Caetano Veloso está em silêncio. Para um artista que sempre falou muito sobre tudo há tanto tempo — em geral, acertando —, sua ausência no debate é difícil de não ser notada.
Numa longa entrevista à BBC Brasil, por ocasião de um show em Londres da turnê com Gil, ele elogiou Anitta, cravou que o tropicalismo é hoje “o funk carioca, o sertanejo universitário e os restos da axé music” e rememorou o exílio na capital da Inglaterra.
Fez um paralelo entre os anos 60 e hoje. “A música como parte da indústria do entretenimento se transformou. O contexto mudou, com a internet e as novas formas de se produzir e consumir música. É outra coisa, é uma nova era”, disse.
Ele entra na política, como seria inevitável. Mas aí ocorre uma supresa. “A recessão, essa discussão sobre o impeachment… uma coisa agrava a outra, é um ciclo vicioso. O presidente da Câmara (Eduardo Cunha) é claramente um homem desonesto. E o governo não tem força. A confusão é tão grande que, nesse momento, não temos ideia do que vai acontecer”, declara.
And that’s all, folks.
Segundo a matéria, “o assessor de comunicação de Caetano disse à BBC Brasil que o artista não quer fazer mais declarações sobre o processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.”
Não fica claro se o assessor falou pelo cantor ou se deu um chega pra lá na discussão. Enfim: por quê?
Tanto ele quanto Gil têm se manifestado raramente sobre o quadro atual. Em abril, repetiu o coro de “não vai ter golpe” num espetáculo em Salvador. A plateia costuma enfiar um grito de “Cunha” em “Odeio Você”.
No programa Altas Horas, foi um pouco mais contundente: “A passeata de domingo [13/03] não era suficientemente diferente da passeata da Família com Deus pela Liberdade que produziu o golpe de 1964, que ajudou a dar o golpe. O buraco é sempre mais embaixo, mas a gente tem que olhar com objetividade”.
E só.
A empresária de Caetano é Paula Lavigne, ex-mulher e, parece, atual namorada. É provável que, na visão dela, a decisão de ficar na moita seja melhor para os negócios. Deve estar certa. Ela sabe mais sobre isso do que nós todos.
Arguto, provocador, inteligente (o oposto de seu fã às avessas Lobão), Caetano nunca fugiu de uma briga. Teve uma boa coluna no Globo em 2013. Encantou-se com o fenômeno dos black blocs, chegando até a ser fotografado com uma máscara.
Deixou Reinaldo Azevedo enlouquecido ao escrever que o público dele “acha que a TV Globo é um veículo da conspiração comunista internacional”.
Tomou cacetadas quando encabeçou a campanha do Procure Saber, entidade de Paula Lavigne, em favor das famigeradas biografias autorizadas. Causou.
Sua contribuição para a cultura brasileira é enorme e reconhecida. Nunca se acovardou. Não faz sentido patrulhá-lo. Muito menos comparar sua atual inação ao ativismo do amigo Chico Buarque, que subiu em palanques contra o golpe, gravou vídeos etc.
Agora: Caetano Veloso faz falta. Especialmente nessa hora. Fala, Caetano. Manda os estafetas não encherem o saco e fala.