“Eleições presidenciais no Brasil: um líder que o país merece”, intitula o editorial do Libération na edição da ultima quinta-feira, acompanhado da foto de Lula. O jornal dedicou a capa ao ex-presidente, que lhe concedeu entrevista exclusiva.
“A um ano da eleição presidencial, dado vencedor com 25 pontos percentuais a frente de Jair Bolsonaro, Lula se prepara: a entrevista que ele nos deu é claramente de um futuro candidato, mesmo se ele diz ‘ainda refletir'”, diz o jornal francês.
“Jair Bolsonaro se tornou um tamanho perigo para seu país que os brasileiros parecem prontos a convocar novamente ao poder o veterano Lula, que se acreditava condenado a uma aposentadoria bem merecida depois de estar um ano e meio na prisão por suposta corrupção”, afirma.
“Revitalizado pelo apoio de uma boa parte da população, encorajado pela ideia de ser o único recurso diante de um presidente de extrema direita que multiplica atentados à democracia, ao meio ambiente e à racionalidade e que tem uma imensa responsabilidade no incrível número de mortos de Covid em seu país, o ex-metalúrgico que se tornou o mensageiro da esquerda brasileira esta com vontade e quer que se saiba.”
“Sem dúvida, ele espera aguardar o máximo de tempo possível antes de lançar à arena a fim de deixar o presidente brasileiro na incerteza, impedindo-o assim de afinar sua estratégia, se é que ele tem uma”, avalia.
“Um ano é muito, é preciso resistir aos golpes baixos, ou até a golpes de Estado porque hoje é uma espécie de máfia que preside o Brasil, disposta a tudo por manter o poder e a mão sobre as riquezas do país. Como a família Trump, que precisou quase ser despejada à força da Casa Branca”, compara.
“Fato é que se pode lamentar a falta de renovação no Partido dos Trabalhadores. Ele tem, inclusive, menos popularidade do que Lula. Mas a urgência é encorajar os brasileiros a se dotar de um líder que o país mereça. O Brasil deveria exercer um papel maior na luta contra as mudanças climáticas. Infelizmente, é a menor preocupação de Bolsonaro, que continua saqueando deliberadamente a Amazônia, quando não há tempo a perder”, afirma.
Questão de vida ou morte?
Em outra analise da edição dedicada às eleições brasileiras do ano que vem, o Libération afirma que o Partido dos Trabalhadores que Lula é incontornável para um partido em crise.
“A popularidade de Lula ultrapassa amplamente a do partido que ele fundou, em queda nas urnas e ultrapassado no campo social por partidos mais radicais”, analisa François-Xavier Gomez.
O jornalista faz referência à perda de 400 cidades nas eleições do ano passado. “Durante as eleições municipais de 2012, ele mostrava um nível de popularidade de 80%, do qual não beneficiavam os candidatos com a mesma bandeira”.
“Um fracasso local amargo para o partido: as prefeituras foram um respaldo para a ascensão ao poder de Lula. Desde o fim dos anos 1980, a gestão de grandes cidades como Porto Alegre, São Paulo ou Santos projetaram a imagem de politicas inéditas a serviço da justiça social. Essas experiências de participação cidadã e ideias inovadoras nos transportes, urbanismo, saúde, educação ou saneamento chamaram a atenção das esquerdas do mundo inteiro”, lembra.
Como exemplo, cita o Fórum Social Mundial de Porto Alegre, “berço do altermundialismo no começo dos anos 2000”.
Na visão de François-Xavier Gomez, o partido esta à margem de grandes movimentos da sociedade, apesar de seu 1,5 milhão de filiados: “o combate das mulheres e comunidades LGBTI contra uma violência endêmica, as formas múltiplas de segregação enfrentadas por negros e povos indígenas, o direito à terra ou à defesa do meio ambiente, que se expressam numa constelação de coletivos, o Movimento dos trabalhadores sem teto (MTST), os sem terra, a coalizão negra, a Frente Povo Sem Medo e muitos outros”.
Marielle
“O PT foi pressionado pelo modesto Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Marielle Franco, carismática vereadora do Rio, era membra. Negra, feminista, bissexual, nascida numa favela, encarnava a tomada de palavra de partes da população amplamente ausentes do debate publico. Seu assassinato em plena rua, em março de 2018, criou uma onda de choque na sociedade brasileira”, afirma.
“Em 2020, uma outra personalidade do PSOL entra em cena: Guilherme Boulos, para a surpresa geral, chega ao segundo turno das eleições municipais de São Paulo. Ainda que derrotado, ele personifica a emergência nas urnas de uma esquerda radical, como seu colega Edmilson Rodrigues, eleito prefeito de Belém”.
Rivalidade
A necessidade de Lula para o PT também é citada no artigo diante dos rivais à esquerda, como é o caso do PSB e do PDT de Ciro Gomes. “Candidato declarado para o ano que vem, ele concentra seus ataques ao PT, numa estratégia visando a ganhar os eleitores mais de direita do que de esquerda, o que confirmaria a escolha que se atribui a ele de designar como vice uma estrela de televisão: José Luiz Datena, apresentador do programa popular e sensacionalista ‘Brasil Urgente'”.
Surpresa
Nesta sexta-feira, foi a vez do canal TMC, pertence ao Grupo TF1, principal empresa privada de comunicação da França, abordar o papel de Lula nas próximas eleições.
“Brasil: enjoados de Bolsonaro, brasileiros querem retorno de Lula”, disse o programa “Quotidien”, surpreso pelo fato de Lula ter popularidade após ter saído da prisão.
“Diante do perigo que representa o presidente de extrema direita, os brasileiros estão dispostos a convocar novamente o ex-presidente de esquerda Lula”, reitera.
“Os brasileiros querem o retorno de Lula, enquanto as manifestações anti-Bolsonaro se intensificam no país”, observa.