Queremos mais liberdade,
Pra que tudo isso mude
Certeza, ninguém se ilude
Não tem tempo,nem idade”