O Movimento dos Sem Terra é pop. Tanto quanto a estampa de Che Guevara na famosa foto de Alberto Korda ou o rosto de Frida Kahlo com flores no cabelo, o boné vermelho com o símbolo do movimento é hoje um objeto de desejo dos esquerdistas que querem mostrar apreço pelo grupo que luta por reforma agrária e, com sua organização, possui uma gama de atividades que vão desde um fundo de investimento até uma escola de formação passando por uma editora e uma rede de lojas na qual comercializa seus próprios produtos.
Apesar do historicamente vilanizado pela imprensa hegemônica, até em uma novela da TV Globo o grupo já foi retratado com simpatia: em 1996, na novela “Rei do Gado”, de Benedito Ruy Barbosa, alguns personagens da trama pertenciam ao movimento. A novela foi ao ar dois meses depois do massacre de Eldorado dos Carajás, que evidenciou na mídia a violência dos conflitos envolvendo a luta pela terra.
“A agricultura brasileira sempre viveu em crise. É muito difícil encontrar um agricultor satisfeito com a vida. Eles estão sempre se queixando, mas nunca desanimam”, disse o autor ao apresentar a sinopse da novela à emissora carioca. “Desde 71, quando escrevi ‘Meu Pedacinho de Chão’ para a TV Cultura, (…) comecei a mexer com o mundo rural, colocando minhas opiniões sobre a questão da terra. (…) A Reforma Agrária não é o assunto mais importante da minha novela, mas o assunto mais importante do meu país.”
A trama envolvendo o grupo campesino foi tão relevante na época que no enterro do político que o dava apoio, o Senador Caxias (ironicamente interpretado pelo hoje bolsonarista Carlos Vereza), compareceu até o Senador Eduardo Suplicy (PT-SP) , que muitos viam como o político que inspirou o parlamentar ficcional.
MST invadindo o cinema
Além da televisão, o grupo também já foi objeto de um documentário dirigido pela cineasta Camila Freitas, que acompanhou o dia a dia de uma ocupação do Movimento Sem Terra na Usina Santa Helena, em Goiás, o acampamento Leonir Orback . Lançado em 2021, “Chão” mostra a disputa por uma área com cerca de 15 mil hectares e que acumula aproximadamente R$ 1 bilhão em dívidas com a União.Em 2015, aproximadamente 4 mil pessoas ocuparam a terra, o que culminou em uma perseguição jurídica ao grupo, empreendida pelo Ministério Público Estadual e que levou à prisão dois militantes, acusados de formação de organização criminosa.
Em entrevista concedida ao site do MST quando do lançamento da obra, a diretora explicou a razão de sua opção em fazer um documentário com o movimento, e não sobre ele:
“Acho que o cinema documental se propôs a se aproximar de lutas e realidades sociais adversas em muitos momentos da história, mas essa tarefa vem se tornando cada vez menos a de “retratar”, “representar” povos oprimidos na tela, mas de criar alianças e fazer junto. E o que tem acontecido mais recentemente e que é muito valioso é o gesto de apropriação do cinema pelos movimentos populares, uma “ocupação do latifúndio das telas”, como a gente escuta a companheirada dizer.”
Veja o trailler:
O Boné do MST
Recentemente uma postagem no Twitter criou uma grande polêmica sobre quem poderia ou não usar o acessório. Uma postagem criticava quem o usava em eventos como festas e baladas. Defensores do uso do adereço manifestaram-se favoravelmente à utilização, levando o próprio grupo político a manifestar-se em sua conta oficial, por meio de um vídeo gravado pela influencer de esquerda Laura Sabino no qual ela mostra que os bonés “fazem parte do instrumento de agitação e propaganda do movimento”, incentivando assim sua aquisição.
?? Nas redes sociais só se fala naquilo: "Afinal, quem pode usar o boné do MST?"
? O boné do MST é um símbolo da organização, assim como a bandeira, o hino, a lona preta, a foice e o facão. Os trabalhadores e as trabalhadoras Sem Terra utilizam o boné há quase 40 anos no pic.twitter.com/KFdkbG9w39
— MST Oficial (@MST_Oficial) March 8, 2022
Algumas celebridades já utilizaram o chapéu com o símbolo do grupo em sinal de apoio às ideias e ideais do Movimento. Entre eles, o ator porto-riquenho Benício dal Toro, que conheceu a Escola Nacional Florestan Fernandes, em 2010.
“O MST traz oportunidade e esperança ao ser humano.”, disse ator principal de “Che: o argentino”, filme de 2008. “Oportunidade de educação, de mudança. Tem os mesmos princípios que defendia Che Guevara, é portanto um movimento guevarista”.
Chico Buarque é outro entusiasta confesso do MST e já posou com o famoso boné.
Em live realizada em abril de 2020, o compositor ressaltou a importância da atuação do movimento no auge da pandemia: “Enquanto grandes empresários estão dispensando trabalhadores, trabalhadores sem-terra estão doando seus produtos orgânicos para o povo mais necessitado”, comentou.
Caetano Veloso é outro artista que já expressou seu apoio ao trabalho desenvolvido pelo grupo. Em visita a uma ocupação realizada e sua cidade natal, Santo Amaro da Purificação, o artista pediu a colaboração ao poder público local às iniciativas do movimento: “São quatro assentamentos na zona rural de Santo Amaro.”, disse o cantor. “Com o mínimo de infraestrutura, a produção poderia ser maior e os trabalhadores rurais garantiriam itens orgânicos e agroecológicos para habitantes das cidades do entorno.”
Greg News
Um dos pontos altos da presença do MST na imprensa foi no décimo oitavo episódio da terceira temporada do “Greg News”, exibido pela HBO Brasil, em 2019.
Na linguagem bem humorada que caracteriza o programa, o humorista Gregório Duvivier apresentou o Movimento como se fosse uma start up de sucesso, apresentando dados normalmente negligenciados pela imprensa, como o fato do grupo ser o maior produtor de arroz orgânico da América Latina e relembrando o veto do ex-governador João Doria (PSDB-SP) à realização da tradicional “Feira Nacional da Reforma Agrária” no Parque da Água Branca, mesmo com a tentativa do ex-governador Geraldo Alckmin, na época ainda seu aliado no ninho tucano, de tentar demovê-lo da ideia.
O vídeo do programa está disponível no You Tube e possui mais de um milhão de visualizações: