O superintendente do Departamento de Polícia Federal no Paraná, delegado Luciano Flores, tinha consciência de que após a decisão capciosa do ministro Dias Toffoli, em 31 de janeiro passado, autorizando – ainda que com atraso e limitações – a ida de Luiz Inácio Lula da Silva ao velório e enterro do seu irmão, Genival Inácio da Silva, o Vavá, não haveria como impedir o hoje preso político de comparecer à despedida de seu neto, Arthur Araújo Lula da Silva, de 7 anos, falecido dia 1 de março.
Ainda assim, ele bem que tentou criar maiores limitações à participação do ex-presidente na cerimônia. Esbarrou na decisão do próprio Lula em não ceder.
No início da tarde daquela sexta-feira, já com Lula bastante abatido pela notícia da morte do menino por conta de uma meningite, Flores reuniu-se com o preso, seu advogado em Curitiba, Manoel Caetano, e a presidente do Partido dos Trabalhadores, deputada Gleise Hoffmann.
Sabia ser inevitável a ida do preso a São Bernardo, muito embora o pedido de autorização para a viagem, àquela altura já protocolado, dependesse de um despacho judicial. Afinal, Toffoli, em janeiro, foi claro ao afastar as dificuldades enumeradas pelas autoridades da “República de Curitiba” – entre as quais o próprio Flores, autor dos empecilhos listados à época – para impedir a viagem do preso para o velório do irmão.
No despacho, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) definiu que “eventuais intercorrências apontadas no relatório policial, a meu ver, não devem obstar o cumprimento de um direito assegurado àqueles que estão submetidos a regime de cumprimento de pena, ainda que de forma parcial“.
O direito antes negado, desta vez teria que ser acatado. Isso, porém, não impediu o o superintendente do DPF no Paraná de tentar restringir a participação daquele que hoje é considerado um “troféu político” da Força Tarefa da Lava Jato em Curitiba, na cerimônia de despedida do neto.
Esbarrou no posicionamento do próprio preso. Este, ainda que abatido emocionalmente, se recusou a acatar algumas das “imposições” pretendidas pelo delegado.
Inicialmente, respaldado na esdrúxula autorização de Toffoli em janeiro – de que o caixão com o morto, àquela altura já enterrado, fosse levado ao preso em uma unidade militar, tal como noticiamos em Dano irreparável a Lula confirma sua prisão política, Flores quis evitar a ida de Lula ao Cemitério Jardim da Colina, em São Bernardo do Campo (SP).
Sugeriu que o caixão com o neto fosse levado até o ex-presidente, provavelmente em alguma unidade militar. Lula, ao final, sequer passou perto de um quartel. Do aeroporto de Congonhas foi de helicóptero para o pátio da fábrica da Volkswagen de onde, de carro, rumou para o cemitério.
Diante da recusa de Lula em deixar Curitiba com aquela condição, Flores não mais insistiu na ideia. Ela voltaria a aparecer, horas mais tarde, na manifestação dos procuradores da República. Foi o que revelou a advogada Tânia Mandarino, do Coletivo de Advogadas e Advogados pela Democracia, na postagem Dallagnol e sua turma do MPF queriam que Lula velasse o neto num quartel, no site Viomundo.
Flores propôs então a ida do preso ao velório na noite daquela sexta-feira ou na madrugada do sábado. Algo meio que escondido, talvez para evitar uma maior aproximação do “troféu político da Lava Jato” com o público. Provavelmente para manter isolamento que tentam impor ao ex-presidente.
Ainda pela proposta do superintendente, Lula permaneceria no cemitério por apenas uma hora. Imposição que não constava da decisão de Toffoli em janeiro, mas foi levantada pelo delegado no dia 1º de março.
Mais uma vez esbarrou na altivez de Lula que deixou claro ser fundamental estar presente à cerimônia de despedida do neto no crematório. Não queria apenas ir ao velório. Falou do desejo de ir “amanhã de manhã” (ou seja, no sábado, dia da cremação), para estar com a família “próximo ao horário da cerimônia de cremação”. Defendeu ainda a “necessidade de permanecer no local por mais de 1h e 30 min.”, conforme o Blog levantou.
Na realidade, como ficou comprovado, não houve justificativa para delimitarem o prazo de permanência de Lula no velório.
Conforme narramos em Lula e a face perversa da “República de Curitiba”, por conta do atraso das orações realizadas por um padre e dois pastores, a permanência do ex-presidente na cerimônia acabou sendo de aproximadamente 1h e 50 min..
Um “estouro” no tempo que pode ser considerado normal e que não causou maiores dificuldades. Nem por isso, deixou de incomodar os dois delegados federais de São Paulo que coordenavam a verdadeira operação bélica montada no cemitério na manhã daquele sábado, como se o ex-presidente fosse marginal perigoso e ameaçador à sociedade.
Ficou patente para alguns dos presentes no ato religioso no crematório a impaciência dos delegados que a todo momento falavam pelos seus rádios e lembravam a dirigentes petistas que o “prazo determinado” tinha estourado.
A limitação de horário não constava da decisão da juíza Carolina Lebbos, assinada às 19:14:58 horas. Ela apareceu apenas no relato feito pelo delegado Flores ao juízo sobre a conversa com o ex-presidente Lula. Em tal transcrição, o tempo mínimo que Lula teria proposto – “por mais de uma hora e meia” –, após o delegado falar em ficar apenas uma hora, acabou virando tempo limite. Tal como se lê no despacho da juíza ao reproduzir o relato do delegado sobre a conversa:
“Em contato pessoal feito há poucos instantes, por este subscritor e o ex-Presidente Lula, na presença de seu advogado, Dr. Manoel Caetano, foi solicitado que o deslocamento fosse autorizado para ocorrer amanhã de manhã, em horário que permita ele estar presente na capela daquele Cemitério, junto a sua família e de seu neto falecido, próximo do horário da cerimônia de cremação, não havendo necessidade de permanecer no local por mais de 1h e 30 min. Foi dito ainda, tanto pelo Ex-Presidente Lula, quanto por seu advogado Manoel Caetano, quando pela Deputada Gleise Hoffmann, que compareceu na presente data nesta Superintendência, que se comprometem a não divulgar qualquer deslocamento, se autorizado, bem como de não convocar manifestantes ou militantes para o Cemitério, da mesma forma se comprometendo a zelar pela discrição durante o período em que o ex-Presidente esteja em deslocamento ou naquele Cemitério, a fim de evitar manifestações ou qualquer dificuldade para o deslocamento”. (grifo nosso)
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