Publicado originalmente no Brasil de Fato
Por Paulo Motoryn
O jovem ativista Vinícius Lima, fundador do SP Invisível e integrante da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, criticou a indicação do ex-ministro da Justiça e atual advogado-geral da União, André Mendonça, para vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). A escolha do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) foi oficializada na manhã desta terça-feira (13), com a publicação no Diário Oficial da União. Mendonça ainda precisa ser aprovado em sabatina no Senado.
A indicação cumpre promessa feita em 2019 por Bolsonaro de nomear um ministro “terrivelmente evangélico” para uma das duas indicações ao STF as quais ele tem direito durante seu mandato. Em entrevista ao Brasil de Fato, Vinícius Lima comentou a nomeação de Mendonça ao cargo. Segundo ele, a gestão Bolsonaro “apesar de ser o governo com mais evangélicos integrando, é onde menos vemos Jesus refletido”.
Lima argumenta que a indicação de um ministro evangélico por Bolsonaro não é uma sinalização aos valores pregados nas igrejas evangélicas: “É um governo onde menos vemos os sinais do reino de Deus, que é a Justiça, a alegria, o combate à pobreza e à injustiça”.
“Muitos podem pensar que quanto mais evangélicos no poder, significa que Jesus chegou ao poder. Não tem nada a ver. Primeiro, porque Jesus não precisa de representantes. Segundo, porque essas pessoas estão longe de serem seguidoras de Jesus. Os evangélicos que hoje compõem o governo Bolsonaro só adoram o dinheiro, a corrupção e o poder. Mas não conseguem servir o pobre, o oprimido, sinalizar as injustiças e combater a pobreza. É isso que Jesus faria se voltasse hoje”, disse Lima.
Questionado pela reportagem sobre quais valores propagaria, na sua visão, um ministro terrivelmente evangélico, afirmou: “É importante pontuar que um político terrivelmente evangélico não é um político que usa da política para matar, destruir ou roubar. Quem faz isso, como diz a Bíblia, é o diabo”.
“Um político terrivelmente evangélico quer imitar os passos de Jesus à risca. Quer usar da política para transformar a vida das pessoas, para ajudar as pessoas, para mudar a realidade das pessoas e criar uma nova sociedade. Cada vez mais justa, mais igual e mais democrática”, concluiu Lima.
ESCOLHA DEPOIS DE ENCONTRO COM FUX
Na segunda-feira (12), na saída de uma reunião com o presidente do STF, Luiz Fux, o presidente da República disse a jornalistas ter aguardado para informar sua indicação por pedido de Fux, em respeito ao ministro Marco Aurélio Mello, que ainda ocupa o cargo.
Bolsonaro já tinha confirmado a intenção de indicar o pastor e advogado na última semana, em entrevista a uma rádio com jornalistas aliados do governo. O presidente ainda afirmou que gostaria que o indicado começasse as sessões do Supremo com uma oração:
“Como é bom se uma vez por semana, nessas sessões que são abertas no Supremo Tribunal Federal, começasse com uma oração do André. Então, uma pitada de religiosidade, de cristianismo, dentro do Supremo, é bem-vinda”.
Na entrevista, o presidente teceu elogios ao indicado, dizendo que, além de evangélico, tem notável saber jurídico.
Mendonça é pastor da Igreja Presbiteriana Esperança, em Brasília. Natural de Santos (SP), o advogado tem 48 anos e é formado pela Faculdade de Direito de Bauru, no interior de São Paulo. Tem também o título de doutor em Estado de Direito e Governança Global e o de mestre em Estratégias Anticorrupção e Políticas de Integridade pela Universidade de Salamanca, na Espanha. Se confirmado no STF, Mendonça poderá ficar na corte por 27 anos, até 2048.
O caminho para assumir o cargo não é imediato. Se indicado, Mendonça terá de se submeter à uma sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, que em seguida vota se aprova a indicação ou não. Daí, o nome segue para o plenário e precisa ser aprovado por maioria simples.
Fidelidade bolsonarista
André Mendonça atua na AGU desde 2000, quando ingressou por concurso público. Na instituição, ele exerceu os cargos de corregedor-geral e de diretor de Patrimônio e Probidade.
Em 2019, assumiu o comando da AGU com a chegada de Bolsonaro à presidência, mas no ano passado assumiu o Ministério da Justiça com a demissão de Sergio Moro.
No início do ano, voltou para a AGU numa reforma ministerial. Ao longo desse período no primeiro escalão do governo federal, Mendonça demonstrou uma verdadeira fidelidade canina ao chefe.
Ele acionou diversas vezes a Lei de Segurança Nacional (LSN), criada pela ditadura militar, para reprimir críticas a manifestações contrárias a Bolsonaro. Entre os alvos de inquéritos solicitados pelo então ministro da Justiça estão o pré-candidato à presidência Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (PSOL), além de comunicadores, cartunistas e professores.
Foi sob sua gestão que o Ministério da Justiça foi acusado de produzir um dossiê contra 579 servidores federais e estaduais de segurança identificados como integrantes do “movimento antifascismo”, além de três professores universitários.
Mais recentemente, após reassumir como advogado-geral da União, Mendonça fez uma sustentação oral no STF, em ação judicial para permitir a abertura de cultos em igrejas mesmo num dos piores momentos da pandemia de covid-19.
A performance parecia milimetricamente pensada para agradar o chefe, mas o episódio gerou irritação entre os demais integrantes da corte, que criticaram a postura do advogado público.
Edição: Rebeca Cavalcante