A disseminação de notícias falsas por canais bolsonaristas no Telegram, cujo conteúdo criminoso desinforma diariamente milhões de pessoas no país, foi tema de extenso artigo publicado pelo New York Times nesta quinta-feira (5), tanto na edição impressa quanto online. Após acompanhar diversos grupos de extrema direita difusores de fake news no aplicativo, a articulista Vanessa Barbara classificou os canais e suas atividades como uma verdadeira “onda de loucura”.
A reportagem adverte que, mais do que uma mera adulteração de matérias e vídeos, o mergulho nos grupos bolsonaristas revelou algo muito mais sinistro. “Desregulados, extremistas e desequilibrados, esses grupos servem para caluniar os inimigos do presidente e conduzir uma operação de propaganda sombria”, descreve o diário, apontando para as mais as mais absurdas fake news do esgoto bolsonarista, propagadas como verdades absolutas.
Não à toa, alerta o jornal, Bolsonaro advoga em favor das mentiras, sob o perigoso manto da “liberdade de expressão”. O Times cita declarações de Bolsonaro de que “notícias falsas fazem parte das nossas vidas”, dadas quando recebeu um prêmio de comunicação do próprio Ministério das Comunicações. “Não fica mais orwelliano, fica?”, indaga a articulista, em referência ao escritor George Orwell, que abordou na obra 1984 os perigos do controle da população por meio da manipulação da comunicação.
Barbara elenca mentiras como a de que Elon Musk, novo dono do Twitter, planejava chamar Carlos Bolsonaro, cujo nome é associado à rede de difamações Gabinete do Ódio, para comandar as operações da plataforma no Brasil. Também a notícia falsa de que Bolsonaro teria ganhado a machete do jornal americano The Washington Post como “o melhor presidente de todos os tempos”. E ainda que uma das motociatas de Bolsonaro teria entrado no Guinness pela participação recorde de motociclistas. Tudo piada.
Lula é o principal alvo das mentiras
“Em grupos pró-Bolsonaro de médio porte, como “Os Patriotas” (11.782 assinantes) e “Grupo de apoio Bolsonaro 2022” (25.737 assinantes), o foco é implacável”, observa a reportagem. “Os usuários compartilharam exaustivamente uma foto digitalmente alterada de Lula sem camisa de mãos dadas com o presidente Nicolás Maduro, da Venezuela, como se eles tivessem formado um casal homossexual na década de 1980. “Preciso dizer que é falso?”, espanta-se a articulista.
Barbara destaca ainda que as fake news têm caráter bizarro e infinito. “Lula patrocinado por traficantes de drogas; ele perseguirá as igrejas; ele é contra brasileiros de classe média terem mais de uma televisão em casa. As pessoas usam qualquer coisa que puderem”, denuncia.
O Times aponta ainda que, por trás da atividade frenética do bolsonarismo, está o desespero, uma vez que Lula lidera todas as pesquisas de opinião de voto. “A realidade da popularidade de Lula é claramente muito dolorosa para suportar, então os usuários do Telegram se refugiam na fantasia”, relata a reportagem. Ela cita uma pesquisa imaginária que coloca Bolsonaro com 65% das intenções de voto, contra 16% para Lula.
“Quando inventar pesquisas não funcionar, sempre dá para cancelar a disputa”, argumenta. “Com medo de uma prisão internacional, Lula vai desistir de sua candidatura”, afirmou outra “notícia”. “O desejo é quase comovente”, ironiza Barbara.
Ataques às instituições
O Times denuncia ainda a sanha golpista de Bolsonaro e seus aliados contra as instituições brasileiras, notadamente o Supremo Tribunal Federal (STF), responsável por inquéritos que investigam redes de fake news no país. “No Telegram, esse escrutínio não foi bem recebido”, informa o diário americano.
“As pessoas acusam os ministros de defender publicamente o estupro, a pedofilia, o homicídio, o tráfico de drogas e o tráfico de órgãos. Eles compartilham uma foto manipulada de um juiz posando com Fidel Castro”, relata.
“Compartilham um vídeo falseado em que outro ministro [Luis Roberto Barroso] confessa que o Partido dos Trabalhadores o está chantageando por participar de uma orgia em Cuba”, discorre Barbara. “Ele disse isso – mas na verdade estava dando um exemplo bizarro de fake news contra ele, um boato que o próprio Bolsonaro ajudou a criar no Twitter”, esclarece.
A articulista noticia ainda que algumas medidas foram tomadas para conter a enxurrada de fake news nas redes do país, como canais de checagem de fatos e o adiamento, pelo WhatsApp, do uso de ferramentas que reúnem chats de grupos diversos no país, para depois das eleições. Ela adverte, no entanto, que essas ações não são suficientes para garantir a lisura do processo eleitoral e da própria democracia.
“Há uma solução à qual podemos recorrer, pelo menos: nos livrar, pelo voto, de políticos [promotores] de mentiras”, conclui.
Publicado originalmente no site do Partido dos Trabalhadores