O jurista Lenio Streck, em parceria com Marcelo Cattoni e Ranieri Resende, apresentou representação ao Ministério Público Federal sobre o caso da saudação nazista de bolsonaristas golpistas durante a execução do Hino Nacional em São Miguel do Oeste (SC).
Na petição, os autores afirmam que a saudação nazista é conduta criminosa, que merece ser apurada, com a identificação de seus autores e seu necessário enquadramento no tipo penal correspondente.
“Cumpre acrescentar que a matéria objeto da presente representação compõe obrigação internacional constante em recente tratado ratificado pelo Brasil, qual seja, a Convenção Interamericana contra o Racismo, a Discriminação Racial e Formas Correlatas de Intolerância (2013), incorporada ao bloco constitucional com status de Emenda Constitucional (Decreto Legislativo nº 1/2021)”, diz trecho do documento.
Além de acionar o MPF, Streck também criticou o trabalho do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público de Santa Catarina, que afirmou não ter identificado intenção de fazer apologia ao nazismo por parte dos bolsonaristas.
“Muito estranha essa pressa do MP estadual em arquivar. Ao que consta, bastou ouvir o locutor que mandou um áudio para o coronel da polícia e fiat lux, tudo ficou esclarecido para o promotor. Ora, um fato dessa envergadura exige o máximo de cuidado. O mundo literalmente está de olho”, disse Streck. “Essa explicação por WhatsApp aceita pelo MP não parece prudente e à altura da responsabilidade da instituição. O que o MP não entendeu, ou fez de conta que não entendeu, é que não interessa o ponto de vista interno subjetivo do autor ou mentor do gesto com a mão erguida. Importa é o que esse gesto representa na opinião comum dos olhares dos ‘espectadores do evento’, a aldeia global. A opinião pública é que importa. Por isso, esperamos que o MPF tenha mais cuidado com o fato ocorrido.”
No áudio citado por Streck, uma das pessoas presentes ao ato, que se identifica como Itamar Schons, disse que pegou o microfone para tentar animar o grupo de bolsonaristas. “Era para erguer a mão em direção ao Exército como se estivesse pedindo ajuda”, diz trecho do áudio. Ele ainda afirmou que a iniciativa buscava apenas passar uma “energia positiva” ao público.
Entidades repudiam gesto
Apesar da conclusão preliminar do MP-SC, o gesto foi repudiado por diversas entidades. A Confederação Israelita do Brasil condenou o episódio. “As imagens de manifestantes fazendo saudações nazistas em protesto em Santa Catarina são repugnantes e precisam ser investigadas e condenadas com veemência pelas autoridades e pela sociedade como um todo. O nazismo prega e pratica a morte e a destruição”, diz trecho de nota divulgada pela entidade.
Já o embaixador da Alemanha no Brasil, Heiko Thoms, afirmou que o uso de símbolos nazistas e fascistas por “manifestantes” claramente de extrema direita é profundamente chocante.
“Não se trata de liberdade de expressão, mas de um ataque à democracia e ao Estado de Direito no Brasil. Esse gesto desrespeita a memória das vítimas do nazismo e os horrores causados por ele.”
A embaixada de Israel no país também divulgou comunicado em que condena qualquer forma de referência ao nazismo no Brasil. “Estamos preocupados com esse fenômeno aqui e contamos com as autoridades competentes para que tomem as providências necessárias para acabar com esse tipo de atos ultrajantes.”
Publicado originalmente em ConJur