Nunca assisti a nenhum capítulo do Big Brother Brasil, mas nem por isso desconheço completamente o que se passa no programa da Globo, já que os sites de notícias cobrem o reality show.
Sei que existe uma pessoa lá dentro que já deu declarações racistas e homofóbicas, e fiquei surpreso ao constatar que essa pessoa permanece no programa, não por decisão da emissora ou até da polícia, que abriu inquérito para investigá-la.
Mas por decisão do público.
É o povo que assiste ao programa e participa da votação que não quis mandá-la para casa, na consulta feita ontem.
O resultado gerou um movimento na internet para criticar o programa e, principalmente, essa participante, Paula, que tem 28 anos, é formada em Direito e é do interior de Minas Gerais.
Ela já fez referência ao cabelo de uma negra como algo ruim, expôs preconceito ao atribuir comportamento criminoso a favelados e lamentou por ter beijado um jovem sem saber que ele era da favela.
Houve campanha na internet pela eliminação de Paula. Jornalista que cobre essa área de televisão dizia que a a eliminação era certa.
“Não tem a menor condição de Paula continuar participando do BBB e também não dá nem para pensar em vê-la como vencedora. A moça, além daquela vozinha irritante, é possivelmente a pessoa mais racista e preconceituosa que já chegou a pisar naquele programa. Pode até ser que outros participantes fossem até mais preconceituosos do que Paula, mas não chegaram a demonstrar isso dentro do reality, como ela faz”, escreveu Odair Braz Júnior, que tem uma coluna no R7.
“Paula já falou todos os tipos de absurdos, desde ofensas a comunidade LGBT, passando por negros, críticas à aparência física e aversão a pobres”, acrescentou.
Mas, divulgado o resultado, quem caiu foi um rapaz que mora na Favela da Rocinha, no Rio de Janeiro, Danrley, em tudo oposto a Paula.
Há um vídeo de uma cena do programa que mostra a participante tentando arrancar de Danrley a declaração de que ele já havia usado droga.
Ele nega, mas ela insiste como se não fosse possível a ele viver sem usar droga. Seria por que é morador da Rocinha?
Na consulta sobre a eliminação, houve 144 milhões de votos, uma das maiores da história do programa, resultado de grande mobilização na internet.
Pelo visto, era para protegê-la, já que o jovem excluído não era o tipo que despertasse grande rejeição. Apesar disso, teve mais de 60% dos votos contra 23% da concorrente.
É fato que pessoas que, em tese, teriam simpatia pelo Danrley ignoram completamente a atração da Globo.
Mesmo assim, a grande diferença de votos e a defesa apaixonada que pessoas fazem de Paula na rede são motivos para reflexão.
No confronto entre aquela que é vista como racista e o morador da Rocinha, o público estaria fazendo campanha em defesa da “racista”?
O que isso diz sobre nós, enquanto sociedade?
É verdade que o público pode ter optado por manter a polêmica, sem nenhum aval ao que diz a participante.
Mas pode ser também a rejeição ao princípio do politicamente correto, exatamente o que defende Jair Bolsonaro.
O Big Brother é um programa sem graça e que não acrescenta nada na vida de uma pessoa. É passatempo, mas é também um termômetro.
Dá a exata medida da nossa febre.