3 a 0 para a Holanda. Como diz meu amigo Caco de Paula, monge aposentado, tudo o que é ruim sempre pode piorar.
A seleção brasileira colecionou mais um feito: é a terceira vez que perdemos dois jogos consecutivos em Copas do Mundo. A primeira foi em 1966, a segunda em 1974.
Nessa caminhada para o fracasso em que brilhou, acima de todas, a estrela de Felipão, um jogador virou símbolo de salvação quando era, na verdade, parte do problema.
Neymar foi transformado em mártir e causa por obra de um técnico descompensado (que está de saída), de seus colegas, de uma torcida ingênua (dentro e fora dos estádios), de uma imprensa amiga e de uma CBF sem escrúpulos.
Não me refiro a seu talento no gramado, mas no que ele passou a representar. A contusão foi tratada como um “atentado”. Sim, foi grave, sim, foi uma entrada duríssima, tanto que o tirou da competição. (Dois dias depois, ele estava andando).
Como poderia ser bom uma equipe depender desta maneira de um atleta? Que sentido tem um time que já vive à beira de um ataque de nervos entrar em campo segurando uma camisa em homenagem a um companheiro, como se ele tivesse morrido?
Neymar é usado.
Mas Neymar se utiliza disso tudo, também.
Houve uma corrente de solidariedade nas redes sociais logo após sua lesão. Os jogadores postaram mensagens com a hashtag #jogapraele. Mais tarde, o próprio respondeu com #jogapramim.
Tudo lindo, exceto que foi uma ação da Sadia, patrocinadora da CBF. A expressão #jogapramim aparecia num comercial em que crianças pediam que o Brasil ganhasse o título por elas (sorry, kids). Ninguém achou minimamente estranho faturar em cima de uma comoção nacional porque isso faz parte do negócio.
É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que alguém encontrar traços de espontaneidade em Neymar.
Sua coletiva foi tratada como uma enorme concessão. Mas como, se está no contrato? E por que ele não deveria falar? Onde o sacrifício?
Saiu-se razoavelmente bem para uma plateia emocionada. Chorou ao lembrar da jogada com Zúñiga. Eu não estou dizendo que não vi lágrimas, mas vamos adiante.
Um dos poucos questionamentos menos paternais foi sobre as ofensas de seu empresário Wagner Ribeiro a Felipão (xingado de “velho babaca, arrogante, asqueroso, prepotente e ridículo”).
“O que sai da boca do Wagner é explicação dele, ele tem que tomar atitude pelos seus atos”, disse Neymar. “É uma pessoa que eu tenho um carinho muito grande, uma pessoa que eu admiro, mas com essa atitude dele eu não concordo, não aceito, e se eu vê-lo hoje eu vou xingar, sim, porque eu não aceito o que ele falou.”
Wagner se sentiu à vontade para chutar covardemente Felipão porque sabe que não dá em nada com seu cliente. Merece uma caxirola quem acreditou que Neymar ficou realmente bravo com Ribeiro. Se fosse verdade, teria simplesmente ligado para o sujeito, ora.
“Nós, brasileiros, principalmente a imprensa brasileira, tem uma mania um pouco errada de que quando se perde tem que mudar. Quando se perde tem que mudar o jogador, tem que mudar o treinador…”, afirmou. “Só estou falando que essa mania que nós temos de ter que mudar quando se perde, isso não é assim”.
Neymar não quer alterar a ordem das coisas porque, do jeito que está, é bom para ele.
No final da conversa, ele foi aplaudido. Um grande teatro.
Um teatro em que Neymar é mais um dos atores. O mais talentoso deles, sem dúvida, mas um ator. Está na hora de mudar tudo.