Lula na resistência e a certeza de que ideias não podem ser aprisionadas. Por Joaquim de Carvalho

Atualizado em 7 de abril de 2018 às 9:25

Em São Bernardo, nascia o líder político Lula (no alto) e o povo agora em frente ao sindicato: Lula já fala garganta de muitos

Daqui a pouco, às 9h30, Lula participará da missa em homenagem a Dona Marisa Letícia, que completaria hoje 68 anos, ela que morreu de um AVC depois de viver sob intensa pressão de Sergio Moro e outros compõem a Lava Jato — Moro chegou a autorizar a divulgação de diálogos privados entre ela e o filho, ao tempo em que sequer ela era alvo da quebra dos sigilos.

Lula não se pronunciou desde que foi ao Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo aguardar o cumprimento da ordem de prisão dada por Moro. Talvez ele faça isso durante ou depois da missa.

Há muita boataria circulando sobre o que Lula fará hoje, mas uma hipótese está descartada — Lula não se entregará.

“A Polícia Federal que venha buscá-lo. Ele está em endereço conhecido”, disse uma pessoa que esteve com o ex-presidente na área restrita do sindicato.

O ex-presidente tem, de fato, uma preocupação: o que poderá acontecer com as pessoas que estão ali para defendê-lo caso forças policiais decidam invadir o sindicato?  Alguém poderá se machucar? Ficar ferida ou até algo pior?

Esta é uma preocupação real, embora muitas pessoas se manifestem no sentido de que estão dispostas a correr riscos. Estas pessoas, inclusive, demonstraram decepção quando a velha imprensa, Globo à frente, adversária de Lula, começou a divulgar intensamente comentários e supostas informações de que Lula estaria negociando sua rendição.

Foi para restabelecer a verdade que a presidente do PT, senadora Gleisi Hoffmann, postou vídeo no Twitter.

“Tem um monte de notícias, que não são corretas, veiculadas sobre os grandes jornais. Vi agora no Estadão, Folha, Veja, esses sites todos da grande mídia, que não gostam do presidente e que estão fazendo campanha contra ele, de que há negociações de entrega. Eu Quero dizer para vocês que o presidente está aqui com a gente. Está aqui protegido pelo povo, por uma multidão aqui no sindicato dos metalúrgicos, e amanhã de manhã (hoje) o presidente participará da missa em homenagem a dona Marisa”, disse ela.

Lula não falou sobre isso publicamente, mas a presença dele no sindicato, neste momento agudo de sua biografia, tem um sentido simbólico. Foi ali que figura política Lula nasceu, na década de 70, durante a ditadura, com a proposta de um novo sindicalismo, em oposição ao peleguismo que caracterizava a atuação dos líderes sindicais da época.

Como presidente do sindicato, Lula organizou as primeiras grandes greves na ditadura militar. Tornou-se um líder político e levou adiante o sonho de muitos brasileiros de fundarem um partido popular.

Ontem, enquanto o helicóptero da Globo sobrevoava a multidão concentrada em frente ao sindicato, era impossível aos mais velhos não se lembrar do que acontecia no estádio da Vila Euclides — perto dali — enquanto Lula comandava as gigantescas assembleias.

Helicópteros do Exército também sobrevoavam a multidão. O barulho era o mesmo. A Globo cobre do alto, porque não é bem-vinda em terra, com riscos para a integridade física de seus profissionais caso insista em enviar algum para o sindicato. O Exército queria intimidar.

Lula fechado em área restrita do sindicato, helicóptero da Globo sobrevoando, a presença da tropa de choque da PM nas imediações, o avanço irresponsável de viaturas em alta velocidade da Guarda Municipal de São Bernardo do Campo em ruas cheias de gente. Tudo lembrava os anos difíceis da ditadura.

Mas, por certo, não amedrontava ninguém, muito menos Lula. Muitos ali estão calejados, trazem no corpo as marcas da prisão política e até da tortura.

Dor, resistência, vitória.

No período em que Lula e outros sindicalistas estavam presos por causa das greves, e as manifestações públicas estavam proibidas, Marisa Letícia ajudou a organizar uma passeata de mulheres pelas ruas de São Bernardo do Campo.

As mulheres marcharam pela liberdade dos maridos, dos amigos, dos companheiros de luta. Foi épico.

Lula, de volta ao palco de uma batalha que nunca terminou — nem vai terminar. Ele sabe que a resistência agiganta um povo e reduz a pó seus adversários.

Lula voltará à prisão, mas a semente plantada lá atrás já uma árvore saudável e dá frutos.

“Falarei pela garganta de vocês, andarei pela perna de vocês. As ideias estão colocadas e elas não podem ser trancadas”, disse Lula, durante a caravana pelo Sul do Brasil.

Dona Marisa se foi, mas aquela marcha que ela liderou continua. Não faltarão brasileiros a marchar pela liberdade de Lula, e em defesa do Brasil e da democracia.