Mayara Amaral, mais uma vítima de feminicídio, palavra e crime que o Brasil não reconhece. Por Nathali Macedo

Atualizado em 29 de julho de 2017 às 13:54
Mayara.

No país eleito pela ONU o terceiro pior para se ser uma menina na América Latina, feminicídios, por mais bárbaros que sejam, já perderam o poder de chocar, se é que um dia de fato o tiveram.

O word acaba de sublinhar ‘feminicídio’ de vermelho, porque essa palavra não existe pra ele. E tampouco existe para a “grande” mídia.

Mayara Amaral é uma vítima de feminicídio, com ou sem tarjinha vermelha.

Ela foi atraída para um motel por um homem com quem estava envolvida amorosamente – cadê a patrulha do “foi porque quis?” -, e lá foi estuprada, morta e carbonizada por ele e outros dois comparsas.

A “grande” mídia não chama isso de feminicídio, pois é um termo pesado. Prefere eufemismos como latrocínio – estamos mais acostumados com esse termo aqui no Brasil – e “crime passional”. (Nota: amor não mata, não estupra e não carboniza).

O carro de Mayara, um gol quadrado 1992, foi encontrado abandonado. Seus poucos pertences foram levados pelos criminosos. Eles, interessados, é claro, apenas no carro, estupraram e carbonizaram porque afinal já estavam lá, mesmo. Ficaram entediados.

A irmã da vítima escreveu um texto no Facebook com o claro objetivo de fazer com que as pessoas soubessem que Mayara não merecia morrer, como se não fosse óbvio. No início do texto, ressalva que a irmã era musicista e mestranda – portanto, percebam, não merecia morrer, como se alguma mulher merecesse, e, para o “grande” público, de fato merece. O texto, uma defesa totalmente compreensível em um país em que mulheres são culpabilizadas depois de mortas, especialmente as que não gozam de privilégios de raça e classe, teve milhares de compartilhamentos. Viva a internet.

A mídia brasileira, aliás, não consegue admitir a cultura de ódio pelas mulheres que impera no país porque seu público, antes dela, também não consegue fazê-lo. É a lei natural do capetalismo jornalístico.

O resto fica por conta do sadismo dos redatores, talvez: fotos que sexualizam a vítima em capas nojentas, chamadas sensacionalistas que a expõem depois de morta, matérias desonestas que colocam em dúvida o laudo emitido pelo IML que confirma os abusos sexuais.

O nojo que sinto da misoginia da “grande” mídia brasileira só pode ser um pouco (minimamente) aliviado quando posso dizer que MAYARA AMARAL – que tem um nome – foi mais uma vítima de FEMINICÍDIO – e não crime passional ou latrocínio – no Brasil.