Mejor, impossible

Atualizado em 6 de maio de 2011 às 18:14
Sob o céu e o sol de Madri

De Madri

“Señor?”, diz para mim o porteiro do hotel. É quase meia noite de um dia gloriosamente tépido, e estou saindo para comer alguma coisa.

“Pois não, caballero”, respondo em seu espanhol fraturado, que recebe eventuais contribuições do português e até do italiano. Me recuso a usar o inglês quando estou diante de quem fala espanhol. Me parece quase tão ridículo quanto falar inglês em Portugal.

Mejor não andar com isso”, ele me diz.

Isto era o iPad. Não gosto de sair para jantar, quando estou sozinho, como é o caso, sem leitura. Comprei no Kindle um livro muito bom sobre os bin Ladens, e planejava esperar a comida avançando sobre as páginas.

Mas.

Peligroso?”, pergunto.

Ele diz que sim.

É. Estou em Madri, para onde vim numa missão jornalística. Em Londres, ando com o iPad com a maior tranquilidade. Às vezes me pergunto como vou me adaptar à rotina insegura de São Paulo quando retornar. A gente acaba esquecendo como é bom sair de casa sem se assustar com a possibilidade de ser roubado.

Para entrar no clima espanhol mais facilmente, preferi viajar para cá não de British, mas de Iberia, e me desapontei quando vi que a única coisa de graça no vôo era um copo de água. É curioso o fascínio que a comida de avião tem sobre nós, passageiros. Sempre temos a expectativa de uma espécie de banquete.

Madri é uma espécie de cidade intermediária da Europa. Não tem o charme arrogante de Paris ou a beleza fria de Londres, mas mesmo assim merece ser visitada. É uma espécie de São Paulo em miniatura que fala espanhol. Poderia ser um pouco mais limpa, se os madrilenhos não fizessem coisas como jogar a bituca dos cigarros no chão sem a menor cerimônia depois de cuspir no chão. Nas tavernas, eles não parecem fazer muita questão de jogar os guardanapos usados nos cestos de lixo.

A Espanha mudou e não mudou nas últimas décadas. Houve uma modernização em quase tudo, mas ao mesmo tempo os costumes tradicionais foram preservados. Precisava de um adaptador, e tive a má surpresa de não encontrar um no hotel. Me indicaram uma loja onde encontraria. Só que ela estava fechada no meio da tarde. Era a hora da siesta. Às 5 reabre. Eram 5 e meia e nada. Tive que procurar adaptador em outro lugar.

Você come bem com facilidade em Madri.

Num restaurante de aspecto antigo, comi um entrecote com fritas muito bom. Dezoito euros, um pouco mais de 40 reais. A meu lado, uma senhora de uns 75 anos bebia vinho e lia um livro. Percebi que depois do primeiro cálice ela pediu  para o garçom um vinho mais barato.

O garçom me perguntou depois o que achei do prato. Foi a oportunidade de usar meu espanhol peculiar.

“Más barato? Es possible”, disse para ele a respeito da carne que comera. “Mejor? Impossible.”

Ele riu – não sei se feliz com minha avaliação ou divertido com meu espanhol bem-intencionada e ligeiramente ridículo.