Natal para mim foram os da José Rubens, quando eu era menino, nos anos 60, na Previdência do ônibus Belém-Rebouças, o 921 azul e branco que nos transportava para o mundo exterior e depois trazia de volta ao ninho. Na Previdência do campo do Zicão e do homem que ao gritar em seu carrinho “vendo e troco revista” me fazia tremer com as possibilidades de ler Fantasma, Mandrake, Batman e Super-Homem.
Talvez porque eu acreditasse em Papai Noel.
Talvez porque as casas ficavam abertas, portas e portões, e todos confraternizavam numa rua da São Paulo de antigamente.
Talvez porque Papai Noel não se esquecesse de me dar as coisas que me deixavam de olhos arregalados. O uniforme do Corinthians, principalmente a camisa listada, e uma bola de capotão.
Talvez porque eu sentisse que aquele era meu mundo, e nele estaria sempre protegido e feliz, na rua de terra em que jogávamos bola e bolinha de gude, meus amigos e eu.
Talvez porque fosse a época em que os parentes de Flora Rica nos visitavam, Tio João e Tia Tereza, mais os cinco filhos. (A mais velha, Iara, morreria cedo, aos 30 e poucos. Peguei um avião para o enterro em Campo Grande, e jamais esqueci a frase que ouvi de Tio João no velório: “Sua prima não está linda?”)
Talvez porque as pessoas na José Rubens rissem, trocassem abraços e às vezes presentes simples, cantassem músicas bonitas, ainda que desafinassem em sua alegria gárrula e bêbada, como era o caso da Tia Lili.
Talvez por causa do presépio.
Talvez porque meus amigos estivessem por perto, Zezé, Totó, Laerte, Celso, Banus, e eu sabia que podia contar com eles.
Talvez porque ao olhar para fora de casa eu via gente querida, Hideo, Dona Nena, Dona Ruth, Talarico, tanta gente que já passou sem que de fato tenha passado para mim, e ao olhar para dentro visse, oh Deus, minha mãe e meu pai.