A polarização política que atingiu o auge no Brasil nas eleições de 2022 deixou rachas como herança na sociedade, revela um levantamento recente da Quaest apresentado no livro “Biografia do Abismo”, escrito pelo cientista político Felipe Nunes e pelo jornalista Thomas Traumann.
Os dados indicam que 32% dos eleitores dos principais candidatos, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL), declararam não acreditar na possibilidade de reatar amizades perdidas durante a campanha.
O estudo também revela que 25% dos brasileiros admitiram sentir desconforto se seus filhos estudassem em uma escola com muitos pais de visões políticas diferentes. Essa mudança na dinâmica social é atribuída não apenas à agenda econômica ou às políticas públicas, mas também à maneira como diferentes grupos enxergam o mundo, seus valores e identidades.
A divisão se aprofundou a tal ponto que, após as eleições de 2022, 90% dos eleitores avaliaram que o país saiu mais dividido da disputa eleitoral. Quase metade dos brasileiros apontou um aumento nas diferenças de visões de mundo entre homens e mulheres, assim como entre moradores das regiões Sul e Nordeste.
O livro destaca o fenômeno da “polarização afetiva”, no qual não apenas cresce a identificação com o próprio grupo, mas também o ódio e a rejeição em relação aos considerados adversários. Os ataques ocorridos em 8 de janeiro, promovidos por apoiadores de Bolsonaro, são citados como o ápice desse comportamento.
Nesse ambiente de polarização extrema, as escolhas cotidianas dos brasileiros estão sendo influenciadas. Desde o consumo até as relações pessoais, a política molda as decisões das pessoas. Boicotes a marcas, rompimento de amizades antigas, desfechos de relações familiares e até cancelamentos de artistas, atletas e influenciadores são algumas das consequências observadas.
Felipe Nunes, um dos autores do livro, ressalta: “A primeira etapa, e esperamos que o livro ajude nisso, é aceitar que há essa polarização extrema. Isso significa entender que haverá diferenças na igreja, na família, nas empresas e nas instituições. Ou a gente entende isso, ou o resultado pode ser muito pior”.