Publicado originalmente pelo RFI:
O discurso mais apaziguador adotado por Jair Bolsonaro nas últimas semanas reflete a perda da popularidade do presidente brasileiro, a má repercussão do governo nas exportações e a prisão de Fabrício Queiroz. A análise é do jornal francês Le Monde, em reportagem publicada neste sábado (4). A imprensa internacional também destacou a decisão de Bolsonaro de barrar a obrigatoriedade do uso de máscaras contra a Covid-19 nos comércios e locais de culto.
“Teria ele decidido colocar um pouco de água na cachaça?”, ironiza o Le Monde, ao afirmar que o presidente brasileiro “mudou de tom” nas últimas semanas. “Mais silencioso que de hábito, o presidente de extrema direita e arruaceiro sem igual aliviou seu discurso, pela primeira vez desde o início de seu mandato”, afirma o texto, assinado pelo correspondente no Rio de Janeiro.
A mudança começou com a saída do ex-ministro da Educação Abraham Weintraub, substituído pelo nome “mais consensual” de Renato Feder, de perfil técnico. A reportagem lembra que é a segunda vez, em um mês, que Bolsonaro afaga o chamado Centrão com nomeações para o seu gabinete, depois de Fábio Faria ser designado ministro das Comunicações, em junho. O Centrão, lembra o Monde, “simboliza a velha política com a qual Bolsonaro decidiu que terá de governar”.
Além disso, o diário informa que o presidente estaria disposto a cortar mais dois de seus controversos ministros: o do Meio Ambiente, Ricardo Salles, e o das Relações Exteriores, Ernesto Araújo. “Fim das ameaças de golpe de Estado e das declarações cortantes sobre o coronavírus. O presidente agora prega a ‘cooperação, a paz e a harmonia entre os poderes’ (…) e homenageou, enfim, as vítimas do coronavírus”, cita o jornal.
Encurralado
A publicação francesa diz que “razões muito simples” explicam essa virada. A última pesquisa Datafolha indica que o presidente conserva a sua base eleitoral, com 32% de apoio, mas o índice de rejeição de seu governo cresceu nas últimas semanas, passando de 38%, em abril, para 44% agora.
Bolsonaro também teria cedido à pressão das Forças Armadas e do agronegócio, preocupados com os impactos da política ambiental de Brasília nas exportações do país. “Mas, principalmente, o caso Queiroz se aproximou perigosamente”, observa o jornal, ao resumir as suspeitas contra o ex-assistente do ex-deputado Flvio Bolsonaro no Rio de Janeiro.
Veto ao uso de máscaras
Além de Le Monde, a imprensa internacional repercutiu em peso a decisão de Bolsonaro de vetar a lei que determinava a obrigatoriedade do uso de máscaras em comércios, indústrias e locais de culto no Brasil, assim como por funcionários de lojas. O ultraconservador também se opôs à distribuição da proteção para a população economicamente vulnerável. “Presidente Jair Bolsonaro afunda lei exigindo máscaras em público no momento em que o país ultrapassa 1,5 milhão de casos”, diz a emissora catari Al Jazeera.
“Ele se recusou a reconhecer a gravidade do surto de Covid-19 no Brasil, apesar de ser o segundo país com maior número de casos e mortes no mundo”, frisa a britânica BBC. “O chefe de Estado se aproximava frequentemente de multidões, sem máscaras”, lembra a matéria da agência AFP, publicada em jornais franceses como Le Figaro.