Por Jeferson Miola, publicado em seu blog
Os resultados do segundo turno consolidaram o cenário de derrota estrondosa das esquerdas prefigurado no primeiro turno da eleição municipal.
As urnas evidenciaram um país adernado à direita. E mostraram o avanço do extremismo para além dos legislativos estaduais e federal, alcançando também a esfera municipal de poder.
A partir de janeiro do próximo ano, direita e extrema-direita assumem a administração de políticas públicas e dos orçamentos de importantes centros urbanos em todo país, aumentando ainda mais sua audiência e ressonância na sociedade.
Embora Bolsonaro tenha assistido a derrota de candidatos extremistas em cujas campanhas ele mais se empenhou, é bastante positivo o resultado eleitoral para a extrema-direita, que está alojada em diferentes partidos, como União Brasil, Novo, Podemos, Republicanos, PP e, secundariamente, em outras siglas, como até no MDB e PSD, e não só no PL do Bolsonaro.
Como Bolsonaro, Lula também sofreu reveses importantes, o principal deles na cidade de São Paulo. No início do ano, Lula fez uma aposta de risco – disse que a eleição na capital paulista seria um confronto entre ele e Bolsonaro, e acabou absorvendo o custo da derrota do Guilherme Boulos.
O PT também foi derrotado no ABC paulista, berço do Partido, e no Estado de São Paulo, onde conquistou apenas quatro prefeituras, a maior delas de Mauá, com 318 mil habitantes; Matão, com 64 mil; Santa Lucía, com 6,4 mil; e Lucianópolis, com 2.173 habitantes.
A alegação de que o PT cresceu em relação a 2020 contrasta com o perfil das cidades que o Partido passará a governar a partir de 2025: 75% delas [188] têm até 20 mil habitantes, outras 16% [41] têm entre 20 mil e 50 mil, 5% [15] entre 50 mil e 100 mil, e apenas oito cidades com população maior que 100 mil habitantes, dentre elas a capital Fortaleza.
O PT governará 10 milhões de pessoas, o PSB 9 milhões e o PDT 3 milhões. Por outro lado, o PSD governará uma população de 37 milhões, o MDB 36,6 milhões, o PL 27 milhões, União 22 milhões, PP 20 milhões, e o Republicanos 13,8 milhões.
Um detalhe é muito relevante: enquanto as esquerdas se localizam preponderantemente nas menores cidades, as direitas e as extremas-direitas controlarão os centros urbanos mais densos e com maior poder de propagação da disputa pela hegemonia política, cultural e ideológica.
Quase 70% das prefeituras conquistadas pelo PT estão em três estados – Bahia [50], Piauí [50] e Ceará [47]. Na região Sudeste estão 17% das prefeituras [42 no total], sendo 35 delas em Minas Gerais, enquanto no Rio foram três, São Paulo apenas quatro e no Espírito Santo nenhuma. A região Sul representa 12% das vitórias municipais [30 prefeituras], sendo 20 delas no Rio Grande do Sul, sete em Santa Catarina e três no Paraná.
O reflorescimento do extremismo e do fascismo tracionou a política para a direita do espectro ideológico, e praticamente causou o desaparecimento do centro político.
Isso não é exclusividade do Brasil, porque é um fenômeno verificado mundialmente. O que é genuinamente brasileiro é o ódio antipetista, que serve para compactar o campo reacionário e conservador tanto da política como da mídia hegemônica, que exerce um papel funcional na alimentação da subjetividade odiosa e estigmatizada do PT e das esquerdas.
A auto-classificação que Gilberto Kassab faz do seu PSD como um partido de centro é apenas uma acrobacia retórica oportunista. Com sua acrobacia, Kassab preserva a condição de pêndulo que pratica jogo duplo, triplo e até quádruplo para se aboletar em qualquer governo, seja progressista ou extremista.
Heterogêneo, com políticos de centro-direita e até de centro, o PSD é hegemonicamente um partido de direita, conservador e ultraliberal. Quando salta do falso muro centrista, Kassab assume que o projeto dele é o mesmo do Tarcísio de Freitas, um extremista com sabor artificial de moderado.
“Eu vou estar alinhado com o projeto que seja compatível com o projeto do Tarcísio, seja ele governador ou presidente”, disse Kassab, ao mesmo tempo em que afirma que a bancada do PSD no Congresso não fechará posição contra o Projeto de Lei que anistia criminosos golpistas, dentre eles Bolsonaro e outros delinquentes civis e fardados.
Não há correlação automática de efeitos entre os resultados dos pleitos municipais e a eleição presidencial de 2026, mas a realidade indica um cenário de dificuldades consideráveis para a reeleição do presidente Lula.
As esquerdas e o governo Lula precisam urgentemente decifrar essa derrota acachapante e entender a maré direitista vis a vis os limites de hoje das políticas governamentais que já não conseguem atrair, empolgar e manter o eleitorado lulo-petista como conseguiam nos governos anteriores de Lula e Dilma.
É preciso analisar as razões dessa realidade mais além de identificar causas-efeitos aparentes, como, por exemplo, a super-valorização da influência das emendas parlamentares nos resultados.
O PT foi o Partido que teve mais verbas do orçamento liberadas neste ano eleitoral: foram R$ 617 milhões.
Esta cifra é muito superior aos valores liberados para o MDB, que teve R$ 450 milhões; ao União Brasil, com R$ 445 milhões; ao PSD, com R$ 407 milhões; ao PP, com R$ 395 milhões; e ao Republicanos, que recebeu R$ 386 milhões.
E é também muito maior que as emendas liberadas para o PL do Bolsonaro, que contou com quase metade do PT – R$ 367 milhões, e ainda assim teve um desempenho eleitoral bem superior.
Este momento não admite ilusões ou falsos consolos, pois o negacionismo diante dessa realidade cobrará um alto preço no próximo período.
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