Após missa de 10 meses do falecimento do seu filho Thomaz, terça-feira na igreja Nossa Senhora do Brasil, o governador de São Paulo convocou um grupo de militantes mais o pré-candidato a prefeito João Doria para um café. A trupe desceu 100 metros pela avenida Europa sentido Faria Lima, atravessou a rua e pegou de surpresa funcionários e clientes do Posto Ipiranga. Pronto.
O cenário estava armado. Bastava o gesto da campanha, um V em sentido horizontal com a mão direita na altura da barriga, e o sorriso caprichado para a foto. Era o recado que em minutos estaria no facebook do pré-candidato, nos sites de notícias e nos jornais da manhã seguinte.
Dali Geraldo voltou para casa com a mulher, Lu, e a filha Sophia. João Doria seguiu para um encontro com militantes da zona Oeste na Faculdade Sumaré. Coube a Avelázio Jacobina, folclórico tucano da zona Leste da capital, de quem Geraldo e Lu são padrinhos de casamento, anunciar a boa nova ao grupo de 200 pessoas que aguardava pelo início da reunião.
“Viva João Doria”, gritou bem alto Avelázio Jacobina. “Viva, Geraldo. Viva o PSDB. João Doria Prefeito, Geraldo Presidente. Viva o PSDB”.
A notícia então se espalhou, causou enorme alvoroço, mas não chega a surpreender.
Só alguém muito inocente para acreditar que militantes historicamente ligados ao governador estariam de bobeira “numa aventura sem sentido” como os adversários quiseram fazer supor.
O primeiro turno das prévias acontece no próximo dia 28 e além de João Doria reúne outros dois candidatos: Andrea Matarazzo, com apoio de Serra e FHC, e Ricardo Tripoli, que corre por fora junto com figuras inexpressivas do partido.
Carlos Garcia, o Carlinhos, é o que se pode dizer de alguém que desfruta da intimidade da família Alckmin. Você pode encontrá-lo tanto numa sala reservada no Palácio dos Bandeirantes quanto no carro visitando favelas em companhia de Lu Alckmin.
Integrante da campanha desde a primeira hora, perguntei como e por que se envolveu com João Doria.
“Ele me ligou”, disse Carlinhos.
“Como assim, ele te ligou?”, eu insisti. “Alguém falou pra ele de você”.
Carlinhos então contou que haviam conversado tempos antes e que tão logo recebeu sinal verde do governador, Doria começou o trabalho de montagem do time.
“O governador disse para ele: João, vai amassar barro”, conta Carlinhos.
Do governador, ele diz que nunca recebeu qualquer tipo de orientação.
“Ele é muito discreto. É um assunto que não falamos assim abertamente”.
Carlinhos não é um caso isolado. Como ele, a maioria dos militantes próximos de Geraldo está com João Doria. Estão fazendo uma diferença incrível na campanha justamente por seguirem à risca a orientação de “amassar barro”, ou seja, buscar o filiado, ligar na casa da pessoa, perguntar da mulher e dos filhos, convidar para um café, enfim, seduzir.
“Nossa campanha tem duas características centrais”, explica Carlinhos. “A alegria e a humildade. Estamos indo atrás de todo mundo, um por um, e explicando que chegou a hora do novo”.
Para bom entendedor, “novo” não significa apenas um nome, mas um estilo de fazer política. Significa se libertar da obediência cega, surda e muda. Já dissemos aqui no DCM que os filiados do partido em São Paulo estão saturados de serem usados como figura de retórica. De saber pelos jornais qual a sua opinião sobre determinado assunto ou como terá de votar na manhã de domingo.
Vitoriosa ou não, a campanha de João Doria representa essa quebra de paradigma. Mostra que chegou ao fim a era dos velhos caciques. Semana passada, Serra disse que nem sabia que João Doria era do PSDB. Vindo de alguém que nunca viu barro na vida, até que dá para dar um desconto.
Mas Serra bem que podia aproveitar o vexame da vez para começar a aprender com os próprios erros. E entender que o que a galera quer mesmo é participar. É acompanhar o líder na padaria do bairro, apresentá-lo aos moradores e comerciantes – até para provar para a sogra que, sim, “eu tenho moral no meu pedaço”.
Nesse jogo em que Serra é um zero à esquerda, Geraldo é um craque.