No mesmo dia em que a defesa de Lula divulgou o vídeo com a declaração do advogado Rodrigo Tacla Durán de que está à disposição para depor como testemunha no processo do ex-presidente, o Ministério Público Federal apresentou mais uma denúncia contra ele.
Os procuradores, sob a coordenação de Deltan Dallagnol, pedem a condenação de Rodrigo Tacla Durán por lavagem de dinheiro, no caso de suposto pagamento de propina por parte da empreiteira Mendes Júnior, para obra no Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj).
Tacla Durán teria sido indicado pela Odebrecht para fazer as operações que resultassem no pagamento de propina em nome da Mendes Júnior. O Ministério Público denuncia seis pessoas, além de Tacla Durán.
No entanto, na peça acusatória de 52 páginas, os procuradores se ocupam, na maior parte do texto, a tratar da suposta conduta criminosa de Tacla Durán, e apresentam cópias de e-mails e a transcrição de trechos do depoimento de delatores sobre o que seria o papel de Durán na operação de lavagem de dinheiro.
Diz que os contratos assinados entre Durán e a Mendes Júnior eram fictícios e, para isso, registra que havia apenas duas funcionárias e uma advogada contratadas pelo escritório dele. Os contratos seriam fachada para gerar pagamentos que, depois, seriam repassados aos agentes públicos subornados.
A denúncia não faz nenhuma referência ao fato de que Durán contratava correspondentes no Brasil inteiro, inclusive em Curitiba, onde contou com os serviços de Carlos Zucolotto Júnior, amigo e padrinho de casamento do juiz Sergio Moro.
Aliás, a denúncia não faz nenhuma referência ao que Tacla Durán disse no depoimento à CPI da JBS — nem para desmenti-lo —, no sentido de que Zucolotto lhe tentou vender facilidades em acordo de delação premiada.
Tacla Durán apresentou evidências de que essa negociação pode, de fato, ter ocorrido: imagem periciada da conversa com o advogado amigo de Moro e cópia do e-mail, recebido em seguida, com os termos favoráveis incluídos na minuta do acordo.
O mesmo procurador que lhe enviou o e-mail (através do advogado), Roberson Henrique Pozzobon, é um dos que assinam a denúncia apresentada hoje contra Tacla Durán. Carlos Fernando dos Santos Lima, que aparece como destinatário de uma cópia da minuta, também assina a peça de acusação.
O Ministério Publico Federal conta que, na rede de comunicação protegida da Odebrecht, o sistema Drousys, Tacla Durán, tinha como nome de usuário BlackZ, e nas mensagens usava três apelidos — Vampeta, Vampe e Vamp. Numa das mensagens enviadas a executivos da empresa, ele faz um desabafo e diz que a base da relação entre eles era a confiança, sem necessidade de papel.
O que isso prova? Nada. Mostra que, de fato, Tacla Durán teve papel ativo no Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht, o que dá a seu depoimento mais credibilidade, principalmente quando ele fala que a Lava Jato tem plantado provas ou aceito provas fraudadas. Durán estava no sistema da Odebrecht.
O que o Ministério Público escreveu sobre os codinomes de Durán tem um lado curioso quando se sabe que ele é corintiano fanático. Vampeta, antigo ídolo no time, é um codinome coerente.
Com a denúncia de hoje, o Ministério Público Federal ignora a decisão da Audiência Nacional – corte superior na Espanha —, que recomendou ao Brasil que envie as provas que, por ventura, houver contra Tacla Durán e lá, com base nos tratados internacionais, ele seria processado, de acordo com leis espanholas, que não aceitam delações como prova.
Na denúncia, o Ministério Público Federal pede a citação de Tacla Durán na Espanha, para que ele responda a processo no Brasil, como se a Justiça espanhola fosse submissa à do Brasil e cumprisse mandados de autoridade brasileira.
Um trecho mostra bem que, para a equipe de Dallagnol, Tacla Durán se tornou um caso pessoal.
Afirma que Durán “está, atualmente, em liberdade provisória na Espanha – com passaporte confiscado – após segregação cautelar naquele país”. O que isso quer dizer? Nada. Na Espanha, Durán não tem nenhuma pendência com a Justiça relacionada à Lava Jato. É tão inocente quanto o cardeal da Igreja Católica.
Liberdade provisória? Só na cabeça dos procuradores.
O Ministério Público só não descobre onde Durán mora em Madri se seus integrantes forem muito ineptos. O endereço já saiu até num documento vazado no jornal El Comercio, de Quito, a propósito de um depoimento prestado por ele em Madri, por solicitação das autoridades do Equador.
Na denúncia de hoje, entretanto, o Ministério Público insiste em registrar um endereço em São Paulo, na avenida Luís Carlos Berrini, como se fosse o de Durán.
Em processos criminais, a citação deve ser pessoal, mas, em se tratando de Curitiba, os critérios da Justiça têm sido excepcionais.
É um Direito Penal peculiar.
A denúncia deve ser vista não como uma ação do Estado em defesa da legalidade, mas uma queda de braço entre agentes públicos suspeitos e um advogado igualmente suspeito, mas que não se dobrou à Lava Jato.
Nem os procuradores, nem Moro têm isenção para processar Durán, como fica cada vez mais nítido.
Se houvesse isenção, Moro aceitaria a petição dos advogados de Lula para Tacla Durán ser ouvido como testemunha no processo do ex-presidente.
Mas Moro, reiteradamente, nega.
Do que a República de Curitiba tem tanto medo?