Moro, o funcionário de Bolsonaro, e as perguntas sem resposta sobre o combate à corrupção

Atualizado em 1 de abril de 2019 às 16:34

Publicado originalmente no Justificando

Jair Bolsonaro e Sérgio Moro. Foto: Agência Brasil

POR FELIPE DA SILVA FREITAS

Poucos episódios da história recente do Brasil serão tão difíceis de explicar quanto o fato de que o Juiz acusado de intervir no processo político que culminou com o impeachment da presidenta Dilma Rousseff e a eleição de Jair Bolsonaro tornou-se Ministro da Justiça do presidente que ajudou a eleger e encontra-se a espera de uma vaga para ser indicado Ministro do Supremo Tribunal Federal. O inusitado desta situação decorre não apenas do mau uso do cargo de juiz, mas reside justamente no fato de o Ministro Sérgio Moro seguir manifestando-se publicamente como se fosse um operador técnico do governo federal e não um militante político aguerrido e espalhafatoso dedicado em – custe o que custar – fazer valer os interesses do seu projeto de poder e do seu grupo político ideológico.

A questão é simples e as consequência de fácil apreensão. Moro executou práticas de lawfare contra o ex presidente Lula[1], violou a segurança nacional gravando e divulgando ilegalmente conversa da Presidenta da República realizada dentro das dependências do Palácio do Planalto e com isso credenciou-se junto as hostes bolsonaristas para o cargo de Ministro. Ou seja, assumiu, por todos os caminhos, a posição política de um agente partidário e aderiu ao projeto do governo federal devendo, portanto, responder politicamente pelas ações do governo que escolheu representar.

Neste sentido, é muito preocupante o modo reverente pelo qual alguns Senadores da República comportaram-se durante a sessão da Comissão de Constituição e Justiça do Senado no último dia 27 quando Moro foi tratado como um técnico a explicar as peculiaridades de uma proposta legislativa submetida ao crivo do Congresso Nacional[2]. De modo absolutamente injustificado, o Senadores deixaram de indagar assertivamente sobre a questão das milícias que cercam a família Bolsonaro[3], sobre os casos de corrupção que ocupam os andares de cima do Palácio do Planalto com ministros do núcleo do governo[4], sobre a controversa relação entre “os Bolsonaro” e o Fabrício Queiroz nas denúncias de corrupção que envolvem o pagamento de propina na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro[5], sobre as medidas práticas adotadas pelo Ministério da Justiça para elucidar definitivamente a execução da vereadora Marielle Franco[6] ou ainda sobre quais as proposições para controlar a produção, comércio e a circulação (legal e ilegal) de armas e munições[7].

O ministro Sérgio Moro não pode ir ao Congresso Nacional e fazer um discurso de legalista democrata sem explicar como o Ministério da Justiça vai tratar a asquerosa orientação do Presidente da República de comemorar o Golpe Militar de 1964[8], bem como as declarações da base aliada em apologia à tortura e do próprio presidente que circula pelo mundo a festejar ditadores e a estimular discursos de ódio contrários aos direitos humanos[9].

Moro precisa explicar porque se recusa a comparecer à Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, mas, reuniu-se fora da agenda com representantes da empresa de armas Taurus sem explicar a ninguém o motivo e os objetivos desta controversa articulação[10]. Moro precisa dizer porque desconvidou Ilona Szabó para o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária e quais grupos agiram no governo para pressioná-lo a tal decisão[11].

Como bem definiu o deputado Rodrigo Maia (em espasmo de profunda lucidez) “Moro é funcionário de Bolsonaro” que rapidamente acostumou-se aos trejeitos da política partidária[12] e que não pode ser poupado de responder pelas articulações e escolhas políticas do conjunto do governo como se o Ministério da Justiça fosse um ente apartado do lamaçal que envolve os demais ministérios da Esplanada. Moro escolheu entrar para o campo da política, escolheu – desde quando ainda era Juiz na verdade – atuar no mundo dos militantes, portanto, não pode jamais ser preservado da responsabilidade de prestar contas sobre os desmandos do governo, sobre a vergonha internacional do presidente ou mesmo sobre a manobra, controversa, do Presidente da Câmara dos Deputados que, após bater boca pela imprensa e dias depois reunir-se com o próprio Moro, sustou autoritariamente medida da Comissão de Legislação participativa que houvera convocado o Ministro a prestar esclarecimentos sobre o Pacote Anti Crime[13].

Não se combate a corrupção com agentes públicos que se escondem do escrutínio público sobre suas ações. Moro – o funcionário de Bolsonaro – precisa responder ao conjunto da sociedade sobre os temas que envolvem a tragédia do atual governo, pois, como diz o próprio Bolsonaro, tem que mudar isso daí.