Depois de veicular a informação mentirosa de que Marco Antonio Villa estava de férias, a Jovem Pan divulgou na manhã desta quinta-feira uma nota para dar sua versão sobre o afastamento do comentarista. Ela insinua que puniu o apresentador por ultrapassar a “barreira da crítica” e recorrer à “adjetivação grosseira”. A nota tem os contornos do engodo, conforme se analisará mais adiante. Primeiro a nota da Jovem Pan:
Confrontado com versões e rumores envolvendo um integrante do nosso quadro de profissionais, o Grupo Jovem Pan tem a comunicar o seguinte:
1. Preferimos restringir ao âmbito interno da empresa discordâncias entre colaboradores e direção da empresa;
2. O Grupo Jovem Pan foi pioneiro na intensificação do debate político com a contratação de comentaristas com diferentes pontos de vista, que sempre se manifestaram livremente;
3. O apreço do Grupo Jovem Pan pelo convívio dos contrários – sem o qual não existe democracia real – é atestado diariamente pelo conteúdo da nossa programação;
4. O Grupo Jovem Pan jamais cedeu a pressões de governantes e nunca transformou a liberdade de expressão em moeda de troca;
5. Vale frisar que o atual governo federal não fez chegar ao Grupo Jovem Pan qualquer crítica ao desempenho dos nossos profissionais;
6. Fiel à própria história, o Grupo Jovem Pan seguirá orientado pelo amor à verdade e pelo respeito ao público, que vem homenageando esse comportamento com recordes de audiência e com a consolidação da credibilidade que merece um trabalho sério e sóbrio;
7. O Grupo Jovem Pan entende que esse mesmo respeito ao público impõe aos seus comentaristas limites que separam a crítica substantiva da adjetivação grosseira. Quando tal barreira é ultrapassada, cabe à direção da empresa aplicar medidas que garantam a volta à normalidade.
Direção do Grupo Jovem Pan
Chega a ser risível o argumento de a rádio se orienta pelo “amor à verdade”. Fosse assim, a rádio não teria divulgado a informação falsa (fake news) de que o comentarista estava de férias e que retornaria à emissora em junho.
A patranha está gravada. No dia 28 de maio, o diretor de jornalismo Felipe Moura Brasil, no programa Pingo nos is, leu um comunicado que agora a própria emissora desmente.
“Breve esclarecimento institucional. Blogueiros sujos publicaram na internet que o presidente Jair Bolsonaro mandou e a Jovem Pan demitiu o historiador Marco Antonio Villa. O Grupo Jovem Pan informa nesta terça-feira, 28 de maio de 2019, que são duas fake news. Villa, neste período que compreende semanas de maio e junho, está de férias. E Bolsonaro nunca pediu cabeça de qualquer profissional da empresa.”
Foi o próprio Villa quem desmentiu a Jovem Pan em vídeo que divulgou no mesmo dia.
O comentarista leu a carta que recebeu da empresa, que contraria o “comunicado institucional” feito ao público por seu diretor de jornalismo.
“Em face da necessidade de algumas readequações internas, vimos pela presente comunicar que, pelo período de trinta dias, a contar da presente, prescindiremos dos vossos serviços”, disse Villa, lendo o documento.
Essa carta revelada por Villa desmente que estava de férias e escancara a segunda mentira, expressa no comunicado de hoje, em que não explica por que afastou o jornalista, mas deixa subentendido:
O Grupo Jovem Pan entende que esse mesmo respeito ao público impõe aos seus comentaristas limites que separam a crítica substantiva da adjetivação grosseira. Quando tal barreira é ultrapassada, cabe à direção da empresa aplicar medidas que garantam a volta à normalidade.
Se esse fosse o verdadeiro motivo, não precisaria ter mentido nem para público, nem para Marco Antônio Villa. A um disse, disse que o comentarista estava de férias. A outro, inventou a necessidade de “readequações internas”. Fraude pura.
Flagrada na mentira, a rádio tenta agora dar ar de nobreza ao que foi uma ação para censurar seu comentarista. Seria atitude nobre assegurar que a “barreira da crítica” não seja ultrapassada.
Mas esta, como se sabe, nunca foi a preocupação da Jovem Pan. Se fosse, Villa teria sido afastado há muito tempo, pelas ofensas que dirigia a Lula, Dilma Rousseff, Fernando Haddad e outros políticos de esquerda.
Algumas vezes, os comentários desciam ao nível do xingamento.
Ou será que, para a Jovem Pan, “adjetivação grosseira” contra pessoas de esquerda pode?
No novo comunicado, o de hoje, a Pan insiste em isentar Bolsonaro de qualquer responsabilidade pelo afastamento de Villa.
“Vale frisar que o atual governo federal não fez chegar ao Grupo Jovem Pan qualquer crítica ao desempenho dos nossos profissionais”, destacou.
O fato é que, em seu último comentário na Pan, Villa criticou Bolsonaro.
“Um presidente não tem compostura, não tem preparo. Não tem articulação política. Reforça a crítica ao parlamento, estimulando atos neonazistas, como do próximo dia 26, que é claramente no sentindo de fechar o Supremo, fechar o Congresso e impor a ditadura. E o presidente estimula isso”, afirmou.
Não chega nem perto do que Villa dizia, por exemplo, sobre Haddad, a quem chamava de Jaiminho, por supostamente não gostar de trabalhar.
Não foi, portanto, a ultrapassagem da barreira da crítica que levou a Pan a afastar Villa.
A empresa, certamente, não contará o motivo real e continuará com a lenga-lenga de que “O Grupo Jovem Pan jamais cedeu a pressões de governantes e nunca transformou a liberdade de expressão em moeda de troca”.
A era Bolsonaro tornou os dias mais difíceis na velha imprensa. E os comentaristas agora têm que levar uma mordaça para o trabalho, preocupando-se com a análise do Planalto sobre suas manifestações.
Os jornalistas da direita, como Villa, terão bons motivos para sentir saudade da esquerda no governo.