Mais uma vez, a salvação depende de Lula. Por Moisés Mendes

Atualizado em 12 de outubro de 2024 às 22:27
Presidente Lula. Foto: Ricardo Stuckert

Publicado originalmente no blog do autor

Ainda circula pelo Brasil todo, como consolo chato e pegajoso, a conversa de que eleição municipal é uma coisa e eleição para presidente é outra. Mas o que existe, no miolo dessa história cansativa, é uma tentativa de menosprezar derrotas e continuar terceirizando pequenas e grandes missões.

Quem acolhe e dissemina essa conversa ajuda a espargir o autoengano de que as esquerdas não foram tão derrotadas. E tenta vender de novo a ideia de que em 2026 Lula dará um jeito. Deixem que Lula resolve.

Se as cidades não conseguiram deter o avanço de direita e extrema direita, muita gente se defende, para começo de argumentação, tentando subestimar essa avalanche.

Primeiro, com a tese vencida de que a eleição municipal fica em outro compartimento. E que a eleição que vale mesmo é a que terá de reeleger Lula. Subestimam as forças mobilizadas numa eleição municipal e que vão desaguar, em forma de mais poder, em Brasília.

Por isso tentamos nos acalmar dizendo que foram o centro e a direita, e não a extrema direita, que venceram a eleição. Que o PT está avariado e envelhecido mas está vivo, porque até cresceu um pouco, e que Bolsonaro é um perdedor protegido pela performance do PL.

Nunca, depois de uma eleição, foram tantas as divergências sobre o que afinal aconteceu nos municípios. Assim, o PT está quase salvo ou está quase morto, e Bolsonaro pode estar morto se fazendo de vivo.

E Lula? Já nos avisam que Lula vai nos salvar. Como a eleição municipal seria uma coisa distante da eleição que importa mesmo, que é a de 2026 para presidente, é só esperar mais dois anos e tudo estará resolvido.

Antes, chegam a pedir que Lula pare de governar e passe a morar em São Paulo, como cabo eleitoral, para salvar Boulos e as esquerdas, porque em São Paulo a situação é diferente.

O presidente Lula em campanha ao lado de Guilherme Boulos, em São Paulo. Foto: Ricardo Stuckert

Esses números do Datafolha podem ajudar a entender o desespero dos que olham para o umbigo paulistano e entregam o segundo turno de todo o resto nas mãos do destino. Ricardo Nunes tem 85% dos eleitores de Bolsonaro, e Boulos tem 63% dos eleitores de Lula. E mais: 4% dos eleitores de Bolsonaro vão votar em Boulos, e 31% dos eleitores de Lula votam em Nunes.

Nunes, uma alface sem sal e vinagre adotada pelo bolsonarismo, fideliza mais os votos de Bolsonaro, e ainda atrai mais os votos dos eleitores de Lula, do que Boulos fideliza os votos de eleitores do presidente.

Dirão os consoladores que Boulos não é PT e que o eleitor não faz a conexão do candidato com Lula. Subestimam a capacidade de discernimento de parte relevante do eleitor lulista, sem admitir que esses 31% querem votar em Nunes.

E assim, se Lula é há muito tempo maior do que o PT e todas as esquerdas somadas, e se um terço dos seus eleitores vota no candidato da direita, a recomendação é para que Lula acampe em São Paulo e saia gritando pelo Campo Limpo: votem em Boulos e vocês estarão votando em mim.

É mais um constrangimento que as esquerdas não esperavam enfrentar. Depreciam as eleições em cidades médias e grandes, tomadas pela direita, e convocam Lula para a salvação em São Paulo. O que importa é o milagre paulistano.

E 2026 é logo ali. Lula estará sempre pronto para nos socorrer. Transformaram Lula num Batman. Como muitos já transformaram Alexandre de Moraes num Homem-Aranha. As esquerdas passam a depender dos super-heróis.

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