Por Eduardo Maretti
Em discurso eloquente sobre a democracia, e contundente ao se dirigir aos golpistas do 8 de janeiro, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Luis Roberto Barroso, sem citar nomes, se referiu aos seguidores de Jair Bolsonaro que atacaram a Praça dos Três Poderes, há um ano, como “aprendizes de terroristas”. O discurso foi feito para inaugurar a exposição Após o 8 de Janeiro: Reconstrução, Memória e Democracia, cujo título é auto-explicativo.
“Numa espécie de alucinação coletiva, milhares de pessoas aparentemente comuns, insufladas por falsidades, teorias conspiratórias, sentimentos antidemocráticos e rancor, foram transformadas em criminosos, aprendizes de terroristas”, disse o magistrado.
“Em meio a tudo o que vi e ouvi, poucas coisas me impressionaram mais do que o relato de um dos nossos bravos policiais judiciais, que enfrentaram com destemor e em grande desvantagem numérica a horda de bárbaros invasores. Narrou-me ele que, após arremessarem objetos, dar marretadas nas paredes e atearem fogo aos tapetes, ajoelhavam-se no chão e rezavam fervorosamente”, contou o ministro. Em suas palavras, “as pessoas rezavam ao mesmo tempo em que destruíram”.
Falsos patriotas e falsos religiosos
Segundo ele, os criminosos que atacaram Brasília são “falsos patriotas” e “falsos religiosos”. “Falsos patriotas que não respeitam os símbolos da Pátria. Falsos religiosos que não cultivam o bem, a paz e o amor”, disse. “Na vida brasileira, já conhecemos o ‘caminho maldito’ da ditadura, na expressão de Ulysses Guimarães”, afirmou. “E, no 8 de janeiro constatamos as consequências dramáticas da incivilidade, dos discursos de ódio e da desinformação.”
Ele declarou que a hora é de “fazer diferente e retomarmos os ideais iluministas e civilizatórios da Constituição de 1988”. Entre os membros do Poder Judiciário, Barroso só não é mais odiado por Bolsonaro e sua horda do que o colega de STF Alexandre de Moraes.
O ministro irritou os extremistas em várias ocasiões. Por exemplo, após a vitória do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2022, o ministro do Supremo caminhava na cidade de Nova York quando foi abordado por um bolsonarista questionando a urna eletrônica. Depois de o homem insistir, Barroso disse de repente: “perdeu, mané, não amola”.
Em julho de 2023, em um Congresso da União Nacional dos Estudantes (UNE), o ministro do STF afirmou: “nós derrotamos o bolsonarismo para permitir a democracia”.
Luz e trevas
O presidente do STF relembrou o dia em que, mesmo com toda a destruição, o tribunal reabriu apenas 24 dias depois do ataque. “A história deixará documentado que, no dia 1º de fevereiro, realizamos regularmente a sessão solene de abertura do ano judiciário e, num gesto simbólico de reafirmação da Justiça, abraçamos o prédio do Supremo. Éramos mais 3 de mil pessoas presentes fisicamente, e milhões de outras que, em espírito, celebravam a vitória da luz sobre as trevas.”
Chamada a se pronunciar pelo presidente da Corte, a ex-ministra Rosa Weber, que se aposentou em setembro, mencionou a tristeza que sentiu ao constatar a destruição causada pelos criminosos. Porém, disse que o sentimento é de extrema felicidade pela recuperação da sede do tribunal, e também por ficar comprovado “que a autoridade das instituições democráticas não está nos prédios, e sim no espírito que as anima”.
Além de vândalos, ladrões
O tribunal já condenou 30 criminosos que participaram do ataque, As penas vão de três a 17 anos de prisão. O edifício do STF foi o que sofreu a maior destruição, em comparação com o Congresso e o Palácio do Planalto, o que demonstrou o tamanho do ódio do bolsonarismo ao tribunal.
O prejuízo no Supremo, incluindo o que foi gasto com a reconstrução do plenário, somou R$ 12 milhões. Foi constatado que 951 itens foram furtados, quebrados ou totalmente destruídos.
Publicado originalmente em Rede Brasil Atual