Kiko Nogueira me pergunta sobre minha experiência pessoal sobre ser uma confinada em Londres.
Eu diria que, exceto nos dias em que cobri o julgamento de Assange, estou há 10 meses trabalhando de casa com uma nova secretária (Pimba, a gata) e com algumas memórias vagas sobre a vida em sociedade.
Já não me lembro da última vez em que vi um amigo pessoalmente ou fui a um bar ou restaurante ou que usei roupas de sair, perfume ou fiz atividade física, assim como tantas outras pessoas no mundo.
Mas o confinamento tem muito sentidos. Pode ser um abandono ou um resguardo, dependendo do lugar do mundo onde estamos e que lugar social ocupamos.
Durante semanas as ruas londrinas abarrotaram-se de pessoas fazendo compras de Natal sem a obrigatoriedade das máscaras.
No único dia em que saí fui surpreendida por uma multidão de jovens bebendo e dançando, artistas de rua cantando e gente assistindo uma cerimônia Hare Krishna, que geralmente é ignorada pelo público.
Abaixo, a Regen Street em dezembro:
A alegria era contagiante e foi difícil voltar para casa.
Mas, dias antes do Natal o Reino Unido, a cidade foi surpreendido pela nova lei do coronavírus ordenando o lockdown e proibindo as celebrações fora da chamada “bolha de proteção” para atividades que não sejam essenciais.
Hoje o Reino Unido reconhece a conta de infectados e óbitos da omissão tenaz que comecou em março. Ignorou repetidos alertas da sua comunidade científica, preferindo certificar a imunização de rebanho.
Negou ajuda da comunidade europeia para compra de respiradores, abrindo uma solicitação ilegal para que um dos financiadores do Brexit, a marca de aspiradores de pó Dyson, brincasse de desenvolver o produto medico.
O NHS, SUS britânico, que há mais de 16 anos vem tendo seus gastos cortados, teve que ver deixar morrer muitos em suas casas.
O protocolo das ambulâncias era atender apenas a falta de ar aguda, para evitar as manchetes negativas.
Uma médica do NHS me contou chorando que a maioria dessas pessoas não precisavam ter morrido se tivessem sido trazidos antes, mas o sistema tinha que parecer sob controle.
Agora, o Reino Unido foi o primeiro a anunciar a vacinação para gritar ao mundo da boca de um ministro no Twitter que os cientistas britânicos eram melhor que os europeus e que o Reino Unido é melhor sem a Europa.
Apenas posso esperar que ficar em casa signifique olhar para dentro, e que quando saiamos de novo ao mundo, que tenhamos aprendido a olhar uns para os outros.
Eis a Londres do lockdown total: